A guerra tinha acabado. A Europa tentava recuperar a esperança no futuro e alguma da alegria perdida. A escassez global de têxteis era evidente e um homem tentava navegar esta espécie de caos, à frente de um negócio do qual pouco sabia.
Louis Réard era engenheiro mecânico de profissão. Um trabalho que deixou para gerir o negócio de lingerie da mãe, precisamente no centro vermelho e fervilhante de Paris, ao lado do célebre cabaré Folies Bergère. Certo dia teve uma ideia brilhante.
O olho atento ao pormenor fê-lo reparar que na praia as mulheres subiam cuidadosamente o fato de banho para ampliarem a área bronzeada. Porque não reduzir de vez o tamanho dos biquínis? A tarefa não seria fácil: quem é que se atrevia a desafiar as leis da modéstia e os olhares mais conservadores? Essa resposta tem nome de mulher.
Micheline Bernardini foi a única mulher que aceitou posar para as câmaras com a criação de Réard Estávamos em 1946 e a pitoresca piscina Molitor foi o palco da sessão fotográfica, onde a modelo segurava uma pequena caixa: o novo fato de banho de duas peças era tão pequeno que cabia ali, naquele pequeno invólucro. O mundo preparava-se para a mudança.
Duas mentes, duas peças, um biquíni
No início do século XX, um fato de banho de duas peças com tanta pele à mostra seria algo impensável. Dar um mergulho no mar era, para as mulheres, um verdadeiro tormento. Inventaram-se até pequenas cabines de madeira onde se despiam e que eram levadas até à beira-mar, de onde saíam para um banho rápido — e para onde voltavam de imediato, fugindo a olhares indiscretos.
As décadas seguintes abriram as mentes e surgiram os primeiros fatos de banho de duas peças. Ainda assim, uma fronteira nunca foi ultrapassada, pelo menos até à revolução de Réard: o umbigo. As leis de modéstia de Hollywood traçavam a linha vermelha no umbigo, o ponto a partir do qual se produziam verdadeiros escândalos.
Antes de Réard, outro francês havia criado um protótipo que era comercializado desde 1932, sem grande sucesso. Jacques Heim criou o átomo, a mais pequena partícula conhecida pelo homem. Havia um pequeno problema. É que Réard ousou ir mais longe e criar uma peça mais ousada.
Não foi tão original no nome. Em vez de átomo, batizou a criação de biquíni, inspirado nos testes nucleares norte-americanos no atol de Bikini. E tal como a bomba, a peça agitou o mundo.
A Bernardini sucederam-se muitas outras mulheres, o que levou a uma reação peremptória da sociedade. Itália proibiu o seu uso nas praias. Bélgica seguiu o mesmo caminho. O Vaticano apelidou-o de pecaminoso.
Do outro lado da barricada estavam os fãs masculinos, que terão mesmo enviado milhares de cartas de agradecimento ao francês. Mais contidas e mais ousadas, as celebridades fizeram avançar a revolução. A estrela foi Brigitte Bardot, que levou a imagem do biquíni a todo o mundo.
Réard morreu em 1984, aos 87 anos. O francês deixou um legado que poucos conseguirão igualar e uma máxima que ainda hoje é levada muito a sério: “um biquíni não é um biquíni se não conseguir passar por entre uma aliança”.