A data de 1936 e as iniciais do avô de Raulino Silva continuam gravadas na fachada da casa. Quando foi construída nesse ano, há cerca de nove décadas, numa zona rural de Vila do Conde, ainda funcionava apenas como uma moradia. Hoje em dia, é também o atelier de arquitetura do neto.
Durante uma década, e apesar da falta de aquecimento ou de isolamento, utilizou-a “praticamente” como estava e construiu ali a sua equipa. “Quando a minha avó partiu, esteve alguns anos vazia. Nunca esteve à venda, mas os meus tios queriam que alguém da família ficasse com ela”, recorda à NiT.
Foi na altura da pandemia da Covid-19, quando os colaboradores foram todos para casa, que decidiu que estava na altura de remodelar e ampliar o espaço. A vontade antiga foi acelerada pela necessidade de ter melhores condições de trabalho, já que, muitas vezes, “era difícil juntar toda a gente e ainda receber os clientes” do gabinete, fundado há 15 anos.
Este projeto valeu ao criativo português, de 44 anos, o primeiro lugar na sétima edição do Baku Architecture Awards 2025, na categoria de Interiores, anunciado a 3 de outubro. O prémio do concurso, organizado pelo Ministério da Cultura da República do Azerbaijão e a Ordem dos Arquitetos do Azerbaijão, foi distribuído pelos vencedores e o valor total é de cerca de 30 mil euros.
“Não trabalhamos pelos prémios, mas é sempre importante, quando recebemos algum destaque, em Portugal ou no exterior”, afirma, acrescentando o desejo de inspirar jovens arquitetos a ter e desenvolver novas ideias. “Ficamos contentes pelos projetos que fazemos serem reconhecidos.”
Raulino explica que “a estrutura principal da casa foi-se mantendo quase intacta ao longo dos anos”. As janelas eram as mesmas, a cobertura em telha permaneceu durante muitos anos e, ao passar por lá, ao longo do tempo, nunca se mostrou devoluta.
Porém, foram necessárias outras intervenções. Como o terreno é bastante rochoso, e há a diferença de cota de um piso, as condições só possibilitaram aumentar o piso superior para as traseiras, que se encontra a nível do jardim. Criou-se um logradouro onde permanecem algumas árvores do tempo da avó.
“Deixamos o logradouro permanecer como existia antigamente”, acrescenta o arquiteto, que desenhou ainda um átrio junto ao forno de pedra ali existente, “que une a casa antiga à construção nova”, e que permite o acesso às várias partes da casa que se abrem para o jardim.

A construção preservou ainda a estrutura de madeira do telhado, “que ficou à vista para possibilitar aumentar o pé direito dos espaços de trabalho”, bem como um antigo poço e os muros de granito, alguns deles refeitos. “Tudo o que foi possível deixar intacto, e que fazia parte da casa original, deixámos ficar.”
Na área da antiga cozinha, permaneceu o forno, as paredes em granito, o tabique à vista e a chaminé aberta de fogo de lenha onde a avó cozinhava. “Decidimos deixar porque faz parte da memória daquele lar, caracteriza a moradia e faz-me lembrar os tempos de infância em que a utilizei.”
Enquanto, na planta original, existiam três quatros e uma sala, Raulino tirou todas as paredes “leves em madeira” após a remodelação. “Deixámos o espaço todo amplo onde fica agora a sala de trabalho. A cozinha foi transformada numa área de estar com sala de espera.”
“No exterior, sentimos a necessidade de duas pequenas salas. Uma é de reuniões, a outra é uma pequena copa para relaxar”, continua. A sala principal, que funciona como segundo piso, conta com duas mesas “grandes” de trabalho sob o pavimento, em soalho de madeira, e janelas mais pequenas.
“Existe uma certa continuidade em tudo aquilo que desenhamos”, conclui Raulino, que considera que este atelier é o reflexo do trabalho que têm vindo a desenvolver ao longo dos últimos 15 anos. “O programa define o que vamos fazer, porque desenhamos muito por encomenda.”
Carregue na galeria para ver mais imagens da obra. As fotografias são de Raulino Silva e José Campos.

LET'S ROCK







