Professor, consultor gastronómico, organizador de eventos e influencer. São várias as profissões que podem ser atribuídas a Fábio Bernardino (34 anos), nome e rosto conhecido, sobretudo, pelos espetadores fiéis de “A Nossa Tarde”, programa da RTP1, apresentado por Tânia Ribas de Oliveira, onde é chef residente. Acima de tudo, porém, o lisboeta quer ser conhecido como um “bom cozinheiro”, e preocupa-se em mostrar que é possível fazer bons pratos com poucos recursos. Inspirar os demais a aventurarem-se entre tachos e panelas é outro objetivo que o move.
O gosto pela área, como é comum nestes casos, remonta à infância. “Sempre esteve presente. Começou pela necessidade básica de me alimentar, até porque a minha mãe não cozinhava nada”, conta à NiT. “Há muitas pessoas que dizem ser grandes chefs porque as mães o eram e aprenderam tudo com elas. Comigo foi bem diferente. A minha mãe nem sabia fritar um ovo. Já o meu pai era empenhado e desenrascava-se, mas incentivou-me logo a ser o responsável por cozinhar para a família. É por isso que sou um grande chef. Precisei de aprender e gostei”, acrescenta divertido.
O facto de ser muito guloso contribuiu, igualmente, para o aumentar do interesse pela atividade. “Sou comilão desde pequenino e a prova disso é que até fui um dos bebés da Cerelac. No anúncio, apareço a comer a papa à mão, enquanto todos os outros estão com a colher. Nem quis esperar pela minha. Agarrei a papa como deu mais jeito”, brinca.
Mais tarde, à necessidade juntou-se o “simples prazer de cozinhar e de provocar prazer a quem ia comer. Conforme crescia e inovava, passei a olhar para a cozinha como arte. Adorava misturar os diferentes ingredientes e experimentar coisas novas. Já mesmo na escola, enquanto algumas crianças diziam querer ser astronautas ou futebolistas, eu sonhava ser cozinheiro e ia para casa ansioso para ver os programas da Maria de Lurdes Modesto e do chef Silva. Imaginava que um dia podia ter o meu próprio programa”. Enquanto o seu momento não chegava, Bernardino entretia-se a tentar recriar as receitas das suas inspirações.
“Lembro-me do chef Silva fazer um bacalhau especial com presunto, por exemplo, e de o tentar reproduzir em casa. Se não tinha um ou outro ingrediente — e muitas vezes não tinha —, usava outros. Era aí que surgia a necessidade de ser criativo. Às vezes, não saía nada de especial, outras, conseguia grandes pratos. Cozinhar com o que havia à mão foi algo que sempre fez a diferença para mim e que procuro passar às pessoas. Quem não tem carne, faz com peixe e, se este faltar, com legumes. As alternativas podem gerar boas receitas”.
Aos 14, depois de concluir o nono ano, Fábio decidiu frequentar o curso profissional de Cozinha e Pastelaria na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa. “Na altura, a profissão de chef nem era tão valorizada como agora, mas era o que queria ser, então investi. Conforme ia aprendendo, mais acreditava ter tomado a decisão certa e queria seguir este caminho. Licenciei-me ainda em Produção Alimentar em Restauração e sou mestre em Segurança e Qualidade Alimentar em Restauração pela Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril”, explica.
O primeiro grande reconhecimento veio logo no primeiro ano de licenciatura. “Tive a sorte de saber do Prémio Sabores Lusiaves, e resolvi participar. Lembro-me que foi na Escola de Turismo e Hotelaria de Coimbra e tinha chefs como o Hernâni Ermida entre os jurados. Era inverno, estava escuro e cheguei de autocarro, às 7 horas, com uma frigideira, uma púcara de barro, uma faca de chef e ingredientes como o presunto da terra e o frango, que era o protagonista da prova. Cheguei lá e já estava tudo com as bancadas montadas e marcas a apoiar. Não tinha nada além da vontade e paixão por cozinhar. Fiz um frango na púcara sobre almofada de açorda, um prato todo composto com algumas técnicas mais avançadas, e acabei por ganhar. Foi quando passei a ser um pouco conhecido na área e até representei Portugal na Madrid Fusion, uma importante feira gastronómica”.
Terminado o mestrado, começou a dar aulas de cozinha, pastelaria, panificação e restauração no Estoril. “A par disso, trabalhava no desenvolvimento de produto para a indústria farmacêutica. Produzia, por exemplo, suplementos alimentares e receitas com esses suplementos para pessoas com doenças ou dietas alimentares específicas, de celíacos a doentes de oncologia e desportistas”.
Em 2011, nasce a Travel & Flavours, a sua empresa de catering. “É do que me dá mais prazer nesta área e ao que volto sempre. E tudo correu lindamente por muitos anos. Tinha muitos eventos e podia continuar em todas as atividades que já fazia e de que gostava. Em 2017, por exemplo, também passei a colaborar com a Direção-Geral da Saúde no Programa Nacional de Promoção da Alimentação Saudável. Ainda hoje participo em projetos de educação alimentar em escolas, hospitais, cantinas e lares sociais, bem como na organização de eventos gastronómicos para preservação do património gastronómico-cultural português”, relata.
Os problemas vieram com a pandemia. “Ganhava muito dinheiro e tinha dado emprego a várias pessoas quando vi tudo a parar a minha volta. Os workshops, showcookings e todo o tipo de eventos que tinha na agenda foram cancelados ou adiados. Senti que precisava dar uma volta à minha vida e foi aí que decidi investir nas redes sociais”.
Criou então o “Cozinhar na Quarentena”, diretos que transmitia no Facebook e no Instagram, a partir da sua cozinha, todos os dias, às 19 horas. “Explicava como as pessoas podiam fazer as compras em plena pandemia, como reaproveitar os ingredientes e cozinhar com pouco. Era tornar fácil uma cozinha vista muitas vezes como difícil e mostrar que todos podem aprender. Depois falei com a Tânia Ribas de Oliveira, uma grande amiga, sobre o que estava a fazer e ela disse-me logo que ia passar a entrar no programa dela ‘A Nossa Tarde’. Às redes sociais juntei assim a televisão”, conta.
Esta não foi, contudo, a sua primeira experiência na área. “Fui chef convidado no ‘Queridas Manhãs’, da Júlia Pinheiro, para além de júri no ‘A minha mãe é melhor que a tua”, com o Malato. Este é a minha aventura mais duradoura e a concretização do sonho de criança que surgiu ao ver o chef Silva e a Maria de Lurdes Modesto”.
À media que os dias iam passando e os diretos aconteciam, aumentavam os seguidores. “De dois mil, passei para cinco, 10, 15, 25 e agora já estou quase nos 100 mil. E o que começou com algumas pessoas interessadas em descobrir receitas tornou-se uma comunidade. Já me disseram que viam porque se sentiam sozinhas, tinham perdido o marido ou apenas não sabiam mais o que fazer e aquilo tornou-se uma rotina. É muito recompensador saber que consigo chegar a tanta gente e ajudar quem precisa.”
Por isto, quando a pandemia começou a dar tréguas, os diretos passaram a chamar-se “Sabores que nos unem”. “Cerca de três anos depois, pessoas de várias partes do País, e no estrangeiro, esperam pelos meus diretos. Tornou-se uma experiência em que tanto posso ensinar receitas como estar em viagem e mostrar os pratos que provo, ir a restaurantes e partilhar o que estou a comer ou falar de um produto em que acredito”.
Mesmo que muitos já digam que é um influencer, Fábio continua a querer ser, essencialmente, um cozinheiro e a mostrar todas as possibilidades que existem quando há poucos recursos, Ter um restaurante está longe dos planos. “No fundo, acabo por ter um restaurante da família, o Bar do Peixe, na Praia do Meco. E vou lá muitas vezes, mas não é algo em que me imagino, para já, a tempo inteiro. Quero continuar com o meu catering e a abraçar projetos que contribuam para melhorar a vida das pessoas. Também já assino cartas de vários espaços e faço consultoria. O resto, é sempre uma possibilidade, mas não uma prioridade”, conclui.