Em 1901, Dom Carlos I, então rei de Portugal, viajou para a Madeira e ficou instalado numa das mais modernas estalagens da ilha, na Encosta Velha do Palheiro, no Funchal. O dono proprietário, John Burden Blandy, organizou nessa ocasião um faustoso banquete para o receber. Esqueceu-se apenas de uma coisa: palitos.
Cúmulo dos azares, o monarca pediu um depois do almoço e o proprietário da estalagem desatou a correr para afiar um fósforo para o enganar — e conseguiu. A história continua a ser contada mais de um século depois, sobretudo porque a pequena estalagem foi transformada, em 1997, num boutique hotel chamado Casa Velha do Palheiro, que pertence à Relais & Chateaux. Passados 27 anos, o grupo decidiu apostar no fine dining com o Oxalis, que abriu em novembro de 2024.
O restaurante comandado pelo chef Gonçalo Bita Bota está inserido no Palheiro Nature Estate, uma encosta com vistas deslumbrantes sobre o Oceano Atlântico e a cidade do Funchal. Com uma paisagem de fundo como esta, o cozinheiro lisboeta quer aproveitar o “terroir insular” e tudo o que a terra lhes dá. Com isso em mente, começou a cultivar o máximo possível na horta do espaço, para servir à mesa.
“Temos uma herdade com cerca de 120 hectares e tentamos usar tudo o que produzimos no jardim na cozinha. Tenho um objetivo em mente complicado, mas alcançável de usar 100 por cento de frutas e legumes madeirenses. Parece fácil porque a ilha tem produtos incríveis, mas o desafio está na quantidade necessária”, explica Gonçalo Bota, de 36 anos à NiT.
A mesma lógica é usada para os peixes e mariscos, que são naturalmente pescados na costa da ilha. A única exceção são as carnes, sobretudo trazidas dos Açores ou do Alentejo. “Fazemos uma aposta clara em peixes locais, mas nada de aquacultura. É tudo de pesca sustentável e tentamos trazer peixes pouco conhecidos como o carneiro, que tem uma textura incrível e parece uma lagosta”, acrescenta.
Gonçalo Bita Bota sempre sonhou com o mundo da hotelaria. Aos 18 anos, o lisboeta, mudou-se para Londres para estudar gestão hoteleira e desde aí passou por vários hotéis e restaurantes até em 2014 voltar para Portugal e abrir um bar com um estilo muito britânico, o The George Pub. Depois rumou ao Algarve onde abriu o primeiro restaurante, o Vista Villas de Água e fez ainda uma temporada em França num chateau privado.
Após essa experiência decidiu fugir do caos e refugiar-se na Madeira, de onde a mulher é natural, para criar o filho de ambos e viver uma experiência completamente diferente. Meses mais tarde estava a assumir a cozinha da Casa Velha do Palheiro e a honrar a lenda sobre reis, palitos e detalhes.
Truta do Chão da Ribeira, tomate-inglês e gelado de funcho; Bodião com variações de funcho e holandês de miso com mel de cana ou ainda cherne com halófitas, carolino, ouriço-do-mar e emulsão erva caninha formam alguns dos momentos do menu de degustação (110€).
Ao longo de 10 criações, o restaurante que ganhou o nome de uma das flores arroxeadas que nasce no jardim da propriedade convida a uma “experiência gastronómica dinâmica e de enorme proximidade”. Foi com esse objetivo em mente que apostaram numa cozinha em open space, de forma a que os clientes consigam ver tudo desde os 35 lugares instalados na sala principal.
A decoração serve de ponto de partida para a envolvência com a natureza, num cenário pontuado por tons verdes e acastanhados. “Quisemos que as coordenadas para esta viagem pelos sabores da ilha fosse feita com o conforto e a sofisticação que sempre foram a imagem da Velha Casa do Palheiro.”
Além do menu mais extenso, que conta com três finger bites, três pratos de peixe, um de marisco (que normalmente é trabalhado com cavaco da Madeira) e três sobremesas, os clientes podem optar por algo mais curto com apenas três pratos e por um preço mais baixo de 55€.
“É uma forma de locais e turistas terem uma perceção do melhor que se pode encontrar na ilha”, refere o chef sobre a ideia de encurtarem os momentos. A experiência só fica completa com uma harmonização vínica (45€), na qual são servidos vinhos portugueses e madeirenses e espumantes locais. Em breve haverá ainda a opção de escolher um pairing não alcoólico com kombuchas feitas no restaurante com flores e plantas comestíveis. “Iremos incluir este pairing com o menu da primavera”, adianta o chef.
Carregue na galeria para descobrir o novo restaurante da ilha.