Uma viagem na Amazónia quase custou a vida a Élio Nogueira. O fotógrafo de 31 anos fez o percurso atribulado até à floresta tropical de autocarro, antes de começar trabalhar nas produções de moda que o haviam levado ao Brasil. O veículo seguia por uma estrada rodeada de rochedos, quando se deu um desabamento de terra e várias pedras começaram a cair no caminho.
“Em vez de parar, o motorista decidiu acelerar. Passámos mesmo rés-vés a um pedregulho gigante”, conta à NiT. Felizmente, não houve feridos e o trabalho acabou por chegar a bom porto — mesmo com insetos exóticos a picar as modelos Apesar do perigo que correu, Élio não tem dúvidas: “É dessas aventuras que mais gosto.”
O fotógrafo já viajou por todo o mundo e trabalhou em mais de 60 editoriais e capas para publicações como a “Vogue”, “Harper’s Bazaar”, “Elle” ou “Marie Claire”, entre muitas outras. Em Nova Iorque, Londres ou Paris, trabalhou ao lado de inúmeras modelos e celebridades.
Nascido e criado no Porto, Élio tinha 19 anos quando se iniciou como autodidata. Durante uma depressão, numa fase em que se sentia sem rumo, decidiu pegar numa câmara e tirar alguns autoretratos em casa, onde explorava a sua imaginação com roupas excêntricas e maquilhagem criativa.
“A minha primeira vocação era a representação e a música, mas nunca tive apoio para explorar esse lado”, recorda. Acabou por fazer um curso profissional de audiovisuais que o fez desenvolver o gosto pela fotomontagem e pela edição de vídeos.

Aos poucos, começou a receber pedidos de amigos para fazer sessões, que partilhava online. O hobby desenvolveu-se ao ponto de, em 2014, começar a receber respostas positivas das agências de modelos que ia contactando. As empresas facultavam o espaço e os modelos para o artista começar a criar um portefólio — e, por sua vez, a descobrir a sua identidade.
Desde cedo, Élio percebeu que o seu trabalho consistia em contar histórias visuais. Todas as imagens tinham que ter uma ligação entre si, o que fez com que tivesse um dossiê atrativo para mostrar. Tinha poucos meses de experiência quando começou a contactar revistas internacionais e a enviar as suas experiências.
O primeiro trabalho surgiu em 2015, quando foi convidado para fazer parte da “Harper’s Bazaar” de Hong Kong. “Passei cerca de 1 ano a conversar quase todos os dias com o diretor. Queria mudar a minha vida, porque sentia a necessidade de ajudar a minha mãe e a minha avó.”
Nestes primeiros projetos, distinguia-se pelo trabalho mais arrojado, entre o sombrio e o fantasioso. Inspirava-se nos maiores nomes da indústria, como Steven Meisel ou Tim Walker. Quando começou a formação para se especializar em fotografia, sentia que já sabia muitas das coisas que os professores ensinavam — graças às suas pesquisas anteriores.
Entre Nova Iorque e Paris
A partir da primeira experiência, começaram a somar-se várias publicações à lista e não demorou até assinar a primeira capa, em 2016, para a “Elle” da Rússia. Na imagem, captou Bárbara Fialho para um editorial que ocupava várias páginas da revista. “Foi [um crescimento] muito rápido. Nunca esperei que fosse assim.”
Nessa altura, através do passa-palavra, conheceu uma produtora de Nova Iorque que o fez dar o salto do Porto até ao estado norte-americano. “Andava sempre a viajar, tinha cerca de dois ou três voos por mês”, recorda. “Quando fotografei as modelos da Victoria’s Secret, começaram a dar-me mais valor.”

Ao todo, já trabalhou para mais de 36 revistas internacionais. Do México ao Dubai, Brasil, China ou Perú, Élio já fotografou em dezenas de países. “Adorei trabalhar com a Alessandra Ambrosio, em 2018, porque foi a minha primeira supermodelo e demo-nos logo bastante bem.”
Em 2019, mudou-se definitivamente para os Estados Unidos, mas a experiência não correu consoante as expetativas que tinha. Ainda passou uma temporada na Flórida e em Barcelona, até decidir regressar de vez a Lisboa, em agosto do ano passado.
Apesar de ter assentado em Portugal, Élio continua a viajar sempre que tem produções que o exigem. “[As sessões] nem sempre correm como pensamos, porque há muitos fatores. Tudo depende do tempo, das roupas e das modelos,” diz.
“Acabámos a fugir dos guardas”
Uma das histórias mais caricatas aconteceu em Machu Pichu, no Peru, após dois dias num avião até Cusco. Seguiram-se bastantes horas até chegarem a uma localização remota na montanha. Cansado, o fotógrafo deu por si a olhar para folhas de mate de coca, naturais na região.
“Estávamos todos a mastigar aquilo para combater a altitude e ficámos a rir imenso”, conta. “Quando chegámos, os guardas disseram que não podíamos fotografar, então tentámos fazê-lo às escondidas. Lembro-me de ter acabado a fugir de guardas vestidos como incas enquanto continuava a captar imagens.”
Embora o seu portefólio inclua trabalhos comerciais, Élio identifica-se mais com os editoriais das revistas de moda. “Gosto quando têm temas fortes, porque me dão muita liberdade criativa. Posso criar histórias e foi isso que ajudou a expor o meu lado como mais criativo.”

Entre tantos trabalhos, destaca-se um: a primeira capa que fez para a “Vogue” portuguesa, em novembro de 2021 — sobretudo por ser o seu País. “Fui desafiado a abordar temas que não precisam de qualquer comentário para serem entendidos, então criei um shoot sobre a poluição dos oceanos. A modelo estava deitada numa água muito escuro, na Flórida, e coloquei lixo à volta dela durante a pós-produção.”
Agora, sente que falta acrescentar publicações como a versão italiana ou francesa da mesma revista ao currículo — e levar para essas páginas mensagens que vão além de tendências. “Gostava de poder mudar um bocado mentalidade da indústria, porque as pessoas ficaram muito iguais nos últimos anos. Quero chegar às maiores com as minhas histórias.”
E, apesar da internacionalização, o lado patriota também continua presente. Élio gostava de levar um pouco de Portugal para as revistas internacionais e, por sua vez, trazer um pouco do que se faz lá fora. “Aqui não se arrisca muito e, à mínima coisa, já sentem que é demasiado. Sinto que ainda falta ambição para mostrar o que temos de bom por cá.”
Pode acompanhar o trabalho de Élio Nogueira através da sua página de Instagram.
Carregue na galeria para ver o trabalho do fotógrafo para a edição de novembro de 2023 da “Vogue” Portugal, “The Arts Issue”.