A maioria dos empresários do mundo da restauração raramente hesita quando se trata de eleger a melhor parte do processo. Como calcula, o plano de negócio não costuma ser a primeira referência. A pesquisa para elaborar o menu costuma ser uma das tarefas mais apreciadas, já que implicar percorrer várias geografias e provar as especialidades locais.
Parece uma maravilha, certo? E é mesmo, como conta à NiT Sérgio Frade, proprietário do Guelra, que abriu em Belém a 7 de setembro. “As viagens que fizemos pela costa alentejana e pelo Algarve foram fantásticas. São momentos muito criativos, a comermos, a imaginarmos o que podíamos fazer na carta.”
As boas memórias estendem-se à cozinha, na parte final da construção da carta. “Quando começamos a provar os pratos, a ver o que realmente funciona para as nossas ambições, entramos noutra fase entusiasmante. É a redescoberta do que tínhamos gostado, em que validamos o investimento nas viagens, mas conseguimos ir mais longe, criando algo só nosso.”
Um dos exemplos dessa alegria chama-se moreia frita. “É um prato muito português, fácil de encontrar na costa vicentina, mas inexistente em Lisboa. Na nossa proposta, que dá um trabalhão a fazer, vem fininha como chips. Ficámos mesmo satisfeitos com o resultado. Sabemos que vai marcar os clientes, porque também nos marcou.”
O CEO do grupo Qriar Food, que além do Guelra tem os restaurantes O Frade (em Belém e no Mercado da Ribeira), já alimentava há algum tempo a ideia de juntar uma marca ao portfólio da empresa. Queria manter o lado de portugalidade crucial para o triunfo do primeiro espaço, mas dedicar o novo ao mar.
“Somos frequentadores assíduos de marisqueiras, adoramos comer camarões à mão, partir a sapateira com o martelinho, deliciarmo-nos com peixe grelhado. Achámos, porém, que pode haver outra oferta nesta área sem ser só cozinhar e salgar marisco.” Ao perseguir esse conceito, chegou ao destino. “Não somos uma marisqueira, mas a alternativa que faltava em Lisboa, com formas diferentes de apresentar peixe e marisco. E também temos finger food (risos).”
O Guelra está em funcionamento desde 7 de setembro, definido por uma associação óbvia ao mar. “Pensámos em vários nomes, a escolha sucede pela ligação ao conceito, tal como a nossa tagline ‘ocean to table’ [do oceano para a mesa]. E é de sangue na guelra, daquela força que vem das entranhas, representa aquilo que temos sido sempre enquanto grupo.”
O autor dos pratos é Manuel Barreto, chef de 33 anos que lidera a cozinha. Diogo Machado, 35, é o chefe de sala que distribui o serviço. A carta tem várias surpresas, a começar logo nas entradas (preços por unidade): bacalhau ao cubo, com brandade, sames e línguas (7€), tostada de camarão , com tortilhas crocantes, romesco e ponzu (5€), e ostras à algarvia, com picadinho, picante e limão (4€).
Nas sugestões para partilhar, há cavala alimada, com coentros, funcho e picadinho (12€), algas da horta, acompanhadas com húmus (11€), maguro sando, com atum rabilho, sriracha e coleslaw (18€), bikinis, com muxama de atum, tapenade, romesco, queijo e sriracha (12,50€), e moreia frita, servida com maionese de kimchee (12€).
A surpresa final reserva-se para os pratos principais, apresentados no menu numa forma um pouco enigmática: “O que vem à rede é peixe” (17,50€), “Pela guelra” (23€) e “Do oceano para a mesa” (29€). “São produtos frescos do mar, que variam consoante a semana e, às vezes, conforme o dia, dependendo das capturas. Há também alterações sazonais, mas a diferença de preço reside nos produtos escolhidos e na sofisticação dos pratos.”
Quanto às sobremesas, salientam-se tarte de queijo do Guelra (6€), churros com toffee do mar, panados em açúcar e canela, com molho de caramelo que contém dashi e fish sauce (4,50€), e pérola do oceano, que muda conforme as frutas da época. Agora é com alperce grelhado, em coulis e gelado, coberto com espuma de chocolate branco e baunilha (8€).
Os vinhos de talha nacionais, tal como n’O Frade, ocupam lugar cimeiro na respetiva carta. Há ainda vinhos franceses e cocktails exclusivos a 12€, como a bica dos frades (vodka, café e licor de café) ou ginger basil smash (gin, clara de ovo, maracujá, limão e manjericão).
O piso de baixo do espaço possui cozinha, balcão com sete lugares e esplanada para 36 pessoas. O de cima também tem cozinha, além de uma sala com 32 vagas, perfazendo o total de 75 lugares disponíveis no restaurante.
Com 42 anos, Sérgio conta com o irmão, Pedro Frade, 45, e Alessandra Haiat, 42, como diretores de operações. “Quando dirigimos um grupo com várias casas, não podemos ser o tradicional dono que está sempre no restaurante. É preciso contratar pessoas competentes e saber confiar nelas.” Por outro lado, há coisas que permanecem iguais. “N’O Frade éramos 15 pessoas, agora somos mais de 60. O espírito de família não mudou, continuamos a trabalhar com grande entreajuda.”
Apesar da abertura recente, o Guelra já se mexe para concretizar um plano arrojado, pronto a arrancar no início de 2024. “Vamos lançar um menu de degustação em que o cliente escolhe um produto, por exemplo, corvina, e o chef cria vários pratos para surpreender quem faz o pedido, no momento.”
A seguir, carregue na galeria para ver o espaço do Guelra e dos pratos que pode provar por lá.