Era apenas um miúdo apaixonado por ténis quando apareceu na televisão pela vez primeira vez. Num torneio em Toronto, teve a honra de ser um dos apanha bolas de uma partida do irascível John McEnroe. Um dos esféricos parou na rede e Hayden Christensen saltou para a apanhar. Não contava com o temperamento furioso do tenista que soltou toda a sua fúria na bola.
“Puxou a raquete a centímetros da minha cabeça”, recorda o ator de 40 anos. “Foi tudo acidental (…) Mas foi a minha primeira aparição na televisão e até apareci nas notícias.”
Meia dúzia de anos mais tarde, Christensen deixara para trás o sonho de ser tenista profissional e transformava-se num dos vilões mais famosos da história do cinema: Anakin Skywalker, o futuro Darth Vader. Aquele que poderia ser o primeiro grande papel de uma brilhante carreira tornou-se numa mancha no currículo que viria a definir todo o seu futuro.
Mais de 15 anos depois, a ator prepara-se para voltar à saga Star Wars, com um papel garantido em “Ahsoka” — uma minissérie spinoff que trará de volta o seu Anakin Skywalker —, mas que terá como personagem principal Ahsoka Tano, figura do cânone e que surge por breves momentos em “The Mandalorian”. A produção arranca em 2022 e está já a deixar apreensivos alguns dos seguidores mais fanáticos, ainda traumatizados pela performance do ator nas prequelas lançadas no início do século.
Nascido no Canadá, Christensen ponderou várias carreiras alternativas. Jogava hóquei no gelo e ténis, imaginou-se arquiteto, mas foi a paixão pela escrita criativa que o levou a tentar a interpretação — e um sortudo acaso.
Tinha apenas oito anos quando acompanhou a irmã mais velha a um casting e foi convidado a participar em anúncios. “Fiz isso durante um ou dois anos. Era a desculpa perfeita para me livrar das aulas”, recorda numa entrevista à “Interview”. “Nunca contava a ninguém porque tinha vergonha. Não levava muito a sério essa coisa de ser ator.”
Entre pequenos papéis na adolescência, teve a sua primeira grande oportunidade quando fez parte do elenco de estrelas de “As Virgens Suicidas” de Sofia Coppola, onde protagonizou um dos rapazes obcecados pelas irmãs Lisbon. Seria um ano depois, num casting entre mais de 1500 candidatos — alguns deles famosos como DiCaprio, Heath Ledger ou Ryan Phillippe —, que acabaria por ser escolhido para o papel de vilão de “Star Wars”.
“Quando o Hayden veio à primeira reunião, abri a porta e corei porque sabia [que era ele]. Sentou-se, olhei bem para ele pela câmara e senti um arrepio”, revelou em 2002 Robin Gurland, o diretor de casting dos episódios II e III de “Star Wars”. “O papel de Anakin é inato, o ator tem que ter uma ligação. No final da entrevista, sabia que o personagem tinha acabado de entrar pela porta.”
Christensen seria a nova grande estrela da saga, sucessor de Jake Lloyd, o ator que interpretou o jovem Skywalker no Episódio I — e que viria a terminar imediatamente a carreira (vítima de bullying e da pressão da imprensa, viveu anos difíceis até ser diagnosticado com esquizofrenia). O futuro de Christensen não seria tão dramático, mas também não foi propriamente simpático.
O regresso de “Star Wars” 16 anos depois da trilogia original foi recebido com enorme ansiedade. No entanto, a nova trilogia de George Lucas revelou-se uma profunda desilusão e foi atacada sem piedade por críticos e fãs. Haveria de ser vista com outros olhos anos mais tarde, mas o desastroso argumento e as fracas prestações dos atores não passaram em claro.
“Diálogos surpreendentemente desastrados que sublinham interpretações rígidas”, resmungava o crítico do “The Hollywood Reporter” sobre o episódio II. “Feche os olhos. Tape as orelhas. Essa é a única forma de assistir com prazer a ‘A Vingança dos Sith’ — a final e mais fútil tentativa de Lucas de criar uma trilogia com o mesmo espírito da saga que criou há 20 anos”, atirou a “Rolling Stone”.
A famosa exigência dos fãs da saga foi particularmente impiedosa com a interpretação de Hayden Christensen, mesmo quando a culpa não era dele — o atabalhoado argumento e as falas constrangedoras também traíram Natalie Portman, que não impressionou no papel de Padmé, apesar de ser, reconhecidamente, uma das melhores atrizes da sua geração.
“Não gosto de areia”, diz Anakin, numa das cenas que haveria de se tornar no símbolo do falhanço das prequelas. “É áspera, irritante, e entra em todo o lado.” O ar petulante da personagem também não ajudou. O curto diálogo é, ainda hoje, uma das piadas mais recorrentes entre os fãs.
O ator canadiano viria também a ganhar um Razzie — uma distinção alternativa ao Óscar, atribuída aos piores dos piores — pela performance. O nome de Christensen ficaria inevitavelmente colado à imagem de “mau ator” e por mais que tentasse, nunca mais conseguiria ver-se livre da fama.
Entre os dois filmes de “Star Wars”, Christensen protagonizou aquele que viria a ser unanimemente considerado o seu melhor papel. Em “Shattered Glass”, foi o protagonista central da biografia que narra a história verídica de Stephen Glass, o jornalista que se vê envolvido num escândalo, depois de descobrirem que grande parte das suas reportagens eram apenas obras de ficção.
O golpe final à carreira de Christensen chegou em 2008, com o absoluto fracasso de “Jumper”, o filme de ficção-científica de enorme orçamento que acabou por ser sacrificado pelos críticos. Isto apesar de ter tido algum sucesso de bilheteira.
Nunca desistiu de Hollywood, mas Hollywood parece ter desistido de Christensen. Os papéis começaram a tornar-se cada vez mais escassos e espaçados. Só voltaria aos ecrãs dois anos depois, com “Takers” e “Vanishing on 7th Street”, seguido de mais quatro anos de pausa. Na última década, fez uma média de um filme por ano. Produções pouco significativas e raramente elogiadas.
Foi apelidado de “a estrela mais insípida da sua geração” ou de “rapaz de pedra”. Perante a avalanche de críticas destrutivas, Christensen procurou resguardar-se.
Logo em 2008, comprou uma enorme quinta nos arredores de Toronto, onde passava a maior parte do tempo. “Estou cheio de vontade de sujar as mãos. Ali cultiva-se feno, mas quero encher o estábulo de gado. Primeiro porcos, depois vacas e cavalos”, afirmou na altura.
Abriu-se então uma nova carreira para o ator, que em 2013 lançou uma linha de roupa inspirada na vida rural. Foi também modelo em anúncios para a Louis Vuitton e para a Lacoste.

Apesar do trauma, Christensen ainda não tinha terminado a sua batalha em Star Wars. No final de 2020 anunciou o seu regresso ao ecrã, que acontecerá na minissérie televisiva “Obi Wan Kenobi”, onde regressa como Darth Vader; isto antes de voltar como Anakin em “Ahsoka”, que só estreará mais tarde.
Entre os fãs, parece haver agora um sentimento generalizado de perdão. O ódio visceral dirigido às prequelas foi atenuado pela crítica à mais recente trilogia e, com o passar dos anos, a memória de Christensen parece ter-se desvanecido. Muitos já não se recordarão do título de “rapaz de pedra” e das rábulas da areia. Do lado do ator, tudo parece perdoado e está mesmo disposto a deixar as vacas e a vida no campo. “Sabe bem estar de volta”, conclui.