“Tantura é um massacre.” As palavras foram pintadas a vermelho e preto na fachada do Tantura, no Bairro Alto, no passado dia 12 de junho. O espaço de comida israelita foi vandalizado por ativistas do Coletivo pela Libertação da Palestina.
“Um grupo de militantes antissionistas grafitou as paredes do restaurante Tantura, em Lisboa, em solidariedade com a resistência palestiniana”, partilhou o Coletivo nas redes sociais.
“Escreveram as frases ‘Tantura é um massacre’ e ‘Free Palestine’, como forma de denunciar o espaço sionista que diz servir ‘as receitas mais conhecidas da culinária israelita’, mas é, na verdade, um projeto de apropriação cultural e de branqueamento da Nakba [a grande expulsão dos palestinianos que ocorreu após a fundação do estado de Israel]”, lê-se na publicação onde reivindicam o ato de vandalismo.
O grupo refere-se ao nome escolhido para o espaço de Elad Bodenstein e Itamar Eliyahuo, o topónimo de uma localidade situada na costa mediterrânea de Israel, que foi território palestiniano até 1948.
“Em toda a presença online ou offline do restaurante (incluindo em entrevistas e posts nas redes sociais), não parece haver qualquer tipo de reconhecimento do massacre de Tantura, nem qualquer menção à aldeia palestiniana destruída pelo projeto colonial israelita”, acrescenta o coletivo.
O conflito de Tantura
Até 1948, a localidade não passava de uma tranquila aldeia costeira, nas encostas do Monte Carmelo, no Norte da Palestina. Tinha cerca de 1.700 habitantes que viviam da pesca, do cultivo de cereais e de pomares. Com o estabelecimento de Israel, o líder David Ben-Gurion terá ordenado à milícia sionista Haganah que “limpasse” aquela e outras aldeias que formavam um enclave árabe na faixa entre Telavive e Haifa.
Os detalhes sobre o que realmente aconteceu na madrugada de 22 para 23 de maio de 1948 em Tantura continuam por desvendar. Até hoje, nenhuma entidade internacional confirmou a existência de um massacre.
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Nos últimos anos foram feitos estudos e pesquisas, mas ainda não foram encontradas provas que confirmem a versão dos sobreviventes. Os palestinianos continuam a acusar a milícia judaica de genocídio e de terem enterrado os corpos numa vala comum, onde hoje está um parque de estacionamento.
Em 2022, o filme “Tantura”, do realizador israelita Alon Schwarz, voltou a levantar muitas dúvidas sobre o alegado massacre. Schwarz partiu das gravações de um antigo universitário palestiniano, Katz, que tinha tentado reunir provas sobre o dia fatídico. O cineasta recuperou os áudios e fez novas entrevistas a vários ex-soldados judaicos e outras testemunhas que confirmam o massacre e fornecem detalhes aterradores.
Provocação ou homenagem?
O nome do espaço que Elad Bodenstein e Itamar Eliyahuo abriram em Lisboa após passarem a lua de mel no País deixou os defensores da causa palestiniana melindrados. Porém, o casal afirmou à NiT que nunca se tratou de uma provocação. “É o nome da vila onde vivíamos em Israel”, explica Elad, de 46 anos.
No país natal tinham uma pequena empresa de organização de eventos. “Eu era designer de interiores, o Itamar trabalhava na área do marketing.” De casamentos, festas a outros eventos faziam um pouco de tudo na região, sempre com comida típica de Israel. Quando se mudaram para Portugal quiseram continuar na área e abriram o Tantura.
“A nossa missão no restaurante é oferecer boa comida e um bom ambiente a quem nos visita. Ficámos, por isso, muito tristes com a vandalização”, admitem.
O casal explicou à NiT que, quando inauguraram o espaço, queriam apenas homenagear a cidade natal. “Abrimos em 2017, o documentário saiu em 2022. Na altura não tínhamos conhecimento das alegações sobre Tantura. Não somos políticos. Vivemos num país que amamos, unindo pessoas e culturas através da comida”, acrescentam.
Apesar do incidente, Elad e Itamar mostram-se comovidos com a reação de clientes à situação. “Estamos extremamente gratos pela solidariedade que recebemos, das autoridades às pessoas que não conhecemos, confirmando que temos de perseverar no nosso sonho: proporcionar boa comida e momentos de alegria aos portugueses”, rematam.
O que pode encontrar no Tantura
“Não há pratos tradicionais só de Israel. O menu de fusão tem influências de vários países, como a Roménia, a Polónia, a Tunísia ou Iraque.” O leque de propostas servidas no Tantura é descrito pelos proprietários como “cozinha mediterrânica”. Para começar há variedades de shakshuka, ovos estrelados com molho de tomate, ervas e pão de cervejas. Chegam com vegetais, carne, ou espinafres salteados — custam desde 7,80€.
Para petiscar há falafel com molho de tahine, uma especialidade muito pedida nos serviços de catering. Vêm oito bolinhas de grão fritas — custa 2,90€. Tem ainda o sambusak, um pastel recheado com cebola e grão-de-bico (4,50€), o pastel de queijo feta com espinafres (5,20€) ou a couve-flor fumada com molho tahine (5,80€).
A par do falafel, o hummus também era dos petiscos mais servidos na empresa de catering de Elad e Itamar. No novo Tantura servem-no simples (6,25€), com beringela e ovo benedict (7,25€), com pimentos (7,25€) ou almôndegas (8,25€). As pitas são outras as secções do menu. Tem as recheadas com shakshuka (6,50€), a com schnitzel, com panado d frango e salada (6,90€), almôndegas e molho de tahine (6,90€), ou sabich, com beringela frita e salada (5,50€).
Há ainda sobremesas com nomes estranhos, mas combinações que vai querer pedir. A basbusa é um bolo de sêmola com açúcar e água de rosas (3,50€), o mauari um pudim de leite com topping de amendoim e framboesa, e o halva sementes de sésamo, moídas e torradas com pistácio, mel e baunilha (4,25€).
“Todos os ingredientes frescos são dos mercados aqui da zona, já as especiarias trazemos mesmo de Israel.” O novo restaurante tem capacidade para 38 pessoas e está decorado com muitas peças que Elad e Itamar fizeram pelo mundo. Em Portugal, além de Lisboa, já estiveram na Arrábida, no Alentejo e no Porto. “Se não abríssemos o restaurante em Lisboa, seria no Porto, com certeza.”
Carregue na galeria para ver mais imagens do espaço israelita no Bairro Alto, em Lisboa.