Lojas e marcas

Beatriz criou os cadernos que se vendem nos grandes museus (e não só)

A fundadora da Mishmash juntou as poupanças para criar um produto “diferenciado”. A maioria da exportação é para os EUA.
A marca foi criada há 9 anos.

Nos anos 80, os dias de Beatriz Barros eram passados na papelaria do avô, em Matosinhos. Numa altura em que não havia compras online ou grandes centros comerciais, passava horas a admirar o pequeno ponto de venda, sempre movimentado, onde o patriarca embalava presentes e vendia cadernos de marcas conhecidas ou de linhas próprias.

Durante muito tempo, essa vivência “não pareceu ter grande impacto” nos seus interesses, revela a artista, de 32 anos, à NiT. Só começou a juntar as peças quando decidiu formar-se em design e percebeu que ainda tinha presente a imagem dos papéis coloridos que o avô organizava na loja.

Quando chegou o momento de concluir o mestrado design de comunicação, na ESAD – Escola Superior de Artes e Design, no Porto, não teve dúvidas entre um trabalho escrito e um projeto onde “pudesse meter as mãos” na massa, explica. “A ideia sempre foi criar algo que visse a luz do dia.”

A pensar na diversidade nos materiais de escritório, Beatriz começou a imaginar os primeiros artigos da Mishmash — nome inspirado no calão em inglês para “miscelânea” —, a marca de estacionário que criou há cerca de 9 anos e que, desde então, tem conquistado o mundo com os seus cadernos.

A diferenciação foi o principal objetivo. “Em vez daqueles notebooks pirosos e com frases, queria uma alternativa que fosse um espelho da nossa criatividade no dia a dia”, acrescenta. “Via uma falha clara no mercado entre o modo como se olhava para um livro e para um caderno.”

Uma das paixões da jovem, enquanto artista, era o design editorial. “Via aqueles livros que ganhavam prémios de design, com acabamentos muito ricos, e não percebia essa lacuna no material de escritório. Gastamos notas nas melhores livrarias do mundo, mas não num produto que anda connosco todos os dias e que nos faz ter as melhores ideias?”

Beatriz teve a ideia durante o mestrado.

A Mishmash aposta em capas de pele, produzidas com desperdícios industriais de fornecedores italianos, ingleses e alemães. No caso do papel, quando não é 100 por cento reciclado, para evitar que as canetas com mais tinta borratem a fibra, tentam aumentar a percentagem para 80 por cento.

Os fornecedores, explica Beatriz, “são levados ao limite” graças à relação de proximidade que existe. “Pedimos coisas novas e tentamos virar o barco para que se adaptem sempre ao que procuramos, com muitos pormenores, e nos façam diferenciar no mercado.”

Uma das novidades para esta estação é a linha Custom, um serviço onde os clientes podem desenhar um produto de raiz, até então disponível apenas para empresas. Outra das opções é a linha Personalization, que conta com cinco artigos fixos, que podem ser personalizados consoante a necessidade.

Porém, os bestsellers continuam a ser os produtos log, compostos por um caderno e o refill. Trata-se de um produto recarregável que “dura para sempre” e que “vive da necessidade das pessoas”, já que podem ser carregados com novas folhas, consoante a necessidade.

Além disso, já chegaram os primeiros planners para 2025. “As agendas têm esgotado sempre. Este ano ainda temos algumas, mas é uma questão de tempo.”

Da falta de investimento aos museus

Se atualmente é um sucesso além-fronteiras, Beatriz teve que lançar a empresa apenas com as poupanças pessoais e um apoio do amigo, que acabou por deixar o projeto. Quando se candidataram a uma campanha de crowdfunding com um pedido de dez mil euros, ficaram-se pelos nove mil e voltaram à estaca zero.

“Bati muitas vezes com a cabeça na parede devido à falta de capital. As ideias eram superiores aos recursos que tínhamos”, continua. “É fácil sentirmo-nos limitados porque não estamos em certas feiras ou porque não podemos investir logo em produtos diferentes.”

O segredo foi ser paciente e, durante muitos anos, operar como uma marca pequena. Há dois anos, entraram para o quadro os líderes suíços da Pagani Pens, conhecidos pelas canetas promocionais, que receberam uma mensagem de Beatriz, no LinkedIn, e tornaram-se os parceiros certos para a Mishmash atingir uma bolha maior.

Entre muitas mensagens e videochamadas, começaram por chegar à Europa. “Decidimos que ia ser global desde o primeiro dia. Foi um caminho percorrido passo a passo, e o sucesso foi graças à nossa abordagem diferente. Não era chegar, dizer ‘olá’ e espetar o catálogo. Era sempre pessoal e personalizado.”

Assim, e graças “à mentalidade de negócio mais aberta e liberal” do mercado norte-americano, concentraram a venda dos seus cadernos nos EUA, para onde exportam 60 por cento dos cadernos.

Quer inovar no mundo do estacionário.

Pelo caminho, e com a mesma abordagem, Beatriz conseguiu a exposição de artigos de marca própria em algumas lojas internacionais, assim como em museus. O Guggenheim e o Whitney, em Nova Iorque, ou o Design Museum, em Londres, são alguns dos espaços onde está presente.

“Temos trabalhado com várias galerias e dá gosto, porque estão interessados em ouvir o nosso input”, confessa. “Temos linhas feitas à medida para eles. Sempre que podem, dizem orgulhosos: ‘é feito em Portugal, mas é nosso’”.

Além do mercado norte-americano, a Mishmash tem uma presença forte no Médio Oriente, no Reino Unido e um pouco por toda a Europa, mas sobretudo no norte. Alemanha, Reino Unido, Holanda, Bélgica e Itália são alguns dos países que ocupam o topo da lista de encomendas online.

Com um objetivo anual de 350 mil euros, Beatriz aponta uma previsão, nos próximos 5 anos, de 1 milhão de euros em vendas. “Penso que será exequível”, aponta. “A marca está a crescer imenso e vamos concretizar tudo o que ainda falta para chegarmos a estas metas.”

Com uma aposta crescente no online, os próximos meses vão ser marcados pelo lançamento de novos produtos. “Não necessariamente os que temos, mas vamos alargar para outras categorias”, conclui. Sempre com o papel como foco principal. “E vamos aumentar o número de retalhistas de marca própria.”

Os artigos da Mishmash estão disponíveis no site da marca. Os preços variam entre os 6€ e os 28€.

Carregue na galeria para ver alguns dos cadernos criados por Beatriz Barros.

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