Miguel Dias acreditava que os restaurantes Michelin e os hotéis de luxo seriam o melhor palco para apresentar os seus vinhos. Rapidamente percebeu que estava enganado. A fraca rotação e o esquecimento em que caíam os seus rótulos fizeram com que a marca Estoiro não tivesse a projeção que esperava — e era preciso encontrar uma solução. Decidiu então abrir o seu próprio espaço, um restaurante feito à sua medida e onde só se bebem os seus vinhos.
O Estoiro abriu a 31 de janeiro, em Alcântara, e tem como estrelas da carta pratos como punheta de bacalhau (12€) e de atum (11€), sandes de leitão (7€) ou lagartos ibéricos (18,50€). “A ementa foi pensada para promover os recursos locais, a tradição e a ecologia. Temos carnes de pasto dos Açores, o atum também é açoriano. Quisemos resgatar as receitas antigas que as avós faziam e dar-lhes uma nova abordagem”, conta Miguel Dias à NiT.
A ideia surgiu em 2023, quando Miguel percebeu que os vinhos Estoiro, cuja produção começou em 2015, não estavam a ter saída nos espaços onde tinham sido colocados. Estranhou o desinteresse, até porque os comentários de especialistas, concursos e garrafeiras eram positivos. Percebeu então que os locais escolhidos não estavam a funcionar como “a montra” que imaginava e decidiu retirá-los da hotelaria e restauração para criar um projeto que lhe desse total controlo.
Procurou um local onde pudesse combinar o restaurante com um centro de formação ligado à enologia, em parceria com a escola de hotelaria. Encontrou o sítio ideal em Alcântara. O restaurante, com capacidade para 50 pessoas, é o ponto de encontro entre o vinho e a cozinha tradicional.
A marca Estoiro começou a ganhar forma quando Miguel comprou dois talhões na Beira Interior, a sua terra natal. Começou por tratar das vinhas e em 2017 deu início à produção. O primeiro vinho saiu dois meses antes da pandemia — e, ao contrário do que imaginava, teve sucesso. “O nome foi pensado já a pensar no resultado final, porque iria ser um ‘estoiro’ de vinho, como dizem no norte”, explica.
“O Estoiro não foi a minha primeira incursão no mundo dos vinhos. Antes disso, no início dos anos 2000, fui para Minas Gerais com a minha mulher, onde montei um negócio de distribuição de vinho e depois um restaurante com adega chamado Ementa Portuguesa. Mas quando voltei a Portugal vinha decidido a criar vinhos como os nossos avós faziam, com pouca intervenção”, recorda.
As referências são feitas à moda antiga, com pisa a pé em lagar de pedra. A produção anual ronda as 20 mil garrafas de brancos, tintos, rosé e espumantes. Nos tintos e rosés, aposta em castas como Touriga-Fêmea, Marufo, Rufete e Alfrocheiro. Nos brancos, trabalha com Síria, Fonte Cal, Arinto, Alicante Branco, Malvasia Fina, entre outras.
“Os vinhos seguem uma vinificação simplista, onde não há utilização de madeira e as fermentações ocorrem de forma espontânea, sem filtração e a fase final da garrafa molda a silhueta final de cada vinho.”
Os rótulos Estoiro estão no centro da carta do restaurante, disponíveis a copo desde 6€ ou à garrafa. Para oferecer mais opções, Miguel trabalha também com quatro produtores de regiões como o Minho, a Bairrada e o Douro. “Escolhi colegas que têm as mesmas filosofias que eu no que toca à produção. São todos de baixa intervenção”, explica.
O regresso às tradições nota-se também nas sobremesas servidas no espaço, decorado como uma taberna antiga, só com elementos ligados ao vinho. “Temos mousse feita com azeite e um pudim Abade de Priscos onde substituímos o vinho do Porto por moscatel do Douro e já rendeu algumas lágrimas a clientes”, conta.
O objetivo agora é preparar a nova carta de verão. Miguel quer manter o foco em produtos sazonais e regionais. Até lá, continua a receber curiosos e apaixonados por vinho no Estoiro.
Carregue na galeria para conhecer o novo restaurante de Alcântara onde o vinho é protagonista.