gourmet e vinhos

Que se foda 2020: o vinho viral que esgotou mil garrafas em apenas em 2 dias

Pode estar para breve uma nova edição, mas por enquanto a última garrafa está à venda por quase um milhão de euros.
Um vinho que também é arte. Foto de bennyapereira e riclgama.

“Que se foda 2020.” A frase que todos pensaram nos últimos meses, mas que poucos ousaram dizer, pelo menos publicamente e em bom som, ganhou vida em garrafas de vinho que se tornaram um fenómeno de vendas. Em apenas dois dias esgotaram as mil unidades que tinham sido criadas. Para breve pode estar uma segunda edição, mas enquanto não fica disponível pode comprar a última garrafa que está venda por quase um milhão de euros. Afinal esta foi também uma forma de mostrar arte.

O rótulo foi criado pelo artista plástico português Francisco Eduardo, 36 anos, que se juntou à Adega da Azueira, da região de Lisboa, para desenvolver este projeto. “A ideia veio deste ano que todos estamos a passar. As pessoas estão descontentes com não puderem sair de casa, de não fazer o que faziam. Senti a necessidade de o exteriorizar”, explica Francisco Eduardo à NiT.

É natural de Aveiro e estudou na escola de Belas Artes do Porto de onde lhe chegaram alguns dos ensinamentos que usa na profissão e também neste conceito que criou. “Sempre aprendemos a fazer coisas que não fossem apenas pintar. A maior ferramenta que temos é a cabeça e não temos apenas de colocar as ideias em imagens.”

Quem o conhece sabe que não é uma pessoa mal educada e de dizer palavrões com frequência. “Não sou muito de dizer asneiras. É algo que também fere um pouco a suscetibilidade da minha família.” Ainda assim, acredita que há momentos em que é preciso dizer verdades.

“Casei com uma rapariga do Porto e com ela aprendi que uma asneira no sítio certo faz sentido. Neste caso foi uma exteriorização que é positiva.” O objetivo não foi até para insultar o ano, antes mais “como um grito de esperança e não de revolta.”

Já trabalhou, e trabalha por vezes, para agências de publicidade. Atualmente tem uma empresa com outro sócio, o estúdio Eles, onde faz direção de arte para anúncios, design e serigrafias. Rótulos de vinhos foi outro dos projetos que já tinha feito, por isso tinha alguma experiência.

Assim que teve a ideia deste vinho, sabia que a coisa iria resultar e ia ganhar buzz, muito também devido à experiência que ganhou nos últimos meses. “Muitas vezes o trabalho com marcas implica a criação de balizas, das quais não se pode sair. Neste caso é algo livre, como a arte é suposta ser. Sabia que ia ter força.”

A última garrafa custa quase um milhão de euros.

No início, quando lançou o site, e as garrafas de vinho tinto com o rótulo “Que se foda 2020”, percebeu que muitas pessoas iriam pensar que não fosse verdade, que aquilo não poderia estar à venda. Outras, pelo contrário, iriam arriscar. 

“Houve também muita gente que queria que fosse verdade [e era mesmo], apesar de não ter colocado imagens reais das garrafas.” Cada garrafa estava à venda em formato individual por 15€, em pack de três por 42€ ou em caixa com seis por 60€. Ficaram disponíveis a 2 de dezembro e no dia 4 já não havia referências disponíveis.

“Um rótulo que diz este palavrão tem de apresentar alguma seriedade e foi isso que quis transmitir.” Criou algo clássico, clean, com atenção na escolha do papel, com algum relevo e textura e também no tipo de letra com que as frases iriam aparecer. A escolha foi a Georgia.

Por baixo do nome do vinho, escreveu mais duas duas: “Não se assuste com o nome. Que de foda é um vinho do caralho”. “Quis contrabalançar com o lado artístico”, refere.

Na Adega da Adega da Azueira encontrou o vinho que procurava para lançar este projeto. “Não sou um especialista, mas gosto de um bom vinho tinto. Quase todos os dias ao jantar bebo vinho tinto. Contento-me com bom. Já conhecia a Adega [da Azueira], mas fui lá fazer uma prova para escolher a referência.”

Francisco Eduardo deu a conhecer à adega o que ia fazer, já que não queria usar um produto que depois fosse interferir de alguma forma com o negócio dos vinhos. Telmo Apolinário foi um dos que acreditou no projeto e que o ajudou na escolha do vinho para o Que se foda 2020.

A escolha passou pelo Syrah de 2017. “Tenho provado alguns vinhos da região de Lisboa e existe aqui uma oferta com muita qualidade que tem o peso de não ser do Alentejo ou do Douro, não ganha tanto protagonismo.” Foi também uma forma de mostrar que a região é capaz de fazer grandes referências.

Utilizou o site e a página do Instagram para chegar às pessoas e comunicar o vinho. “Foi uma comunicação muito relaxada. Não quero insultar ninguém, mas foi tudo muito natural.” Em poucas semanas atingiu os mais de três mil seguidores e muitos a usarem a ideia da frase do rótulo também nos comentários que fizeram.

Para os que não acreditavam que fosse verdade a questão das garrafas, fez uma última publicação no site a 11 de dezembro a revelar que também se tratava de arte. Descansou também as várias pessoas que ficaram em lista de espera para a compra que em breve poderão mesmo receber uma garrafa.

Ainda não é certo, mas Francisco Eduardo acredita que até ao final do ano possa ficar disponível uma segunda edição. Recebeu também pedidos do Brasil e da Suíça, mas nesse caso teria de pensar em algo mais estruturado, com a criação de uma marca. Não é algo que descarta já que o ano acaba mesmo por ficar marcado para todos. Que se foda 2020.

Uma segunda edição pode estar a chegar.

ÚLTIMOS ARTIGOS DA NiT

AGENDA NiT