A Chiclete Shop surgiu há dez anos, numa altura em que o comércio local do Porto começava a recuperar da crise económica. Atualmente, a cidade e o país enfrentam uma nova dificuldade: a crise imobiliária. Nos últimos meses, vários estabelecimentos tradicionais têm sido forçados a encerrar devido aos elevados custos das rendas, à venda compulsiva dos imóveis ou à preferência por grandes marcas comerciais, consideradas mais “seguras”. Foi precisamente esta situação que levou João Ribeiro e Raquel Tavares a abandonar o seu primeiro espaço físico na Rua da Firmeza.
“Percebemos que o senhorio considerava mais rentável arrendar o espaço a estrangeiros. Veio ter connosco e disse que já tinha outro projeto para o local e que tínhamos de sair. Até agora continua fechado. Mas, como o nosso décimo aniversário se aproximava e já há algum tempo pensávamos que a marca precisava de um refresh, percebemos que, se não saíssemos naquele momento, nunca mais o faríamos. Decidimos arriscar novamente”, conta o casal, ambos com 45 anos, em entrevista à NiT.
Raquel é formada em Serviço Social e o João esteve sempre ligado ao ramo comercial, desde uma loja de vestuário a uma livraria ou até uma loja de motas — os géneros ecléticos e até antagónicos deram-lhe anos e anos de experiência — não importava o que vendia, o importante para ele era ter contacto direto com as pessoas. Em 2004 decidiram abrir uma loja de vestuário masculino já ligado ao nicho de streetwear. “Não era uma loja vintage ou de peças em segunda mão mas sempre tivemos esta abordagem muito ligada ao streetwear porque é um estilo com que ambos nos identificamos. Mas foi difícil porque não estávamos num centro urbano — a loja era em Santa Maria da Feira, de onde são naturais —, e também era um nicho muito focado. Naquela altura o streetwear não tinha a popularidade que tem agora entre os portugueses”, acrescentam.
Conseguiram manter a loja aberta até 2010, momento em que a crise económica abalou o País e obrigou-os a fechar portas. Raquel virou-se para a sua área de formação, enquanto João regressou a trabalhar enquanto comercial e vendedor. Os anos foram passando e o “bichinho” de voltar a ter um espaço físico não abandonava o casal. Em 2014, participaram várias vezes no famoso mercado urbano de venda de roupa em segunda mão no Porto, o Flea Market. “Tinhamos muito stock de quando encerramos a loja, bem como peças nossas e dos nossos filhos que já não utilizávamos e íamos participando algumas vezes nesta feira para manter viva a nossa vontade de ter uma relação com o público e de dar vida ao streetwear”, admitem.
O problema estava em que para o casal participar numa feira não era suficiente. Decididos a abrir uma nova loja, sabiam que não poderia ser na sua terra natal e mesmo tendo de deslocar-se diariamente, começaram a procurar um espaço no Porto. Foi a 3 de maio de 2015 que abriram portas a Chiclete Shop no número 304 da Rua da Firmeza. Os primeiros dois anos foram desafiantes — o turismo não tinha o impacto que hoje tem na cidade, apesar de também ter sido nesse ano que os voos low cost começaram a aterrar no Porto —. Por outro lado, estava sempre esta premissa de que o conceito da marca assentava muito num nicho muito específico e dentro do mesmo, apostavam sempre em propostas mais alternativas, fugindo sempre da aposta segura.
“Começamos a viajar para conhecer fornecedores de peças tanto em segunda mão como novas. Da Itália à Espanha, passando ainda por Franca, Alemanha e Inglaterra. Muitos vendedores aconselhavam-nos peças que estavam a resultar muito bem no mercado mas nós não queríamos ser mais um, queríamos fazer diferente. Por isso sempre investimos em peças pouco valorizadas nas próprias coleções ou entre os fornecedores e antecipamos muitas tendências. Por exemplo, as Vans Slip On em xadrez, fomos das primeiras lojas no Porto a comprá-las e na altura as pessoas estranhavam. Passados dois anos já eram uma tendência”, explicam.
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Era esta liberdade de poderem apostar em diversos estilos e nas propostas mais ousadas dentro do streetwear que o casal foi conquistando público um pouco por toda a cidade. Uma vez por mes, pelo menos, na sexta-feira fechavam a loja à noite e rumavam a Lisboa para participar em mercados urbanos na capital e dar a conhecer a marca. Continuaram também a marcar presença em vários mercados de segunda mão no Porto — já não tanto para dar visibilidade ao projeto, mas para fidelizar clientes.
Nos últimos anos, a tendência de streetwear em Portugal tem vindo a conquistar cada vez mais adeptos, sobretudo entre o público mais jovem. Por outro lado, a vertente do vintage tem impulsionado ainda mais este estilo, sobretudo pela conscientização sobre a sustentabilidade e um consumo mais consciente. A estética vintage, com a sua referência à cultura pop e à moda de épocas passadas, encontra um terreno fértil no streetwear que valoriza acima de tudo a autenticidade e a expressão cultural, algo em que a Chiclete Shop sempre acreditou.
“Fomos uma das primeiras lojas vintage no Porto, e desde então crescemos de forma gradual, sempre com o propósito de oferecer streetwear de qualidade, num espaço que respira referências culturais. Mas acima de tudo, sempre procuramos ser mais do que uma loja — um ponto de encontro onde se criam laços, se trocam ideias e nascem novas amizades a cada ano”, defende o casal.
A 3 de maio, a marca celebrava o seu décimo aniversário e foi a deixa perfeita para abrir portas de um novo espaço. “Saímos da Rua da Firmeza em fevereiro. Seguiu-se um mês muito duro à procura do espaço ideal para darmos novamente vida ao nosso projeto e depois mais um mês de obras para conseguirmos abrir na maior brevidade possível. A pressão imobiliária levou-nos a perder o espaço que durante tanto tempo chamámos de casa. Foi um golpe duro, mas também uma oportunidade. Dias intensos de mudanças e de reflexão sobre tudo o que conquistámos até aqui. Investimos numa nova morada ainda mais central, aproveitámos esta viragem para renovar a imagem da marca e preparar uma nova fase com ainda mais atitude e identidade”, contam os responsáveis, acrescentando:
“Desde sempre idealizamos o nosso espaço para que fosse feito para os portuenses e os locais e era uma preocupação que se manteve para a abertura desta nova loja. Os turistas sempre vão existir, mas o nosso trabalho nunca vai chamar a um turista para vir de propósito da Suíça a visitar-nos. Nós queremos aos jovens, aos estudantes, aos artistas, aqueles que perseguem e defendem a sua liberdade criativa”, concluem.
A nova loja da Chiclete Shop insere-se junto a Praça dos Poveiros e a primeira vista nem vai acreditar que é uma loja vintage e de peças em segunda mão — apesar de também ter um que outra peça nova de etiqueta —. A estética da loja é cuidada e muito bem organizada, quebrando o estigma de que lojas do género estão sempre desarrumadas e com roupa aos montes. Mal entra pela porta apercebe-se que está a entrar na autenticidade do universo streetwear. As paredes brancas do espaço ganham vida graças a diversas molduras relacionadas com a cultura pop, o hip hop e o streetwear. Já as caixas de diversas marcas de calçado decoram o teto e quase que criam uma linha que o direciona até as peças de roupa penduradas dos dois lados da loja — que se bem estão à venda, também formam parte da decoração da loja, criando quase um museu, uma ode à cultura do streetwear vintage.
Por lá encontra uma diversidade de peça, desde t-shirts, camisas, casacos, hoodies, calças e calções. Há de todas as cores, padrões e tamanhos — o desafio é escolher —. Encontra marcas como a Levi’s, Vans, Adidas, Carhatt, Maharishi, entre outras. Já os preços vão dos 10€ até aos 60€.
Carregue na galeria para ver mais imagens da loja e algumas das peças que pode encontrar por lá.