É sobretudo conhecida por apresentar o “Jornal da Noite”, na SIC, há mais de vinte anos, mas fora do jornalismo, Clara de Sousa tem outra grande paixão: cozinhar. Foi precisamente por isso que criou um blogue homónimo onde partilha receitas com regularidade. Esta sexta-feira, 22 de março, o projeto “Clara de Sousa” entrou oficialmente para o universo NiT com um novo site que foi totalmente redesenhado, para ter mais funcionalidades e opções de leitura.
Quem a vê diariamente através da televisão, com uma postura sóbria e assertiva, dificilmente a imagina no supermercado a escolher carne, peixe e batatas. Contudo, a lisboeta de 56 anos fá-lo, pelo menos, três vezes por semana. E o motivo é simples: em casa da jornalista nunca pode faltar nada do que precisa para as inúmeras receitas que tantas vezes inventa.
A cozinha não é uma paixão recente. Clara de Sousa começou a aprender “com a melhor mestre”, a mãe, quando ainda nem sonhava seguir o ramo da comunicação. Hoje em dia, há muito poucos os pratos que seguem a mesma receita de quando era miúda. Ao longo dos anos foi investindo em formações para experimentar novas técnicas e acaba por preferir dar-lhes um toque mais moderno.
Essa vontade de inovar e de ter um cunho pessoal em tudo o que faz foi o ponto de partida para fechar esta parceria com a NiT e dar outra dimensão ao site que lançou em 2018. No fundo, Clara de Sousa quer estar cada vez mais próxima dos seus leitores e fãs.
O catálogo de propostas de “Clara de Sousa” é enorme e o mais diversificado que pode imaginar. Por lá tanto pode encontrar umas bochechas de porco que ficam quatro horas no forno, como as melhores dicas para fazer o sushi perfeito. No dia do lançamento do novo site, Clara de Sousa falou com a NiT sobre este projeto — e já sabemos que pode contar com as receitas “muito bem explicadas”, até porque “ as sugestões com apenas três parágrafos” a irritam solenemente.
Acaba de lançar um novo site de receitas e bricolage em parceria com a NiT. O que pretende atingir com este projeto?
Sou uma pessoa conservadora, mas gosto de mudar e de me atualizar. A imagem do site estava igual a quando o lancei, em 2018 e isso já me cansava. Como também sou uma pessoa que não gostar de ficar exatamente no mesmo sítio, ou comer a mesma comida no restaurante, achei que estava na hora de dar um toque pessoal, inovador e de acordo com o mesmo estilo. Um pouco à semelhança do que faço nas receitas. É muito isto que faço a nível profissional e no meu hobby não poderia ser diferente. Por isso achei que estava na altura de fazer um upgrade, mas com a constante de ser a NiT a fazê-lo novamente.
Como surgiu esta paixão pela cozinha e pela bricolage?
Está cá desde sempre. Não posso dizer que tenha propriamente nascido comigo, mas talvez seja o resultado do meio em que cresci. A minha mãe era cozinheira profissional e desde cedo que passava muito tempo na cozinha com ela. Tive a melhor professora do mundo, sem nunca ter ido para uma escola de hotelaria. Foi uma mestre, mas sem aquela formalidade de formação profissional. E não foi só por minha vontade. A cozinha era a alma da nossa casa e claro que tinha de ajudar a preparar os pratos. Então comecei muito cedo a interessar-me pela área.
Aprendeu tudo o que sabe com ela?
Não. Faço muita pesquisa, fiz outras formações, como a de sushi no início dos anos 2000. Acho que o facto de ser jornalista e muito curiosa faz com que procure mais sobre técnicas e métodos que depois acabo por aplicar na forma como cozinho.
E como surge a vontade de criar um site?
Aconteceu naturalmente. Eu sempre gostei muito de levar os pratos que cozinhava para o trabalho. E a dada altura já me perguntavam quando lançava um livro. Eu respondia que eram doidos, porque era jornalista e arranjava logo justificações para não o fazer. Mas quando fui ao programa da Conceição Lino, a dada altura, e apresentei uma receita, foi um sucesso. Aí pensei, ‘por que não?’. De facto, isto é um gosto que eu tenho, não afeta em nada a minha profissão e nem me vai custar dedicar-lhe tempo porque é uma coisa que gosto realmente de fazer.
E os trabalhos manuais como surgem?
Também de forma natural, em miúda. Na escola era uma excelente aluna nas disciplinas de expressões plásticas. Sempre gostei muito. Aliás, se tivesse que escolher uma parte do meu corpo seriam as minhas mãos. São, de facto, um prolongamento daquilo que sou e do que me passa pela cabeça. Uso as mãos para tudo.
E destes hobbys surgiram livros.
Sim, acabei por lançar o primeiro livro em 2011, “A Minha Cozinha”, e o segundo em 2014, “A Minha Cozinha 2”. A partir de 2018 acabei por me dedicar mais ao site, por isso não tive tempo para lançar mais nenhum.
Como consegue conciliar tanta coisa ao mesmo tempo?
Tem sido tranquilo, desde que faça uma boa gestão do meu tempo. Nas últimas semanas, por exemplo, tive de deixar as receitas um pouco de lado, porque estava completamente dedicada aos debates. Mas as pessoas também compreendem. Numa altura normal consigo lançar uma receita por semana. E tento manter essa rotina, mesmo que às vezes signifique sacrificar algum do meu tempo pessoal em que estaria a ler um livro ou a ver uma série. Faço-o com todo o gosto.
Como têm sido os últimos cinco anos dedicados também às receitas?
As pessoas têm sido muito carinhosas e super agradecidas. Tenho tido relatos fantásticos de alguns seguidores que ficam surpreendidos por estarem a aprender a cozinhar com uma jornalista. E na verdade aquilo que me dizem é que eu explico muito bem. Acredito que a minha capacidade de comunicação também me ajuda a explicar exatamente como é que as coisas se fazem, desde as mais banais que, à partida podiam ser intuitivas. Sei que o que é básico para mim, não o é para as outras pessoas, e portanto eu vou ao pormenor ao explicar. Tenho um bocadinho mais de texto, é verdade, mas quem quer de facto um bom resultado, deve ler tudo, para não falhar. Uma coisa que me irrita são as receitas de três parágrafos, em que basicamente partem do princípio que a pessoa sabe tudo.
E a bricolage?
Não tenho tido muito tempo, mas acaba por ser também uma extensão. Sempre gostei de ir às lojas de bricolage, de materiais de construção e de fazer, montar, e pendurar. Gosto muito dessa parte. Mas também me ocupa mais tempo, então tem ficado um pouco de lado.
Como uma profissão tão exigente, estes hobbies acabam por ser um escape?
De alguma forma, sim. Aquilo que muitas vezes faço é aproveitar que estou a cozinhar para a família e monto logo as luzes, o tripé e começo logo a filmar com o meu telemóvel. Depois, se aquilo correr muito bem, partilho. Nunca colocaria uma receita que resultou mal.
Gosta mais de cozinhar para si ou para surpreender os outros?
Ah, para surpreender os outros. Se fosse só por mim passava bem com uma sopa e um ovo cozido. Para mim pode ser a coisa mais simples deste mundo, mas gosto de surpreender os outros.
Quais são os pratos que faz para essas ocasiões?
Nunca me fico só por um prato e normalmente não repito receitas, a não ser que sejam as pataniscas de bacalhau que toda a gente adora e pontualmente vou fazendo. Quando cozinho para convidados, gosto por exemplo de apostar em receitas que sei que nunca falham. Por exemplo, umas bochechas de porco, que ficam quatro horas no forno e eu posso receber as pessoas entretanto. Um butter chicken, porque adoro indiano e até tenho um tacho enorme para fazê-lo. Mas vai sempre depender do que me apetecer, da estação em que estamos e da quantidade de pessoas. Uma coisa é certa, quando tenho tempo, gosto de deixar as coisas a cozinhar. Um bocadinho como os fornos antigos dos nossos avós, em que os assados ficavam lá todo o dia.
Há algum prato que evite cozinhar?
Sim. Uma vez fiz uma coisa que me arrependi amargamente. Fiz sushi para 40 pessoas. Nesse dia basicamente não saí da bancada. Fazia seis peças de uma vez e desapareciam em segundos. Desde aí que não voltei a repetir a brincadeira para tantos convidados. O mesmo acontece com risotto, porque é um prato que me prende ao fogão durante muito tempo e eu gosto de receber os meus amigos e familiares. Quero ter tempo para as pessoas quando elas chegam.
Alguns desses pratos que faz para os convidados é o seu favorito?
Não necessariamente. Eu gosto de pratos de conforto, que me levem para certas memórias, sejam doces ou salgados. Acho que a comida tem também esse poder e quando perdemos os nossos pais ganha ainda mais força. É como se viajássemos para outros tempos. Portanto tinha de escolher o arroz doce e o cozido à portuguesa da minha mãe. Algo simples, tal como ela fazia. Mas na verdade gosto muito de comer e de experimentar coisas novas. À medida que vou envelhecendo tento educar o meu palato e de experimentar cozinhas do mundo.
Se tivesse que escolher uma cozinha internacional favorita, qual seria?
Gosto de várias, mas a indiana é a que está no topo. Aquela explosão de sabores, a forma como trabalham o iogurte, o leite de coco ou as natas, adoro.
Como vê a cozinha?
A cozinha é um espaço de ordem. Porque se a desordem se instala, é o caos e qualquer cozinheiro profissional sabe que tem que haver ordem, têm que haver rotinas, tem que haver organização. E por isso é que muitas vezes também devemos puxar as crianças para a cozinha, ajuda na parte da educação para a responsabilidade. Além de que é divertido.
A Clara tem dois filhos, o Manuel, de 27 anos, e a Maria, de 24. Eles também cozinham?
Sim e gostam bastante. Aliás, o Manuel herdou um bocadinho do gosto da avó, talvez, e é cozinheiro profissional. Claro que continuo a tentar ajudá-lo sempre que posso. Dou-lhe algumas luzes e discutimos técnicas. A Maria cozinha normalmente por intuição. Ela tem uma boa intuição para a cozinha.
Lá em casa já se renderam aos robôs de cozinha e às plataformas de compras online?
Tenho um robô, mas só uso como auxiliar. Ou seja, mais para triturar uma sopa, por exemplo. Quanto às plataformas online não me rendi. Gosto de ir ao supermercado e ao mercado escolher os legumes, a fruta, a carne e o peixe. Mas nunca deixo nada faltar. Vou às compras cerca de três vezes por semana. Mas já aconteceu ter de pedir um pacote de açúcar num delivery.
Porque é que escolheu a NiT para ser sua parceira nesta nova fase do projeto?
A NIT para mim é uma referência na dinâmica, na abordagem, na ligação com o público, no trabalho, nas pessoas que tem. Então contactei o diretor-geral da MadMen [Jaime Martins Alberto] e apresentei-lhe a minha proposta. Ele mostrou-se aberto à hipótese do meu site entrar no universo da revista e estou muito feliz e agradecida por termos esta oportunidade de trabalharmos juntos. Fizemos aqui um upgrade com ainda maior qualidade. Espero que as pessoas gostem.