Lojas e marcas

Começou com um cromo de João Pinto. Hoje, Tiago tem uma loja no Porto com mais de 40 mil

O espaço, com apenas 15 metros quadrados, vende para todo o mundo. Este verão, o fundador vai organizar "uma espécie de Iberanime" de cartas para colecionadores.
A loja tem 15 metros quadrados

Depois do Campeonato Europeu de Futebol, no ano 2000, João Pinto recebeu propostas de vários clubes internacionais. No entanto, o que importava para Tiago Pacheco, então com 10 anos, era colecionar cromos com a cara do jogador português. João Pinto tinha nascido no bairro do Falcão, no Porto, onde Tiago vivia — o motivo da fixação era óbvio. O passatempo acabou por transformar-se numa ocupação a tempo inteiro, com a Loja de Cromos, que hoje vende exemplares para todo o mundo.

No entanto, houve um hiato na ligação de Tiago, hoje com 35 anos, a este mundo. Ao crescer, os cromos foram ficando para segundo plano, entre outras distrações. Até que chegou o Mundial de Futebol de 2014: “Comecei a fazer a coleção da minha esposa, naquela de recordar velhos tempos”, contou à NiT. Foi aí, quando já estava perto de terminar a caderneta, que começou a sentir falta de “uma proximidade que via em miúdo”.

A Praça D. João I, no Porto, sempre foi um dos sítios de culto para os devotos deste tipo de colecionismo — aos domingos de manhã, as escadas são o ponto de encontro para trocar de cromos. Mas só isso não chegava a Tiago.

Foi a “duas ou três” feiras de antiguidades com o sogro, também colecionador, vender miniaturas de carros, antes de perceber que havia espaço nesse mercado para o segmento dos cromos. Assim que deu lhe deu o “clique” passou a visitar várias feiras “mais longe do Porto”, onde não havia uma comunidade de colecionadores tão grande. “Lourosa, Espinho, Santa Maria da Feira” eram tudo pontos obrigatórios durante os fins de semana, atividade paralela ao trabalho enquanto administrativo de faturação no Hospital dos Lusíadas, na Boavista.

Uns clientes trouxeram outros e Tiago deu por si a vender cromos por encomenda. Em 2015, decidiu criar uma página no Facebook, que “já se chamava Loja dos Cromos”, onde vendia alguns. Hoje, conta com 10 mil seguidores.

Porém, a carga de trabalho começou a pesar e a ideia de abrir uma loja foi ganhando força. Na altura da pandemia da Covid-19, o hospital onde trabalhava decidiu despedir alguns colaboradores e Tiago Pacheco estava incluído na lista. Com uma filha bebé para cuidar, pensou: “Eu já faço feiras, já tenho os meus clientes, vou abrir uma loja física”. Dito e feito.

Em 2020, arrendou um espaço com 15 metros quadrados em Campanhã, no Porto. No início, a Loja dos Cromos funcionava como armazém: organizava todo o stock, preparava encomendas, ia aos correios e enviava para os clientes.

Tiago Pacheco tem 35 anos

Em junho de 2022, Tiago teve um AVC e o lado esquerdo do corpo ficou totalmente paralisado. Depois de 11 dias em coma, os médicos do Hospital de Santo António “esperavam danos irreversíveis”. “Mas quando acordei lembrava-me de números de telemóvel, datas de nascimento, tudo”, conta. Aos poucos, no Centro de Reabilitação do Norte, foi recuperando os movimentos e só os problemas de equilíbrio ficaram para contar a história.

Tiago Pacheco garante: “Os cromos salvaram a minha vida”. Durante o tempo de recuperação, a mulher levava-lhe cromos para organizar, era uma espécie de fisioterapia que a própria profissional que o acompanhou recomendava. E mesmo com toda essa ligação emocional aos pequenos autocolantes, Tiago deixou de colecionar. A explicação é simples: “Não se pode juntar o amor ao trabalho”.

Os clientes

“O colecionador é uma pessoa muito meticulosa, é uma pessoa que gosta de ter tudo”, começa por dizer. “Se a minha profissão é ter a loja e quero guardar tudo para mim, não consigo vender”. A loja está em primeiro lugar e, por isso, só havia uma solução: acabou-se o colecionismo, ficou a paixão por organizar os cromos. No momento da conversa com a NiT, Tiago tinha, à sua frente, 40 mil cromos, mas o número vai variando.

Os clientes podem pedir um colecionável específico através do WhatsApp. A loja funciona como expositor de coleções mais recentes “para ter mais retorno”, mas o online continua a ser a maior fonte de receita, juntamente com as idas a feiras que mantém no horário semanal.

A verdade é que Tiago Pacheco quase só tem tempo para dormir. O pai ajuda-o a dar vazão a tantas encomendas e na organização. “Passo o dia sempre ali [no telemóvel], recebo, respondo, recebo, respondo”, tudo para encontrar o que cada cliente pede.

Quanto às cadernetas de futebol, vende muito para miúdos (ou, de forma mais rigorosa, aos pais que querem que os filhos tenham a caderneta completa). Pelo menos 50 ou 60 completas sabe que tem de ter disponíveis. Já cliente mais velho da Loja dos Cromos tem 86 anos, vive no Algarve e coleciona cromos de futebol, animais e banda desenhada.

Há cromos para todos os gostos

E Tiago garante que há gostos e especificidades para tudo. “Há um cliente que me pede uma [caderneta] para ele e duas para os netos; é colecionador, não tem paciência para colar e acha que os netos não colam em condições”, conta. Esse trabalho meticuloso é feito por Tiago: descolar o cromo, endireitá-lo, colá-lo centrado e sem vincos. E repetir com todos os exemplares para três cadernetas, só depois embalar e enviar.

Tiago fala dos clientes como quem fala de amigos. Várias pessoas entram na loja só para conhecer o dono do sítio de onde encomendam cromos — e vêm de todas as partes do País. 

Agora, 10 anos depois de ter começado a página do Facebook que deu origem a tudo, Tiago está a organizar, em conjunto com outras entidades, o primeiro Card Show em Portugal. É “uma espécie de Iberanime mas com cromos e outras cartas colecionáveis”, que vai acontecer no dia 2 de agosto no Estádio do Bessa, no Porto.

Para miúdos até aos 12 anos e sócios do Boavista, a entrada é gratuita. Os colecionadores e os curiosos que não se incluírem nestas categorias pagam um valor simbólico — um euro, que irá reverter para financiamento do Museu do Boavista FC.

FICHA TÉCNICA

  • MORADA
    Rua do Freixo 1709
    4300-223 Porto
  • HORÁRIO
  • De terça-feira a sexta-feira das 8h às 12h e das 13h às 17h
  • Sábado das 9h às 13h

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