Provavelmente era o segredo mais bem guardado desta edição dos Casamentos de Santo António. Ninguém poderia adivinhar que iria entrar pelas portas da Sé de Lisboa uma noiva de calças. Para contrariar todos os preconceitos da sociedade, Elsa Chagas criou um modelo de vestido inédito e muito diferente de tudo o que já se viu.
Por obra do acaso, a noiva do casal número cinco que casou este domingo, 12 de junho, foi a escolhida para ir ao atelier da estilista Elsa Chagas. A empatia entre as duas deu-se de forma muito espontânea e do nada já estavam a fazer o casamento de ideias perfeito. Sobretudo no que diz respeito a um dos detalhes com maior dimensão num evento matrimonial: o vestido da noiva.
A ideia já estava a ser desenhada na cabeça de Elsa há algum tempo. No entanto foi apenas nesta edição dos Casamentos de Santo António, que corresponde à segunda em que participa, que a designer de vestidos de noiva encontrou a mulher perfeita para dar alma a uma das suas criações mais memoráveis: a alfacinha Catarina Castelo-Branco, de 38 anos.
“A Elsa conheceu um pouco da minha história e viu logo que a ideia dela se adequava perfeitamente à mulher que sou. Tive sorte não apenas porque vou casar pelos Casamentos de Santo António como também porque casei a minha ideia com a Elsa. E isso, para mim, foi uma surpresa muito boa, já que o vestido vai ao encontro de tudo aquilo que eu sou enquanto mulher”, afirma Catarina em entrevista à NiT.
Quando entrou pela primeira vez no espaço onde todos os vestidos de noiva de Elsa são criados, Catarina Castelo-Branco, apesar de não ter nada idealizado, só tinha uma certeza. Não queria ir em modo princesa nem ser uma noiva vulgar. Perante este desejo, a estilista descobriu o design que encaixava na perfeição na silhueta desta noiva.
Além de o modelo incluir umas calças, o vestido é todo bordado e leva uma renda que tem espigas. A escolha deste detalhe relaciona-se com o facto de, para Elsa, as espigas significarem o pão. E pão, como o descreveu à NiT, “é família”. E é precisamente isso que Catarina representa para Elsa.
Este é também um vestido em tons de pérola, glamoroso, tanto pelo corte do peito como pelo restante design. Faz lembrar os modelos dos anos 50. A diferença está, contudo, na parte de baixo que vem romper com todas as tradições e dá a este conjunto uma dinâmica inteiramente moderna, atual e adequada à mulher dos dias de hoje. “Uma mulher que é profissional, é inteira”, aponta Elsa Chagas.
Para ambas, esta criação mostra exatamente o que podia ser hoje um vestido de noiva de princesa da atualidade. “Imagino uma princesa moderna assim, com uma calça, com uma cauda”, diz Elsa, sendo interrompida por Catarina que completa que o conjunto é perfeito para quem “não tem medo de ser princesa, mas também não tem receio de vestir as calças”.
Outra questão importante diz respeito ao facto de este vestido, assim como os restantes de Elsa Chagas, ter muito do seu sentimento espelhado nele. “Tudo é feito com as mãos, como é óbvio, mas é sobretudo de coração. De alma, sai cá de dentro. Tem a minha linha, o meu traço, toda a gente facilmente o associa a mim”, confidencia a estilista.
Em resumo, este vestido transmite à sociedade portuguesa uma mensagem de liberdade de escolha, de opção. O modelo pretende mostrar que as mulheres podem vestir o que quiserem, na altura que entenderem, sem que a sociedade dite que há de ser de outra forma.
No que toca às horas em torno do vestido da noiva Catarina, Elsa partilhou uma história caricata. “O que vou dizer parece muito a história da Cinderela, mas é verdade. Eu faço o bibbidi-bobbidi-boo e começa a aparecer. E quando ele assentou a primeira vez no corpo da Catarina, o modelo ganhou alma”, afirma.
“É a primeira vez que nos Casamentos de Santo António vai entrar uma noiva de calças na Sé de Lisboa. E é a Catarina que vai abrir esse caminho”, remata Elsa Chagas.
A história de amor entre Catarina Castelo-Branco e João Ferreira
Já se tinham candidatado aos Casamentos de Santo António em 2020, mas por causa da pandemia o evento matrimonial teve de ser adiado para este ano. Catarina e João, ambos de 38 anos, decidiram dar o nó 13 anos depois de começarem a namorar. A partir deste domingo, podem dizer oficialmente que são marido e mulher.
“É uma tradição que faz parte da cidade de Lisboa e nós queremos fazer parte da história de Lisboa. É uma cerimónia muito bonita. Temos a oportunidade de casar na Sé, é um dia completamente diferente. É uma exposição muito grande, sem dúvida, é o reverso da moeda, mas no geral acho que é bom, porque acabamos por estar a concretizar um sonho, que é casar e passamos também a fazer parte da história de Lisboa”, explicou.
Catarina e João vivem com os cinco filhos na freguesia de São Vicente, em Lisboa, e desde sempre que se recordam da loucura que são as Festas de Lisboa. Aliás, as festividades dos Santos Populares acontecem não ao lado, mas mesmo à sua porta. Além disso, sempre fizeram questão de ir ver os noivos sair da igreja nos Casamentos de Santo António. Vários anos depois, foram eles que saíram da Sé rumo a uma vida igualmente a dois.