Quando era apenas uma bebé, os pais de Xueli Abbing deixaram-na no chão à porta de um orfanato na China, um país onde o albinismo é considerado por muitos uma maldição. Hoje, está em destaque na “BBC News” por ter conseguido tornar-se uma modelo de sucesso apesar das adversidades.
Num artigo publicado esta sexta-feira, 30 de abril, pela estação britânica, a sua história serve de inspiração para tantos que sofreram de preconceitos ao longo da vida por serem diferentes. Ao mesmo tempo, é também um sinal de esperança que mostra como a indústria da moda está a caminhar num sentido mais inclusivo.
O albinismo é uma condição genética rara que provoca a falta de pigmento, o que faz com que a pele e o cabelo de Xueli sejam muito claros e também extremamente sensíveis à luz do sol. No entanto, aquilo que a torna diferente acabou também por impulsionar a sua carreira de modelo. Agora, aos 16 anos, já apareceu na capa da “Vogue” e participou em campanhas de alguns dos maiores designers do mundo.
Foi o staff do orfanato que lhe deu o nome. Em chinês, “xue” significa neve e “li” é sinónimo de bonita. Quando tinha três anos, Xueli foi adotada por uma família dos Países Baixos, para onde foi viver. Apesar da mudança, a sua nova mãe quis conservar o nome que, acredita, lhe assenta na perfeição. Ao mesmo tempo, foi também uma forma de manter uma referência às suas origens chinesas.
“Na altura em que nasci, o governo na China impôs uma política de apenas um filho por família. Eras extremamente azarado se tivesses um filho com albinismo. Algumas crianças, como eu, foram abandonadas, outras foram encarceradas ou, se tivessem a oportunidade de ir à escola, os seus cabelos eram pintados de preto”, explicou a modelo à jornalista Jennifer Meierhans.
Em alguns países africanos, acrescenta, os albinos são caçados, os seus membros podem ser cortados ou são mesmo mortos. Para os “médicos bruxos”, os seus ossos servem para fazer medicamentos — muitos acreditam que podem ajudar a curar doenças. São mitos sem qualquer base científica, mas Xueli acredita que, tendo em conta o que acontece em certos locais no mundo, teve sorte por ter sido apenas abandonada.
Os pais biológicos não deixaram quaisquer informações sobre ela quando a puseram à porta do orfanato, por isso Xueli não sabe exatamente a sua idade. Há cerca de um ano, foi-lhe feita uma radiografia à mão para que tivesse uma ideia mais acertada de quando nasceu. Os médicos concluíram que deveria ter cerca de 15 anos, como a família acreditava.
A carreira de modelo começou por acaso, aos 11 anos, graças a uma designer de Hong Kong conhecida da mãe adotiva. A mulher teve um filho com um lábio leporino e por isso quis desenhar-lhe roupas bonitas para que as pessoas não se focassem na sua boca. “Chamou à campanha ‘imperfeições imperfeitas’ e perguntou-me se gostaria de me juntar ao desfile em Hong King. Foi uma experiência incrível”, recorda.
Depois disso, começou a receber convites para fazer sessões fotográficas e acabou por ser procurada pela agência Zebedee Talent, que representa pessoas com deficiências na indústria da moda. Entretanto, foi parar à “Vogue” italiana em junho de 2019. O seu objetivo é usar a carreira como uma plataforma de sensibilização sobre o albinismo.
“Agora as pessoas com deficiências estão cada vez mais nos media e isso é ótimo — mas devia ser normal. Os modelos com albinismo são recorrentemente estereotipados nas sessões fotográficas para representar anjos ou fantasmas e isso deixa-me triste. Especialmente porque perpetua essas crenças que põem as vidas de crianças em risco em países como a Tanzânia e o Maláui”, explica.