O espaço Os Bárbaros nasceu do desejo de transformar uma ida ao cabeleireiro numa experiência completamente distinta da habitual. Nascido num local cheio de história — uma antiga sapataria com mais de 40 anos — o conceito combina os cuidados com a aparência com um serviço de café num ambiente acolhedor.
Paulo Fraga tem 52 anos e conta com mais de 25 anos de experiência como cabeleireiro. Mudou-se do Brasil para Almada, em 2008, e mora precisamente no prédio que fica por cima da loja. “Quando me mudei para cá, o espaço estava fechado e comentei que isso podia dar alguma história”, começa por contar. Em conversa com a população residente na zona (que esteve na origem da criação do projeto comunitário Estuário Coletivo) descobriu mais sobre as memórias do local e nasceu o desejo de se estabelecer ali.
“Não podia abrir só uma barbearia por causa da população feminina e, para abrir um cabeleireiro, também já existem muitos”, avança. O local não está situado numa avenida ou numa zona comercial — fica por baixo das arcadas de um prédio. Rapidamente percebeu que tinha de se destacar e surgiu a ideia de criar um café-cabeleireiro. “Queria um espaço onde pudesse atender tanto os meus clientes, como as pessoas que passam e querem aproveitar a esplanada e tomar um café”, explica Paulo.
A loja de Os Bárbaros é pequena, de 28 metros quadrados, o que leva quem passa pela monstra a acreditar que se trata realmente de um café. No interior, o ambiente faz com que pareça um espaço masculino, uma vez que a ideia passava também por construir algo semelhante a uma barbearia “para que uma mulher se sentisse à vontade num lugar que antigamente não frequentava.”
A decoração vintage, mesclada com um ligeiro toque industrial, é o que torna a atmosfera do negócio ainda mais atrativa. Paulo Fraga tratou das obras e de tudo o resto. Aplicou o papel de parede, pendurou os quadros, e selecionou os objetos encontrados na rua, em feiras da ladra ou que lhe ofereceram. “Fiz tudo durante um dos primeiros confinamentos, aluguei a loja em 2020. “Em dezembro, começou um novo confinamento e não podia abrir a loja”, conta. Aguardou e, no dia 31 de março de 2021 abriu oficialmente.
Durante o período das obras, teve a oportunidade de conhecer o sapateiro a quem pertenceu o estabelecimento durante quatro décadas, que acabou por encerrar devido à crescente falta de interesse pelos serviços tradicionais de sapataria. Agora, tem uma nova vida — e um novo visual.
“Quando se fala de abrir o próprio negócio não é assim tão fácil. Estou sozinho e faço a gestão do café, do cabeleireiro e da minha vida pessoal. Tenho de receber fornecedores, pagar as contas e atender os clientes”, sublinha o brasileiro, que vendeu a loja que tinha no país de origem para vir para Portugal. Trabalhou em vários projetos diferentes em solo nacional, inclusive num estúdio de tatuagens que também oferecia serviços de cabeleireiro e bar. Depois, ficou algum tempo parado e aproveitou para desenvolver uma linha de produtos para a barba. Nunca abandonou a sua profissão.
“Defini uma forma de gerir o espaço em que não marco clientes de cabelo num período que estipulo para atender o bar”, revela. “Se estou a cortar o cabelo de uma senhora, chega uma pessoa e quer tomar um café ou uma cerveja, é fácil ir lá servir. Nesse não sirvo uma tosta ou uma torrada, por exemplo.”
À sexta-feira, Paulo Fraga organiza uma happy hour, que fez sucesso no verão por causa da esplanada. Prepara jarras de sangria que vende a copo e coloca música ambiente — a atmosfera extremamente familiar atrai muitos clientes que moram no prédio. Atualmente, já chegam pessoas mais longe, em família, porque também serve refeições ligeiras. O cabeleireiro conta que, no ano passado, se dedicou a preparar petiscos temáticos inspirados, por exemplo, nas culturas árabe e mexicana.
Recentemente, o espaço foi utilizado por um conhecido músico português para a gravação de um projeto pessoal. “O Carlão é um vizinho, tem um estúdio praticamente ao lado da minha loja”, revela o cabeleireiro. Quando o artista passou por lá com um realizador, para tomar um café, a sua manager explicou o projeto “Bebe-se um café, escreve-se um refrão” — e a ideia era aproveitar o local de trabalho de Paulo como cenário. Não cobrou pela utilização do espaço e recebeu a equipa de gravação e os convidados, como Carolina Deslandes, Dino D’Santiago e The Black Mamba. A iniciativa acabou, segundo o criador do estabelecimento, por movimentar a vizinhança.
“Já recebi várias propostas para outras gravações: de comerciais, videoclipes e quase consegui — não foi possível por causa do tempo – que fosse gravada aqui uma cena de La Casa de Papel”, conta Paulo. O sucesso reflete não só o potencial visual das escolhas de decoração, como a coragem criativa de abrir um espaço imprevisível. Porém, no início, foi alvo de muita desconfiança por parte de pessoas a quem descrevia o projeto.
Neste momento, a presença digital de Os Bárbaros passa pelo Instagram e pelo Facebook. Carregue na galeria para ficar a conhecer um pouco melhor este espaço.