Decoração

Este arquiteto transformou o anexo de infância numa casa moderna para os pais

O lote foi construído pelos avós de Daniel Pires nos anos 90. Revisitou as memórias e dividiu-o em três volumes de betão.
Fica no Entroncamento.

Era onde fazia tudo menos dormir. Quando os pais de Daniel Pires iam trabalhar, o jovem passava a maioria do seu tempo no anexo do terreno. Ali reunia-se com os amigos, fazia todas as refeições e era um local onde podia passar o tempo livre. Só quando o dia acabava é que regressava à habitação principal.

Construída nos anos 90, a estrutura fazia parte de um terreno comprado pelos avós do arquiteto no Entroncamento. O objetivo do casal foi, desde cedo, aproveitar a área estreita e profunda para a construção de uma habitação familiar. Mas a verdade é que a vivência familiar acabou sempre por se desenvolver naquele espaço secundário.

Após o falecimento dos avós, os pais de Daniel decidiram que queriam tornar o anexo numa casa para viverem a tempo inteiro. Tornaram-se clientes do próprio filho que se viu desafiado a revisitar as memórias de infância. Foi esse o principal desafio: “Era tudo demasiado próximo”, começa por contar à NiT.

Assim nasceu a Casa Sobreira Pires, que aproveita a construção existente e o pátio da casa como ponto de partida. A casa com 165 metros quadrados é complementada ainda por uma horta biológica que se tornou um dos cartões de apresentação da estrutura com dois pisos. “O conhecimento que tinha podia ser uma limitação ou inibir a criatividade do projeto. Nesse sentido, foi fluindo em contacto com os meus pais e o processo tornou-se tranquilo”, acrescenta, reforçando que tentou respeitar a vivência do espaço. A estrutura precária manteve a alma, mas ganhou uma linguagem mais moderna.

“O mais imediato era fazer a zona privada junto à estrada, entrando-se gradualmente”, diz. Como não havia muito espaço de circulação, aproveitou as áreas como espaços completos e definiu-os através de três volumes de betão. O primeiro, em contacto com a rua, serve como um ponto de transição que liga o espaço público e privado.

Todas as divisões foram encerradas por caixilharia de madeira, que se torna mais aberta ou fechada consoante a necessidade de privacidade. Além do betão e da madeira que limita a fachada, aproveitou-se a pedra da cozinha e o xisto proveniente das áreas adjacentes da região. É uma das principais atividades económicas da cidade.

O interior liga-se ao exterior.

“Pareceu natural colocar a área de estar e a cozinha numa área mais luminosa e central, que recebe a luz dos quadrantes e através dos três volumes”, continua. Já a transição através de uma escada que recebe o terraço, e que compreende o pátio central, nasceu como um ponto intimista que promove esta ligação ao exterior.

“O que se manteve, acima de tudo, foi o modo de utilizar o espaço. Apesar de existir um novo volume, foi feita com transparência tal que dá para ver o terreno de uma parte à outra, através dos envidraçados que a circundam.”

A nível da decoração, Daniel quis trazer para o interior aquilo que se vê a partir de fora, começando pelos materiais da fachada. Sem grandes distrações, tentou que não existisse uma repartição “mas uma globalidade de intervenção” quanto às cores, matérias-primas e geometrias.

A obra demorou cerca de dois anos e foi concretizada “com um orçamento limitado” que exigiu várias soluções. Feitas as contas, os gastos rondaram entre os 70 e 80 mil euros.

“Existem intuições, experiências e pontos de partida diferentes, sendo que essas diferenças foram todas integradas no projeto”, nota sobre a ajuda dos pais no projeto. “Costumo dizer a brincar que não se pode deixar um arquiteto à solta e isso trouxe-nos muitos benefícios.”

Ainda assim, a identidade do arquiteto está refletida no resultado final. A organização da planta através dos volumes e a interpretação da envolvente — sem deturpar a traça original — são dois elementos cruciais no portefólio de Daniel, que trouxe essa mesma experiência para o projeto.

Há mais de quatro anos que os pais do profissional se mudaram para a casa e dão uma nova vivência aquele que já foi um refúgio familiar. Os hábitos até podem ter mudado, porém, as memórias do casal que edificou o antigo anexo continuam presentes em cada ponto da casa. É nisso, pelo menos, que os atuais proprietários acreditam.

Carregue na galeria para ver as imagens da Casa Sobreira Pires tiradas por Filipa Bernardo, fotógrafa e companheira do arquiteto.

 

 

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