Uns dias antes da eleição do último Papa, em março de 2013, vários meios de comunicação social noticiaram que alguns dos cardeais foram vistos a visitar os seus restaurantes favoritos. Afinal, era a última oportunidade para garantirem uma boa refeição antes de se isolarem num ambiente onde tudo é rigorosamente controlado, para a escolha de um Sumo Pontífice.
O cenário repete-se com o novo Conclave, que está marcado para 7 de maio, no Vaticano, após a despedida do Papa Francisco, que morreu a 21 de abril. Mais de 130 membros da Igreja Católica, incluindo quatro portugueses, preparam-se para este processo altamente secreto e cheio de regras.
Na verdade, a própria palavra do acontecimento reflete o seu secretismo, já que vem do latim “cum clave”, que significa “com chave”. Isto porque, durante as eleições, os cardeais se isolam num local fechado, para garantir que a eleição decorre de forma livre e sem influências externas. Atualmente, esse destino é a Capela Sistina, no Vaticano.
Embora se saiba pouco sobre o que acontece nestes conclaves, uma coisa é certa: os cardeais têm de comer durante os dias (e, por vezes, até semanas) necessários para eleger um novo líder, que é apresentado na Praça de São Pedro, com o fumo branco a assinalar que a votação foi bem-sucedida.
Há mais de 750 anos que há regras muito restritas sobre as refeições que podem ser feitas na Capela, evitando tentativas de comunicação com o exterior ou entre os eleitores. O risco está pode estar presente num frango ou num ravioli, que pode vir recheado com mensagens ocultas, ou até num guardanapo sujo.
Segundo o cardeal Henrique de Susa, um dos mais importantes especialistas em direito canónico, que participou na eleição do Papa Gregório X, em 1274, a escolha mais longa da história, tendo durado 2 anos 9 e meses. Na altura os residentes locais ameaçaram mesmo restringir a alimentação dos cardeais para apressar uma resolução daquele que foi o processo mais longo da história.
Dos legumes às espetadas de borrego
As refeições do próximo Conclave vão ser preparadas pelas freiras da Domus Sanctae Marthae, a residência onde os cardeais vivem durante o sequestro. Segundo a imprensa internacional, irão preparar pratos simples e característicos de Lácio, a região a leste de Roma que rodeia o Vaticano.
A lista inclui uma sopa chamada Minestrone, composta por uma grande variedade de legumes cortados e, quase sempre, arroz ou macarrão, seguindo-se esparguete e arrosticini (espetadas de borrego) e legumes cozidos, revela o jornal britânico.
Embora se assegure um processo controlado, e sob vigilância apertada, o cenário é muito diferente dos conclaves do Renascimento, quando existia racionamento de alimentos, a pedido de Gregório X. Todas as refeições eram preparadas por empregados domésticos seculares que trabalhavam sob um protocolo rigoroso.
Em meados do século XIII, as regras tornaram-se mais flexíveis graças a Clemente VI, que permitiu refeições de três pratos, compostas por uma sopa, um prato principal de peixe, carne ou ovos e a sobremesa, que podia incluir queijo ou fruta.
O relato histórico mais pormenorizado da cultura alimentar surgiu através de Bartolomeo Scappi, que serviu os papas Pio IV e Pio V. No seu livro “Opera Dell’Arte del Cucinare” (“A Arte de Cozinhar”, em português), publicado em 1570, revelou. Apesar das restrições, as refeições descritas por Scappi eram abundantes e equilibradas, incluindo salada, fruta, charcutaria, vinho e água fresca.
O chef acrescentou ainda que, duas vezes por dia, numa ordem determinada por sorteio, os mordomos levavam cerimoniosamente a comida para uma plataforma giratória, construída na parede, que permitia que a comida e a bebida fossem passadas aos cardeais no seu salão interior.
Antes de serem passados, todos os alimentos eram verificados para garantir que não escondiam quaisquer mensagens. Além de se evitar galinhas inteiras ou tartes fechadas, o vinho e a água eram oferecidos em copos transparentes e não em recipientes opacos, por exemplo. Os guardanapos de pano também tinham de ser abertos.