A 22 de novembro, estreava na RTP mais uma edição do “MasterChef Portugal”, programa que atrai, sobretudo, aqueles que sonham com um futuro na cozinha. Na nova temporada, que tem Pedro Pena Bastos, Noélia Jerónimo e Ricardo Costa como jurados, foram apresentados ao público 15 participantes, entre os quais Graciela Macedo (39 anos), designer de comunicação natural de Viana do Castelo.
Na 10.ª (de 12) semana de prova, quando já sá há seis concorrentes a lutar pelo título de “MasterChef”, a NiT falou com a autora do blogue “Grace na Cozinha”, que de destaca na competição e nas redes sociais, onde partilha, regularmente, receitas.
Como surgiu o interesse pela cozinha?
O cozinhar a sério surge quando me mudo para Vila Nova de Famalicão, já há alguns anos, e tenho que o fazer para mim e para a minha família. Percebi que facilmente reproduzia os mesmos pratos a que estava habituada em casa dos meus pais. Parecia que tinha as receitas e todos os seus passos gravados na minha memória como um disco rígido. Sempre soube que tinha nascido para muitas coisas e, com o tempo, fui descobrindo que o gosto pela cozinha era uma delas.
De que forma as origens minhotas se refletem no que faz?
As minhas origens e raízes no Alto Minho são, sem dúvida, a base da minha cozinha e verdadeira paixão. Cresci a acompanhar os cozinhados, tradições e costumes de quem me rodeava. Criávamos animais em casa e ajudava na matança das galinhas, patos, coelhos e até do porco, em casa dos vizinhos. Talvez por isso, hoje, não tenha pudores em tratar todos os alimentos com as mãos.
Íamos com os animais dos vizinhos à ordenha e adorava passar a tarde a tomar conta das ovelhas do Sr. Joaquim. Ajudava no campo, na apanha das batatas, na rega dos campos de milho, vindimas, nas desfolhadas (com as tradicionais cantorias), a debulhar o feijão. Éramos miúdos e adorávamos fazer isso, até porque dava-nos direito a um rico almoço ou lanche. Parece um passado longínquo, mas fez da minha infância um lugar livre e feliz. Todas estas memórias e vivências refletem-se, atualmente, de forma saudosa, no tipo de cozinha que aprecio e no que gosto de preparar para os meus.
O que a atraiu nesta área?
Podermos amar alguém através da nossa comida. Sinto também que influencia muito o bem-estar e estabilidade de toda a família. Promove a felicidade, convívio, reforça laços e a união entre amigos, familiares, vizinhos e até desconhecidos. Tem até o poder, penso eu, tal como a música, de mudar um estado de espírito. Por isso, digo muitas vezes que uma boa refeição dá colo, cura corações partidos e salva até dias difíceis. Não é incrível?
Costuma arriscar na hora de cozinhar?
Nunca fui muito de arriscar neste área, até entrar no “MasterChef”. A própria competição e formação leva-nos, pelo menos a mim, a novos caminhos, com novos ingredientes, completamente fora da minha caixa, e a pegar naquilo que já conheço e dar-lhe outro uso.
O que mais gosta de fazer?
Tenho fascínio pela cozinha mais antiga, como a minha avó e antepassados o faziam. Cozinhada na lareira de pedra e a lenha, com tempo, com o uso de tudo o que se criava e se colhia no quintal de casa. Cozinha simples, portanto, mas honesta, sem truques. Esse é o meu registo e principal gosto. Cozinhar os pratos ligados às minhas memórias afetivas, sem interpretações de chef, típicos da minha zona e também da cozinha mais antiga do Alto Minho.
Há alguma coisa que não coma?
Assim de repente, e porque me faz impressão, não conseguiria comer miolos, para muitos uma iguaria muito apreciada, ou ostras. Mas lá está, como nunca provei, não sei se posso dizer que não gosto. De resto, sou uma ‘boa boca’ para comer.
Apesar da paixão pela gastronomia, é designer de comunicação. O que já fez nesta área?
Criação e gestão de marcas (branding de logomarcas e ajuste a todo o estacionário), packaging, copywriting, publicidade impressa e digital (mupies, outdoors, cartazes, frotas), envio de newsletters e conteúdo gráfico digital, Agora, aliado à culinária, tenho alguns clientes específicos. Pego nos seus produtos alimentares, cozinho no meu estúdio, que já está preparado para isso, faço a fotografia e, em simultâneo, conteúdo digital para estas marcas.
Não pensou em estudar gastronomia?
Quando pensei em ir para a universidade, refleti quais eram as coisas que mais gostava de fazer e que sentia aptidão e uma delas já era a cozinha. Fiquei indecisa entre estudar gastronomia ou design de comunicação, ambas duas áreas criativas, mas numa delas eu sabia que iria condicionar muito o meu tempo e a liberdade que tanto prezo. Então, optei por estudar design e foi uma excelente decisão, porque adoro o que faço.
Por que decidiu inscrever-se no MasterChef?
Surgiu o convite por parte da Shine Iberia, talvez pelo percurso que já tinha com o blogue Grace na Cozinha, que tem alguns anos e algumas idas anteriores à televisão. Na altura, achei que não fazia sentido inscrever-me, porque não queria seguir cozinha de forma profissional. Já tinha tomado essa decisão anos antes e não sabia se teria sequer capacidade para enfrentar uma competição, porque, curiosamente, odeio competir. Já seguia, contudo, as edições anteriores, porque gosto de cozinha, mas sempre senti que provavelmente o meu registo não seria suficiente em conhecimento, além de pouco expansivo, para entrar numa competição deste nível. Acabei por tentar, para ver se pelo menos passava nos castings, e passei.
Como surgiu o blogue?
O blogue surge em janeiro de 2014, primeiramente, como um entretenimento, pela insistência de amigos e conhecidos que achavam que deveria partilhar o meu gosto pela cozinha. Então, se iria partilhar receitas, o que para mim tinha realmente sentido seria a partilha das receitas que faziam parte da minha vida e que tinha maior aptidão para cozinhar, portanto foi instintivo seguir este caminho. Para além disso, achava que as páginas de receitas que já existiam eram mais do mesmo, então porque não, mostrar a base, as receitas que as mães, avós ou tias do meu lugar preparavam e estimular as memórias afetivas relacionadas com esses pratos. Depressa descobri que estes pratos simples estimulavam essas memórias também nos outros, ligadas à sua infância, aos pais, a memórias felizes e muitas vezes também a algumas ligações ao Minho.
Das várias receitas que partilha, qual teve a maior aceitação? Qual será a razão do sucesso?
Sem dúvida as receitas mais simples, de conforto, de casa e as mais rústicas. E talvez também pela forma como apresento estes pratos, com um toque tradicional, mas cuidado. Acho também que consigo transmitir e passar todo este carinho, paixão e dedicação para cada fotografia. Dá muito trabalho? Dá. Mas tem valido a pena. Para um simples hobby, tem-me trazido, involuntariamente, bastantes experiências e reações muito positivas.
Que objetivos pretende alcançar com o programa?
Quando me inscrevi, nunca tive como objetivo ganhar o programa, como a maioria dos colegas. Sempre tive o objetivo de lançar um livro de cozinha, da minha cozinha popular do Alto Minho, ligada às minhas raízes, memórias e aliada às tradições da terra, então, talvez, aproveitar a visibilidade unicamente para a concretização desse sonho.
Como tem sido a experiência?
Uma aventura incrível, ainda que difícil e desafiante, com muita pressão diária, mas temos aprendido tanto e evoluído imenso nesta área, que tenho vindo a conseguir sair muitas vezes da minha zona de conforto, e por isto tudo já vale muito a pena.
Quais as partes mais positivas?
A aprendizagem, sem dúvida, e o facto de termos o privilégio de conhecer e trabalhar com três chefs prestigiados e toda uma equipa de bastidores incrível. E também ter-me cruzado com toda esta equipa de concorrentes. Passamos muitos bons momentos em conjunto, de companheirismo e entreajuda, nos bastidores.
O que é mais desafiante?
A pressão e o desconhecido com que temos que lidar, diariamente, em cada prova. Algum cansaço já acumulado e a distância de casa e da família.
O que mais gostou de cozinhar até ao momento?
Adorei aprender todas a novas técnicas que os chefs usam e poder aplicá-las nos pratos que vamos fazendo a cada desafio. Gostei muito de um molho de pimento fumado que fiz numa das provas e de fazer um simples carapau cozinhado em salmoura, servido com molho branco, uma espécie de beurre blanc, com o uso de maçã verde para trazer alguma acidez ao prato. No fundo, este prato retrata um pouco da cozinha simples de que gosto, com ingredientes simples, que todos temos em casa, com uma das técnicas que já se usavam antigamente na conserva dos alimentos. Achei fantástico e foi considerado o melhor prato da prova.
Quais as maiores dificuldades?
O que mais tive dificuldade em lidar no programa, foi sair da minha zona de conforto, melhorar o empratamento e reduzir muito as porções para se transformar num prato de fine dining. Alguma falta de confiança e o saber lidar com a pressão.
Como tem sido conviver com profissionais tão respeitados na área? O que já aprendeu com eles?
Muito. A relação, tanto com os chefs como a equipa de formadores, e que acontece nos bastidores é excelente. Sempre prontos para nos levantar a moral e corrigir-nos no que fosse necessário.
Como tem sido a reação do público à sua participação?
Muito boa, imensas pessoas enviam-me mensagens a dizer que tenho sido uma excelente representação do Alto Minho e que sou uma das favoritas do programa pela minha simplicidade e espontaneidade. Pedem para nunca perder isso e para ter mais confiança em mim porque posso, de facto, chegar longe na competição.
Quais os planos para depois do programa?
Vou continuar a trabalhar na minha área, conjugar isso com a gestão do turismo que estamos a criar e tentar alcançar o objetivo da edição do livro.
O que pode adiantar do projeto de alojamento de turismo de aldeia que está a desenvolver em Arcos de Valdevez?
É algo que estou a desenvolver em conjunto com o meu marido. Trata-se de uma unidade de alojamento privado que era um sonho já antigo dos dois e que surgiu, espontaneamente, num lugar onde também já fomos hóspedes e felizes durante muitos anos. Soubemos do projeto promovido pela própria Câmara Municipal de Arcos de Valdevez com o objetivo de reabilitar as antigas escolas primárias do concelho para habitação ou unidades turísticas. O meu papel será gerir o alojamento e talvez criar uma opção de serviço mais personalizado ao cliente, em que este terá a oportunidade de desfrutar do espaço e de uma refeição preparada por mim, sem interferir com a privacidade de quem nos visita, ou vivenciar uma experiência de cozinha a lenha, com o receituário tradicional que estou habituada a preparar, com a valorização do pequeno produtor local, do território e património em que estamos envolvidos.