Decoração

Inovadora casa rotativa em Coimbra gira à procura da luz do sol (ou da sombra)

A habitação pode fazer uma rotação até 300 graus em seis minutos. Os irmãos Pedro e Filipe gastaram 120 mil euros na obra.
O proprietário é um engenheiro.

Quando um arquiteto e um engenheiro unem forças para criarem um projeto, sem rivalidades, o resultado só pode ser espetacular. E dois irmãos portugueses provam isso mesmo. Sempre que Pedro Bandeira projeta uma nova habitação, fala logo com Filipe para tratar da mecânica ou da motorização do edifício. Quanto mais exigente a ideia, melhor.

Assim que surgiu a oportunidade do engenheiro construir a sua casa, os papéis inverteram-se. Corria o ano de 2015 quando abordou o irmão arquiteto para concretizarem um dos desafios mais ambiciosos das carreiras de ambos até ao momento. Trata-se de uma casa que gira como um carrossel.

A ideia havia surgido meses antes, quando Pedro foi convidado para projetar uma moradia elevatória, na Figueira da Foz. “O cliente tinha perdido a vista para o mar porque construiram outro empreendimento à frente. Então, ele quis construí-la numa plataforma que subia”, conta à NiT.

O irmão, como era habitual, ficou responsável pelo lado mais funcional do sistema. Filipe estava no ponto mais alto do edifício, a apreciar a vista para o Mondego, quando surgiu uma questão que o acompanhou durante anos. E se a estrutura elevatória pudesse rodar?

Assim nasceu este projeto de habitação unifamiliar, construído na periferia da cidade de Coimbra,que gira em função do sol. Pode fazer uma rotação até 300 graus em cerca de seis minutos, movendo-se três vezes em cada sentido. O objetivo principal é aproveitar a energia solar de uma forma (ainda) pouco explorada.

À procura da luz

Até pode parecer complexo, mas basta premir um botão para que a magia aconteça. “Há uma quantidade de mecanismos deste género que conhecemos. As gruas de obras, por exemplo, são rotativas”, acrescenta. No fundo, funciona sob uma estrutura com um motor elétrico que faz com que a obra comece à procura da luz.

O movimento varia ainda consoante a estação do ano. No inverno, aproveita-se as janelas envidraçadas para aquecer a casa “através da energia passiva que recebe do sol”. Na estação quente, acontece o oposto. A casa tem um alçado mais fechado e sem superfície de vidro para onde a obra se vira, para não sobreaquecer.

A dada altura, durante a construção, Pedro estava com o irmão (autor da maior ponte pedonal suspensa do mundo, em Arouca) à espera do serralheiro e resolveram rodar a casa para verem a entrada. “O lado mais divertido é conseguir controlar o processo em vez de ser algo automático”, destaca, recordando o momento em que o fez pela primeira vez.

Inovadora casa rotativa em Coimbra gira à procura da luz do sol (ou da sombra)
A casa em rotação.

Em termos de pormenores, não foi tão simples. Além de um software que indica a data ou a hora que em que nasce o sol, tiveram que pensar num sistema em que tudo o que está dentro da habitação, como os esgotos e a eletricidade, também giram. “Colocámos o esgoto no centro da casa e o bloco de água e a eletricidade são tubos flexíveis. As infraestruturas andam à volta do eixo”, explica.

Apesar do orçamento limitado, conseguiram executar tudo com um investimento de 870 euros por metro quadrado. Uma vez que a área é de 138 metros quadrados, estima-se uma base total de 120 mil euros. Na parte da estrutura, optaram pelo mesmo sistema que é usado “para um banal armazém”, reduzindo os gastos ao máximo.

Era apenas um projeto pessoal, mas o reconhecimento não demorou a vir. Este “edifício-engenho” ou “casa-girassol”, como muitos chamam, triunfou na primeira edição do Prémio Sustentabilidade e Inovação, promovido pela Ordem dos Arquitetos e do Fundo Ambiental, em 2019. No mesmo ano, foi nomeado para o prémio europeu EU Mies Award.

Equivalente a um T3, a planta da casa (que pesa cerca de 33 quilos) conta com um quarto, um escritório, duas casas de banho e uma sala e cozinha abertas em open space. No entanto, a área de estar pode ser separada em duas divisões, criando-se um novo quarto.

Como precisavam de um sistema o mais leve possível, para a casa poder rodar, optaram por painéis-sanduíche. Deixaram os pilares ao nível do rés do chão visíveis, com uma forma que “faz lembrar as estrelícias das pontes”, ou seja, as hastes que se cruzam na estrutura destas infraestruturas. “Como a casa é para um engenheiro, quisemos usar elementos de engenharia para ficarem expressos na arquitetura.”

“A nível de cores, não tínhamos grandes alternativas. Estávamos a falar de grandes quantidades de tinta e as mais baratas são as mais básicas, como o branco e o preto”, recorda. Como não queriam um choque muito grande com a paisagem, escolheram o cinzento para que se possa camuflar com as árvores que a rodeiam.

Tudo isto podia ter sido feito em dois meses, mas a falta de mão de obra atrasou o processo. Feitas as contas, a casa demorou cerca de um ano a ficar concluída — mas continua a corresponder às expetativas do engenheiro.

Quando deixar de fazer sentido, também não há problema. Pedro e Filipe queriam que a casa pudesse ser facilmente desmontada, seja graças à estrutura metálica ou aos materiais. “Existe uma possibilidade, se precisarmos, de reciclar ou reutilizar os materiais” para outro projeto. Afinal, não há limites para os dois irmãos.

Carregue na galeria para ver mais imagens desta casa-girassol em Coimbra. As fotografias são de Paulo Catrica.

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