Ao ouvir o nome Yakuza, é impossível não pensar na mística e no imaginário associado à famosa organização japonesa conhecida pelos seus códigos de honra, aura de mistério e…como é que se chama aquilo? Crime, é isso. Mas, no caso do Yakuza Lisboa, nada há a temer, aliás, o único crime é eu não ter ido lá mais cedo. Já ao nível do mistério a questão que fica no ar é como é que Olivier da Costa consegue pegar em conceitos gastronómicos tão diferentes e gerir com savoir-faire um portfólio de 28 restaurantes, espalhados por mais de cinco países. Olivier é uma máquina de somar sucessos e não está com vontade de parar por aqui. Abriu o ano passado, em Lisboa, o À Costa e para este ano de 2025 está no forno o lançamento de dois novos restaurantes.
Mas regressemos ao Japão. A primeira coisa que devo confessar é que ia com expectativas mais altas que o preço do atum bluefin no mercado de Tsukiji. Logo à entrada somos acolhidos por uma estatueta de samurai, cuja postura imponente parece saudar-nos como que a dizer: “Bem-vindos ao meu dojo gastronómico”. Como este Bushi é um boneco e não fala, na realidade quem nos deu as boas-vindas, com um sorriso caloroso, foi a anfitriã do espaço que logo depois nos conduziu até à nossa mesa.
No Yakuza o balcão de sushi é o coração da sala e é aqui que os chefs trabalham com uma mestria que nos deixa hipnotizados (e com fome só de olhar). As mesas estão dispostas de forma a criar um espaço acolhedor, mas descomprometido. Aqui a ideia é conviver e desfrutar, com nível, mas sem grandes cerimónias.
Antes de fazermos o pedido, o João, que nos servia, sugeriu que experimentássemos um dos cocktails de assinatura. Pedi um ‘First Floor Collins’ (com Morango, Citronela, Beefeater, St. Germain e Perrier Jouet Brut), uma espécie de primo do ‘Tom Collins’ que estava bem jeitoso e que abriu o apetite para a avalanche de comida que viria de seguida. Estão prontos? Se estiverem neste momento a fazer jejum intermitente, mudem de página porque há uma fortíssima probabilidade de ficarem com água na boca e estragarem a abstinência.
Começámos com o New Style Hamachi de Yellowtail com molho Ponzu Trufado. Era leve, refrescante e desapareceu do meu prato mais rápido que aquele ex-deputado do Chega a sair do aeroporto. A seguir vieram os Tacos Sakana, com peixe e guacamole, numa pequena homenagem ao México, mas com um toque nipónico.
A proposta seguinte foi uma travessa de ostras, num frente-a-frente França vs Portugal. Eram cremosas, bem frescas e servidas com uma apresentação digna do Instagram do presidente Isaltino. No duelo final o meu paladar recaiu para os bivalves nacionais, que tinham aquele sabor a mergulho na praia de Alvor, tal como deve ser.
O repasto ainda estava longe de terminar porque o João informou-nos que estavam a chegar os famosos Gunkan, que merecem uma dissertação própria. Veio de tudo: Toro, Hotate, Shiromi, Rei, Ama ebi e Iwashi. Destaque especial para dois: o Gunkan Rei, com salmão, caranguejo real e ovo de codorniz e o Gunkan Ama ebi que junta Yellowtail e camarão doce do Alaska.
“Vieiras com cogumelos?” Perguntou o João de forma discreta, mas retórica, uma vez que a este ponto já todos sabemos que a comida vai continuar a vir até alguém levantar uma bandeira branca ou desmaiar. Mas como ainda estávamos longe disso respondi “porque não?”, enquanto me servia destes deliciosos moluscos regados com soja e molho shiso.
Quando chegaram à mesa as travessas de Nigiri senti que a cozinha estava a brincar com a nossa capacidade de comer sem rebentar. Nigiri Enguia New Style, com tutano e mostarda, Nigiri Toro e caviar, Nigiri Toro maturado, com gengibre fresco, kizami wasabi e soja e finalmente o Nigiri Wagyu com wagyu austrália, ovo de codorniz confitado e trufa. O wagyu já é só por si uma peça de arte gastronómica, com este arranjo fica definitivamente uma escultura que se desfaz na boca.
Se podíamos ter parado por aqui? Podíamos perfeitamente e íamos satisfeitos da vida para casa. A rebolar, é certo, mas com uma boa história para contar. Mas quando chegaram os Sashimi, de toro, salmão, yellowtail e vieira seguidos de Spider Roll de caranguejo, salmão, abacate, masago, molho wasabi, alho francês e agrião, olhei para a mesa e pensei: “Ok, já perdi o controlo da situação.”
Ainda assim, já se sabe que nenhuma refeição de marisco fica completa sem um preguinho para fechar. Neste caso não foi propriamente uma mariscada, mas a regra aplica-se com a mesma propriedade após uma pratada de sushi. Pelo que recebemos com enorme satisfação e sem qualquer esforço adicional, o Preguinho Yakuza, um lombo de novilho em pão brioche, com caviar, trufa e flor de sal.
Ainda têm um espacinho no estômago para ler sobre as sobremesas? São só duas porque não se deve comer muito ao jantar. Primeiro, o famoso Kit Kat, descrito no menu como “sucesso garantido”. Ora, sucesso garantido, de facto. Era uma mousse cremosa, entremeada com pedaços de Kit Kat, tudo isto sobre um tapete de barrinhas desconstruídas. Basicamente, um sonho de infância transformado em realidade gourmet.
Depois, o cheesecake. E neste particular tenho de dizer que sempre achei o cheesecake um doce sobrevalorizado e até achei estranho figurar nesta carta. O cheesecake de yuzu com sésamo negro e framboesas crocantes era leve, equilibrado, e com aquele toque de frescura que calha sempre bem depois de uma dose valente de iguarias.