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Restaurantes

O tasco lisboeta que serve quilos de bacalhau à minhota (e ainda se joga à lerpa)

O Esquina da Fé celebra esta sexta-feira, 43 anos. O ambiente continua acolhedor, com pratos tradicionais.

Numa das dezenas de viagens de comboio que fazia entre a periferia e o centro de Lisboa, João Gomes conheceu aquele que viria a ser o seu parceiro de lerpa. José Meireles alinhava com o minhoto nos jogos de cartas — mesmo quando tinham de acabar a jogada fora do comboio, debaixo de um poste de eletricidade. Conheceram-se por acaso e acabaram por se tornar sócios numa das tascas mais concorridas de Lisboa.

João Gomes fez as malas com 14 anos e saiu de Sande, em Vila Verde, rumo à capital para procurar uma vida melhor. Os pais agricultores deram o mesmo conselho aos nove filhos: terminar o estudo da quarta classe para depois procurarem trabalho. O minhoto acabou por escolher começar como pandeireiro na Brasileira, onde o ordenado era à base das gorjetas que os clientes lhe davam. Depois conseguiu trabalho numa tasca da rua dos Correios, onde começou a aprender a cozinhar. Passou por vários espaços até que entrou no Bolta Alta, no Bairro Alto, onde se consolidou como cozinheiro.

Era por lá que fazia as especialidades da sua terra, quando numa das jogatanas com Meireles comentou que se aparecesse um negócio ou um sócio para se estabelecer iriaa aproveitar. O parceiro não perdeu tempo.

“Ele tinha uma sociedade noutro espaço que decidiu desfazer para abrir um restaurante comigo. Acabámos por encontrar uma pequena tasca perto da Avenida da Liberdade e aproveitámos”, conta à NiT o cozinheiro de 72 anos.

O restaurante abriu a 14 de junho de 1983. Na verdade, como revela o fundadora agora, os dois amigos tinham tudo pronto para abrir no dia de Santo António, mas tiveram medo da enchente e decidiram aguardar. “Trabalhámos à porta fechada para garantir que tudo ficava impecável para abrir no dia seguinte e desde aí nunca mais paramos”.

A Esquina da Fé, que recebeu o nome de um cartoonista, tem capacidade para receber 64 clientes. Todos os dias serve pratos diferentes. Os mais procurados são o cabrito assado no forno, o polvo à lagareiro e a feijoada à transmontana que João faz questão de fazer tal como aprendeu com a mãe. Estes são servidos entre quinta-feira e domingo. Nos restantes dias há sardinha assada (10,50€), bife de atum (12,95€), salmão grelhado (12,95€) ou pescada cozida (10,95€).

Quem tem sorte e passa por lá no dia do bacalhau recebe uma verdadeira festa. “Os clientes adoram o bacalhau à minhota, feito à moda de Braga com vinho verde e servido com batatas fritas às rodelas”, refere. O prato custa 17,50€, mas João garante que é o bestseller.

As outras especialidades são as pataniscas com arroz de tomate (10,75€) ou a jardineira de vitela. Por vezes gosta de inovar e preparar o bacalhau à moda do Douro, que é envolvido em vinho do Porto e servido com batata panada. “Fica um pouco adocicado, mas sem enjoar”, diz. João Gomes garante que escolhe apenas postas do lombo — “não há cá badanas nem aparas nestes pratos”.

No final, o gerente convence ainda os clientes a pedirem uma das sobremesas da casa, que também são feitas pelo próprio. Há leite-creme, bolo de bolacha, pudim de ovos ou tarte de amêndoa e requeijão. Quem preferir pode pedir uma torta de laranja ou fruta da época. São todas caseiras e o preço não será imperativo na escolha, uma vez que não ultrapassa os 3€.

Para acompanhar há sempre jarros de vinho a sair do balcão. Branco ou tinto, não importa, porque os amigos garantem que “é sempre bom e fresco”. A proposta da casa é produzida em Aveiras de Cima. João jura que são o melhor acompanhamento para os pratos que ali faz diariamente.

O Esquina da Fé é ainda ponto de encontro de atores dos teatros mais próximos e até de alguns que vêm do estrangeiro. Um deles, segundo João, era o pistoleiro dos filmes de faroeste, mas não se consegue lembrar do nome.

“Temos clientes que já me conheciam do Bota Alta. Uma das atrizes de revista da altura brincava comigo a dizer que só eu é que sabia dar-lhe de comer, por isso veio atrás de mim para cá”.

O restaurante celebra esta sexta-feira 42 anos, mas a azáfama e os pratos nunca mudam. “Aqui serve-se bem, à moda do antigamente. Eu continuo na cozinha e o Meireles a servir os clientes como sempre fez”.

FICHA TÉCNICA

  • MORADA
    Rua da Fé 60
    1150-151 Lisboa
  • HORÁRIO
  • Quarta a sábado das 12h às 15h30 e das 19h às 22h30
PREÇO MÉDIO
Entre 20€ e 30€
TIPO DE COMIDA
Portuguesa

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