“Quando comprei o meu primeiro restaurante, não tinha absolutamente nenhuma experiência na cozinha”, recorda Paulo Pires, que hoje elabora todos os pratos servidos no Paullu’s. A mudança de rumo profissional foi bem sucedida — no restaurante em Odivelas, formam-se filas à porta. A maioria dos clientes aguarda para saborear a sua célebre francesinha, feita com um molho exclusivo e carne cortada no momento da preparação. Mas vamos por partes.
Paulo saiu da aldeia de Murçós, em Macedo de Cavaleiros, aos 15 anos, deixando para trás a família e uma vida ligada à agricultura para se tornar aprendiz de soldador. Com apenas 17 já era um profissional na soldadura, mas um problema de saúde forçou-o a afastar-se dessa profissão, levando-o a explorar novos caminhos.
Agarrando todas as oportunidades que surgiam, tornou-se vendedor de peças de automóveis, trabalhou como abastecedor de combustível e, aos 19 anos, completou um curso profissional de mecânica. Mais tarde, comprou uma oficina com o irmão.
Ao lado da sua oficina de pintura automóvel, na Buraca, existia um restaurante onde os funcionários de Paulo costumavam almoçar. Servia pratos do dia e grelhados e tinha “uma boa reputação”. Quando os proprietários decidiram reformar-se e vender o restaurante, Paulo viu ali uma oportunidade de negócio.
“Comprei o restaurante em 1995, com a intenção de que fosse para a minha mulher, que trabalhava num café. Mas, quando o negócio se concretizou, a Fátima já tinha fechado uma sociedade com os irmãos para ficar com outro estabelecimento. Com um restaurante nas mãos, mas sem saber nada sobre o assunto, decidi ficar com a equipa antiga. Sem perceber, dei o passo em direção ao mundo da restauração”, recorda o cozinheiro.
Contra todas as expectativas, o espaço tornou-se num fenómeno. Servia apenas comida tradicional portuguesa e grelhados que eram preparados na rua, num bidão cortado ao meio. “Toda a gente que passava por ali, ficava a olhar, admirada.” Dois anos depois, a sua equipa saiu, e Paulo viu-se sem trabalhadores para manter o negócio. A única solução foi assumir o comando da cozinha.
“No início, andei a observar como cortavam as carnes no talho. A partir daí, comecei a fazer os cortes e a grelhar as carnes. E foi aí que começou a fama das nossas carnes. O único segredo é a qualidade e o facto de serem cortadas no momento”, esclarece.
Enquanto o negócio de Paulo prosperava, o de Fátima e dos irmãos, em Odivelas, não ia tão bem. O cozinheiro decidiu deixar a Buraca e assumir o espaço da mulher. Em 2000, nasceu o Paullu’s. “Mantive o conceito das carnes grelhadas. Mais tarde, em 2004, já com outra paixão pela cozinha, introduzi a francesinha. Fui um dos primeiros em Lisboa a fazê-lo, o que contribuiu para o sucesso”, explica.
Até então, Paulo nunca tinha tentado preparar a famosa sanduíche portuense, mas após uma visita ao norte, onde a experimentou, decidiu aventurar-se.
“Naquela altura, andava a tentar fazer uma vitela estufada semelhante à que a minha mãe fazia quando era miúdo. Ela tinha morrido há uns anos e não tinha a receita. Quando cheguei a uma versão que o meu irmão provou e adorou, percebi que poderia tentar recriar a francesinha, mas com um molho semelhante ao daquela receita. Então, pus mãos à obra e criei um molho à base daquela carne”, conta.
A tentativa saiu bem, e após vários anos a aprimorar a receita, o Paullu’s tornou-se famoso pela sua francesinha na Grande Lisboa. “O molho é o mais natural possível, feito com caldo de legumes e a água da cozedura das carnes, e leva cinco horas a ficar pronto. A francesinha é preparada com bife da vazia cortado na hora, uma salsicha exclusiva do nosso espaço, fiambre, paio e queijo flamengo português. O verdadeiro segredo reside na frescura e na seleção cuidadosa dos ingredientes”, confessa.
Paulo já desenvolveu várias versões — a especial (13,85€), a portuense (12,85€),a invicta (12,85€), a burguesinha (12,25€) e vegetariana (13,85€), — e todas agradam aos clientes. O sucesso reflete-se nos números: por dia, vende mais de 200 francesinhas.
O restaurante oferece também pratos do dia como feijoada, arrozada de lulas frescas (13,45€), cabidela de galinha (12,45€), frango assado no forno (12,75€), iscas (12,45€) ou cozido. “Não temos um menu fixo; todos os dias, procuramos oferecer quatro opções: dois grelhados e dois fritos ou assados. Uma coisa que nunca falta é a vitela no pote (12,95€), servida numa panela de ferro antiga com três pernas.”
As refeições terminam com outras criações de Paulo. “Gosto de brincar com a fruta e os contrastes de sabores. Criei uma laranja assada (4,85€), servida com um crumble de bolacha torrada; uma sopa de melão (4,55€) e uma banana à chef caramelizada (4,85€).” Para acompanhar, há uma “diversidade de vinhos”, mas os clientes costumam optar pelas sangrias de melão (13,95€), frutos vermelhos (14,95€), ananás com coco (13,95€) ou lima com hortelã e gengibre.
O Paullu’s conta agora com duas amplas salas que acomodam até 230 pessoas. Nos últimos anos, o restaurante já ganhou um “irmão” no Parque das Nações, e a expansão não parar por aqui. Nas próximas semanas, o casal planeia inaugurar o terceiro espaço, desta feita em Odivelas, nas Colinas do Cruzeiro.
O percurso de Paulo Pires não foi, como na maioria dos cozinheiros, movido pela paixão pela área. No entanto, hoje não consegue imaginar a sua vida sem a cozinha. “Apaixonei-me por isto. Mas reconheço que foi a resiliência em momentos difíceis que me fez perceber que este era o meu caminho. Acabei por ser sempre empurrado para a cozinha, onde agora passo a maioria do meu tempo”, admite.
Autodidata desde o início, em 2018, Paulo inscreveu-se numa pós-graduação em Gastronomia Criativa na Universidade Europeia, onde concluiu o curso com uma média de 17 valores. No ano seguinte, foi convidado pela instituição a dar aulas de gastronomia durante dois anos e a ser júri nas pós-graduações subsequentes. Agora, utiliza o restaurante para receber alguns alunos que desejam aprender. “Gosto muito de ensinar os jovens, e muitos deles acabam por ficar connosco, a contrato”, conclui.
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