Decoração

O edifício do século XIX nas Amoreiras que renasceu como uma casa moderna com piscina

A fachada cega foi refeita, mas manteve-se a memória da estrutura. Foi "devolvida à cidade" e ganhou jardim e piscina.
Fotografia: Francisco Nogueira

“Quem subia a rua das Amoreiras, notava que faltava ali alguma coisa”, explica o arquiteto Pedro Carrilho à NiT. Era um sentimento presente desde que nos anos 60 se construi logo ao lado a estrutura modernista do Ginásio Clube Português — uma obra que obrigou à demolição do edifício contíguo e que “abriu uma empena cega [uma fachada sem janelas ou portas] que criou uma cicatriz naquele espaço.”

Durante anos, a parede manteve-se despida de frente para a “praça desordenada” que recebeu o nome do ginásio. Várias pessoas notavam a necessidade de requalificação para criar “nova fachada de remate de quarteirão” e melhorar o retrato urbano.

A reabilitação profunda ao pequeno edifício do século XIX nas Amoreiras, no coração de Lisboa, deu origem a uma casa moderna com 430 metros quadrados. Atualmente é formada por três andares luminosos e cheios de arte, um pátio exterior com jardim e piscina e vista sobre Aqueduto das Águas Livres.

“As fachadas tardoz e principal foram mantidas. Como não era possível manter a fachada cega, refizemos e mantivemos alguns elementos característicos, como a balaustrada”, explica. “Mudou-se a estrutura e cada piso passou a apresentar-se à praça de forma diferenciada.”

Se antes o imóvel tinha quatro apartamentos, passou a ser uma única casa unifamiliar que tira partido da localização. O piso 0 fica exposto para a praça e para o romântico Jardim das Amoreiras e inclui as zonas de serviço, o estacionamento e um pequeno escritório.

Fotografia: Francisco Nogueira

“A casa acontece do primeiro piso para cima”, aponta Pedro. É nessa zona que surgem as áreas sociais, em open space, com ligação à parte de cima através da escadaria central. No último andar, surgem quatro suítes e uma varanda virada para trás, inspirada na arquitetura do ferro dos séculos século XIX e XX.

Foi também através do primeiro piso que se criou o pátio com o jardim e a zona da piscina. “Tirámos partido da relação entre o interior e exterior. A cota superior é muito vincada, então pusemos a zona social virada para trás propositadamente para criar essa relação.”

Apesar das mudanças, manteve-se o respeito à memória da construção. A moradia manteve elementos tradicionais da arquitetura portuguesa, como as molduras de pedra das janelas, o chão de madeira da entrada ou as grades de metal que vemos nas varandas, a contrastar com a fachada clara.

“Houve alguma discussão sobre a escolha cromática, mas acabou de ser pintada de branco por opção final do cliente”, revela. Inicialmente, surgia num tom de rosa que contribuía para a “diversidade visual” característica de Lisboa. “Não haver quarteirões pintados de forma uniforme faz parte da cidade.”

Porém, explica o arquiteto, a tonalidade relaciona-se bem com a Igreja de Nossa Senhora da Conceição e o próprio ginásio. “Cria-se uma uniformidade naquela praça que, até então, não havia.”

Fotografia: Francisco Nogueira

No interior, cujo design ficou a cargo da decoradora Laurence Beysecker, do atelier Maison Amarande, continuou a priorizar-se as cores neutras. Os tons de bege reforçam a iluminação natural tão abundante no espaço, que é aproveitada através das persianas elétricas em madeira.

Além das obras de arte, os apontamentos de cor surgem através de objetos como as cadeiras de veludo, em bordô, ou o mosaico hidráulico preto e branco, na zona da receção.

Do licenciamento à concretização, “tratou-se de um processo lento por ser um projeto de raiz”, confessa. A construção demorou cerca de dois anos.

Ainda assim, admite que o edifício “não trouxe grandes dores de cabeça”. “Antes pelo contrário, achámos importante para a cidade focarmo-nos neste problema. Teria sido mais fácil mantermos a empena cega, mas aquela cicatriz ia eternizar-se ali.”

Atualmente, as reações ao edifício surpreendem o arquiteto. Muita gente diz ter a perceção de que aquela fachada existe ali desde sempre e Pedro, já a antecipar o espanto, não perde tempo e mostra as fotografias antes da transformação.

“Foi atualizado, porque as cidades não são estanques e não ficam paradas no tempo”, conclui. “É isso que nos dá gozo. Gostamos de perceber que aquele edifício foi devolvido à cidade.”

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