“Um criativo só é realmente livre se não tiver imposições ao seu trabalho”, começa por sublinhar a arquiteta Sandra Casinha. Por isso, sempre que é contactada por um novo cliente, começa por perguntar se já viram o seu portefólio. “Somos artistas e, por isso, tem de haver logo uma relação de empatia”, explica à NiT.
Contudo, desenvolver uma ligação mais profunda é um processo demorado. Foi o que aconteceu quando enviou uma apresentação a um jovem casal do Porto. Eles viram o documento, estranharam as imagens e voltaram a fechar o computador. Tinha passado algum tempo quando regressaram às fotografias e tiveram uma reação mais positiva.
Apesar da hesitação inicial, os clientes deram-lhe toda a liberdade para explorar a sua criatividade. Só havia um pedido: não podiam gastar muito dinheiro e, por isso, a arquiteta concretizou o plano com um orçamento que não ultrapassava os 1.200€ por metro quadrado.
Assim nasceu uma moradia de dois andares, em Gondomar, conhecida como Casa Pátios de Pétalas, devido à inspiração na natureza. Criada como uma grande flor, destaca-se pelas várias pétalas que rodeiam a fachada do piso superior através de vários volumes, que convergem entre aberturas e pátios.
“Tive esta ideia porque o meu trabalho é muito à base de formas orgânicas. Na faculdade, já tinha esta abordagem, mas também trabalhei outras correntes arquitetónicas”, conta. “Entretanto, houve uma maturação e estou numa fase em que as pessoas me procuram porque querem algo diferente.”
As pétalas surgem em cima, pousadas sobre um grande envidraçado no chão, e foram pensadas de modo a dar a ideia que estão a cair para dentro do pátio. O piso térreo assume uma forma de U, que “cria uma base de luz da qual emanam as estruturas florais que rodeiam a fachada superior”.

“Acabei por assumir também o papel de promotora imobiliária, porque controlei todo o processo. Fui ao vidraceiro, ao serralheiro e às casas de materiais de construção, numa administração direta para conseguir manter-me dentro do valor que podiam gastar”, recorda.
Uma vez que se tratava uma flor, Sandra podia ter optado por tons como o rosa ou o vermelho. Porém, optou por uma estrutura totalmente branca que remete para uma escultura. “É um tom mais expressionista, que torna a forma mais singela, mais calma e tranquila.”
Além disso, foi uma escolha estratégica para encaixar no orçamento. “Apenas queria usar a forma e a pintura. No entanto, a única tela no mercado que me permitia isso, a nível de construção, é uma introdução líquida que só existia em branco.”
Para que a cobertura se destaque na paisagem, optou por um leque de materiais limitado, tal como o alumínio, o vidro ou a madeira para a parte inferior. Como são opções leves, a fachada ganha mais expressão e realça-se o volume branco organicista, ao qual é dado todo o protagonismo.
As escadas são o botão da flor
Lá dentro, foram criadas ainda várias curvas e recortadas que suportam toda a estrutura e organizam o espaço a nível tipológico. É o caso da escadaria imponente, no coração da casa, que é comparada ao botão da flor. “Queria usar cores da natureza então juntei o camel, cores mais térreas e um verde seco, com a madeira ou o pinho.”
Devido às leis urbanas da Câmara Municipal, a casa tinha de ser quadrada. Se podia ser um obstáculo, acabou por ser uma ajuda visto que “precisava de ser concisa, coesa e compacta”, explica.
Apesar da dimensão reduzida — cerca de 230 metros com a garagem —, a moradia parece mais ampla devido às paredes curvas no interior. Além de dividirem os vários espaços, facilitam as transições fluidas entre eles.
A partir das escadas, que funcionam como articulação entre o espaço mais técnico e as áreas sociais, criam-se momentos de transição que foram importantes para distribuir o programa. A cozinha instalada no rés do chão funciona em open space com as salas de estar e jantar e com o escritório, graças a uma barreira orgânica.

Na parte de cima, a aposta passou apenas por suítes, cada um com o seu próprio terraço ao ar livre. No caso das duas meninas, filhas do casal, foram feitos dois quartos com uma casa de banho em comum, cuja parede curva é rosa e se destaca da paleta mais neutra que se vê no resto da casa.
“Quando crescerem, podem colocar um vidro no meio porque é um duche grande e as entradas são independentes”, refere. “Tudo isto foi pensado para criar momentos de estar diferentes, em que os proprietários se sentem bem e colmatar a falta de mais área.”
A nível da decoração, também optaram por tecidos aconchegantes, nas cortinas ou nos tapetes. As cores pastéis neutras pintam os vários objetos e detalhes que estão reunidos nas várias áreas, assim como os materiais naturais que contribuem para um design mais discreto e elegante.
Se Sandra teve toda a liberdade neste projeto, quis retribuir com a possibilidade de transformar a área. “A estrutura dá a possibilidade de deitar tudo abaixo amanhã e fazerem uma nova tipologia”, conclui. Esta flexibilidade é uma parte essencial do seu ADN, identificando sempre o cliente no futuro da propriedade.
Carregue na galeria para ver mais imagens da casa, captadas pelo fotógrafo Ivo Tavares.