Restaurantes

Fomos ao restaurante de Ljubomir Stanisic comer frango — e não nos arrependemos

A espuma de queijo com sorbet de goiaba, contudo, foi a verdadeira estrela do almoço.
Fotografia: Fabrice Demoulin.

Foi a 10 de dezembro de 2022 que os fins de semana do Bistro 100 Maneiras, projeto de Ljubomir Stanisic no Chiado, em Lisboa, se tornaram, oficialmente, dias de festa. Isto porque, no edifício de inspiração Art Déco se passou a celebrar o “Let’s Roast Bistro!”, uma iniciativa que inclui um menu especial, desenhado para duas pessoas, que alia a comida de conforto tão desejada na época a bons vinhos.

A agenda só permitiu que passássemos por lá a 4 de fevereiro, mas o resultado da experiência fez-nos desejar que a visita tivesse acontecido mais cedo. Chegámos por volta da 13h30, quando o restaurante já estava bem preenchido, e tínhamos à espera uma mesa ao lado da janela, no segundo piso, que acrescentou ao almoço a sempre apetecível vista para o Tejo.

Com o Teatro Trindade logo em frente, também conseguimos ver, entre uma mordida e outra, artistas como Luís Aleluia — que chegavam para “Noite de Reis”, uma das comédias mais populares de Shakespeare, que está em cena até 19 de março. Para nós, contudo, o verdadeiro espetáculo acontecia à mesa.

Amílcar Drumond, mais conhecido como Mico, que acumula a função de escanção com a de chef de sala, é quem nos apresenta a carta e explica a origem destes roasts.

“Antes da pandemia, abríamos sempre aos almoços e jantares. Após a pandemia, porém, estivemos fechados aos almoços durante muito tempo, fosse porque não tínhamos equipa suficiente ou clientes. Quando voltámos a fazê-lo, sentimos alguma dificuldade em voltar a atrair as pessoas, pelo que pensámos em criar o roast para gerar algum buzz nas redes sociais. São também uma forma de expor todos os produtos, de pequenos produtores com certificados biológicos e orgânicos, com os quais estamos a trabalhar. Ao mesmo tempo, damos a conhecer o que é nosso e aquilo que fazemos de melhor. A comida portuguesa e bósnia são a base, mas temos alguma fusão com todo o planeta. O resultado tem sido positivo”, começa por dizer.

“A ideia do roast, em resumo, é que quem nos visita possa usufruir de uma coisa diferente. Para isso, podem escolher duas entradas, um prato principal para partilhar, e duas sobremesas. Uma carta curta, para que não se percam entre muitas opções, como às vezes acontece. Para as entradas e sobremesas, pegámos nos nossos bestsellers. Já a nível de proteína, usamos tudo o que temos. As carnes fumadas e maturações de carnes e de peixes são todas feitas cá no restaurante em frigoríficos especiais que adquirimos. Para os fumados, utilizamos distintos tipos de madeira. Isto está refletido na proposta. O essencial é que haja variedade para que quem venha aqui quatro fins de semana, por exemplo, possa ter quatro refeições diferentes.”

Antes de olhar para o menu, trazem-nos o couvert (4,5€), que inclui pão somo, típico da Bósnia. Este surge aqui, contudo, numa versão muito mais leve. “O original é feito com tutano, mas como temos cada vez mais clientes vegetarianos, optamos por fazê-lo com uma parte de leite e outra de natas que imita o tutano. Ficamos assim com um pão muito leve, mas igualmente saboroso. Este é acompanhado com azeite, manteiga dos Açores e rillette de carne maturada”, indica o profissional. A foccacia, que é extremamente estaladiça no exterior e bastante suculenta no interior, completa a oferta.

Brioche e pasteta; chistorra grelhada; salada e tempura de cogumelos; salada César; e tártaro de beterraba bio com queijo da ilha eram as possibilidades de entrada. Optámos pelas duas primeiras.

“A chistorra, uma linguiça espanhola feita com carne e gordura de porco, foi um produto que adquirimos para um prato que adicionámos à carta, a Bosniazinha (25€), a versão do Ljubomir de uma francesinha, que utiliza burek jugoslavo em vez de pão. Optamos por ela para não estar a usar a salsicha fresca, que é muito banal, logo, foge ao nosso estilo. Gostamos tanto da chistorra que decidimos introduzi-la no menu”, partilha.

“Já a pasteta é algo típico dos Balcãs. O Ljubomir, quando era refugiado, recebia sempre uma caixa da Cruz Vermelha que trazia uma peça de fruta, um iogurte e pasteta, uma espécie de rolo de carne com partes do animal que normalmente são desperdiçadas, como os tendões e a pele. Esta preparação era uma forma de as aproveitar. Ele gostava tanto que tentava sempre trocar tudo o que não era pasteta pela dos outros refugiados. Desde o início, dizia que iria fazer uma mais luxuosa para servir nos seus restaurantes. Para isso, utilizamos fígados de várias aves, como pato, frango do campo e frango bio, com uma redução de vinho do Porto e um pequeno apontamento de bacon. Para contrastar com esta proposta intensa, surge o brioche, mais doce, feito com manteiga noisette. Há ali então um contraste entre o salgado, o fumado e o tostado.”

Uma vez que quem se sentou à mesa é fã incondicional de frango, entre a barriga de atum com chimichurri, a costela de angus BBQ (+ 25€), a costeleta de porco preto e o 1/2 frango do campo bio BBQ, optámos pelo último, embora talvez não fosse a opção mais óbvia. Depois de o provar, porém, será difícil alguém acreditar que haveria melhor alternativa e o desafio passa por encontrar, em qualquer outro sítio, uma proposta mais crocante no exterior e repleta de sucos no interior.

“O frango bio é um prato que tem tido muito sucesso aqui ao jantar. Primeiro, é cozinhado a baixa temperatura e fumado. Depois, é finalizado na grelha. Não é um frango normal, mas muito suculento e com uma pele bastante caramelizada e tostada. Por baixo, temos sucos mais simples. A ideia é ter um prato que todos podem comer em casa, aqui no restaurante, mas de uma maneira muito mais ‘uau’. Muito mais ‘100 Maneiras'”, explica Mico.

Para sobremesa, pedimos a mousse de chocolate bio da Roça Diogo Vaz (São Tomé & Príncipe), bem cremosa e com um bom equilíbrio entre o doce e o amargo; e a espuma de queijo e goiaba, a verdadeira estrela do almoço.

“A nossa espuma de queijo com sorbet de goiaba, que é o nosso bestseller, foi inspirada no Romeu e Julieta, um prato brasileiro, que apesar de bom pode tornar-se um pouco enfastiante pela junção do queijo com o doce de goiaba, que também é muito doce.”

E acrescenta: “O Lubjomir fez uma versão light, com queijo mascarpone, mas também um apontamento do queijo ilha dos Açores, do qual gosta muito. O sorbet foi uma maneira de introduzirmos a goiaba, que aqui tem uma acidez incrível, mas de uma forma mais fresca. Muitos até dizem que ajuda a desenjoar, entre aspas, a refeição, porque a espuma desaparece e depois temos a frescura da goiaba. É muito leve, mas é uma sobremesa que temos de aconselhar às pessoas, que a imaginam com estranheza quando leem na carta. Acham sempre que vai ser algo muito aqueijado. Quem arrisca, não se arrepende”, conclui.

Ao menu, disponível por 80€, junta-se (quase) sempre uma seleção de vinhos, que pode beber à discrição, por mais 25€. Na semana de 4 de fevereiro, contudo, esta não estava disponível.

“Todas as semanas, convidamos produtores ou distribuidores de vinhos com os quais costumamos trabalhar para se juntarem a nós. A ideia é criar uma história de vinhos à volta do roast. Com os prémios [a ‘Revista de Vinhos’ realizou a sua gala anual na véspera, dia 3] a serem entregues agora, ninguém se conseguiu, infelizmente, comprometer a participar. A ideia é sempre que selecionem um conjunto de referências e nos contem as suas histórias, que depois partilhamos com os clientes”, conclui.

Optamos então por espreitar a carta de cocktails, que se inspira no universo de “Alice no País das Maravilhas”, de Lewis Carroll, um conceito que já se nota no lounge, onde existe um jardim invertido. Quem procurar um perfil frutado e adocicado, pode pedir o Maracujá de Paus (14€), com Patron Silver, maracujá, mirtilo e baunilha. A versão sem álcool fica por 8€.

Carregue na galeria para espreitar o espaço, que foi inaugurado em 2010 e conta com dois andares capazes de receber 70 pessoas, assim como alguns dos pratos que pode provar com o “Let’s Roast Bistro!”. As reservas devem ser feitas através do 910 307 575 ou info@null100maneiras.com.

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FICHA TÉCNICA

  • MORADA
    Rua do Teixeira, 39, Lisboa
    1200-459 Lisboa
  • HORÁRIO
  • De quinta a segunda-feira das 19h às 01h
PREÇO MÉDIO
Mais de 50€
TIPO DE COMIDA
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