Fernão de Magalhães era português, mas no novo filme assinado por Lav Diaz fala espanhol. A razão é desconhecida — até para os atores envolvidos. “Não acho que seja relevante tendo em conta o filme. A maneira como o Lav Diaz trabalha é mais conceptual. O objetivo não é ser exatamente verídico e realista. É uma leitura sobre um acontecimento histórico, mas não é um filme biográfico”, explica à NiT Rafael Morais, um dos atores portugueses do elenco.
O projeto, que tem Gael García Bernal no papel principal, estreia a 18 de maio no Festival de Cannes. “Magalhães” é uma coprodução entre Filipinas, Espanha e Portugal — os três países onde decorre a narrativa e onde decorreram também as filmagens. Por cá, as gravações passaram por Belém e Évora. A versão final deverá ter cerca de nove horas, mas para o festival será exibida uma versão com duas horas e 40 minutos.
Lav Diaz já tinha avisado que a história não seria contada da perspetiva do navegador português. “Não se trata mais de uma perspetiva dos europeus. É mais sob o ponto de vista do sudeste asiático. Sempre que fazemos coisas históricas relacionadas com a Europa ou com a América, a questão é sempre do lado do homem branco e eu quero equilibrar isso”, revelou à “Screen Daily”.
Ainda assim, o filme mergulha na história de Magalhães e da sua tripulação. Rafael Morais interpreta João Carvalho, um dos tripulantes que mais tarde se torna capitão de uma das embarcações. “A certa altura, há suspeitas de ele estar a conspirar contra o Magalhães”, adianta.
Quando soube que tinha ficado com o papel, após várias semanas de castings, o ator — que também participa em “Rabo de Peixe” — ficou “extremamente contente”. Trabalhar com Lav Diaz era um dos seus grandes objetivos profissionais.
No início, tal como os outros membros do elenco, não fazia ideia da dimensão da sua personagem. Viajou até às Filipinas sem saber quantas cenas faria. “Isso foi surgindo à medida que o próprio Lav ia descobrindo o filme. O que também é muito interessante para o ator. Foi uma aventura”, recorda.
Rafael rapidamente percebeu que “imprevisível” era a palavra certa para descrever toda a produção. Estava habituado a trabalhar com guiões completos e bem definidos, mas neste caso, descobria as cenas apenas nos dias anteriores às filmagens. “O realizador imaginava filmar a cena de outra maneira e tínhamos de estar sempre atentos a qualquer mudança. Foi uma experiência única e uma aventura.”
Com a estreia cada vez mais próxima, sente-se um ator diferente. “Não ter a preparação ou a ideia geral do que iria ser filmado ajudou-me a melhorar”, diz. “Cada vez mais procuro o desafio e estou a perder interesse na segurança e no que é previsível. Trabalhar desta forma é mais entusiasmante e para mim, enquanto ator, é melhor ter este lado de risco.”
“Cada vez mais procuro o desafio e estou a perder interesse na segurança e no que é previsível. Trabalhar desta forma é mais entusiasmante e para mim, enquanto ator, é melhor ter este lado de risco”, destaca. Após “Magalhães”, também percebeu que quer continuar a trabalhar com realizadores que tenham “visões peculiares” do que é o cinema. “Quero fazer todo o tipo de trabalhos.”
As filmagens também lhe deixaram memórias fortes. Uma delas envolveu uma mulher local e um bebé que contracenava consigo — e que não percebia o que se passava à sua volta. Ainda assim, Diaz conduziu tudo com “uma enorme sensibilidade”.
“Ele comunicou com a criança de uma forma em que não era demasiado direto, mas que percebia imediatamente o que ele queria que fizesse. Ele também conseguia ver o que podia aproveitar da essência de cada ator e estava aberto a todas as possibilidades”, recorda.
Ao lado de Gael García Bernal, estrela de “Diários de Che Guevara” e “Amor Cão”, Rafael viveu outro momento especial. “Foi fantástico colaborar com ele. É uma pessoa com muita simpatia e disponibilidade e desde o início que deu para ver que ele percebia que estávamos todos no mesmo barco”, brinca.
Rafael Morais ainda não viu o corte final do filme e, por isso, é difícil fazer suposições sobre as reações que a obra terá. Sabe, porém, que é um projeto “certamente interessante”. “Espero que seja bem recebido e que tenha muito sucesso”, conclui.
Além de “Magalhães”, Rafael Morais vai estar em Cannes com outro trabalho: “Entroncamento”, a nova longa-metragem de Pedro Cabeleira. “Dividida entre um emprego honesto e os esquemas do pequeno crime, Laura cruza-se com uma juventude desencantada não muito diferente de si. Nas ruas da cidade ferroviária sobressaem as lealdades, a ganância, a violência e a má sorte — onde toda a gente só quer uma vida melhor.” A protagonista é interpretada por Ana Vilaça.
Carregue na galeria e conheça algumas das séries e temporadas que estreiam em maio nas plataformas de streaming e canais de televisão.