Cinema

Armas e orgias. Como os anões de “O Feiticeiro de Oz” espalharam o caos nas gravações

Os atores que encarnaram os Munchkins atormentaram e assediaram o elenco e nem Judy Garland escapou.
Cada história é mais louca que a anterior.

Quando os anões que interpretaram os Munchkins em “O Feiticeiro de Oz” se reuniram pela primeira vez, o impensável aconteceu. “Ouvimos um gemido vindo da casa de banho dos homens. Um deles tinha-se embebedado durante o almoço, caído dentro da sanita e não conseguia sair”, disse Jack Dawn, a principal maquilhadora do filme, citada pelo “The Daily Mail”. Estaria longe de ser o único incidente inusitado a envolver os homens e mulheres no set, que ali chegaram um pouco por todo o país. Na década de 1930, a maioria destas pessoas com nanismo nunca tinham visto mais ninguém com a sua condição. E essa euforia traduziu-se num caos total, entre o local das gravações e o hotel onde ficaram hospedados.

Esta é apenas uma de muitas histórias icónicas das filmagens da obra protagonizada por Judy Garland que voltaram a ser comentadas nas redes sociais nos últimos tempos. Agora, há outro grupo de anões que está a suscitar comentários online — os protagonistas de “Branca de Neve”, o live-action do clássico filme da Disney que estreou a 20 de março nos cinemas.

Curiosamente, também o remake esteve envolvido numa controvérsia que revoltou os espectadores. Em vez de usar atores com nanismo, a gigante do entretenimento optou por criar as icónicas personagens através de efeitos especiais — e agora chama-lhes “criaturas mágicas”. “Para evitarmos reforçar estereótipos levantados pelo primeiro filme, vamos ter uma abordagem diferente”, disse em comunicado em 2022.

No entanto, a polémica por detrás de “Branca de Neve” não se compara às loucas histórias dos bastidores de “O Feiticeiro de Oz”. Muitas delas tornaram-se conhecidas em 2017 e correram o mundo. Uma das mais comentadas revelava o assédio sofrido por Judy Garland, a atriz que interpretou Dorothy, e foi confessada por Sid Luft (o seu terceiro marido) na autobiografia “Judy and I”.

“Os homens eram malvados. Achavam que podiam fazer tudo o que quisessem porque eram pequenos”, escreveu o produtor de Hollywood que morreu em 2005, 12 anos antes do lançamento do livro. Durante os oito meses de gravações, Garland foi assediada “centenas de vezes”.

Para acabar com o abuso, um assistente de realização ficou encarregado de mantê-los sob controlo. Rapidamente, o trabalhou passou a incluir outras funções: caso fossem presos, os atores teriam de ser rapidamente libertados sob fiança para não perderem as chamadas para as filmagens.

Acabarem a noite na cadeia não era um acontecimento raro. Ainda com a maquilhagem do filme, os Munchkins iam, depois de um longo dia de trabalho, para os bares de Culver City, perto de Hollywood, e embebedavam-se. “Eram extremamente desordeiros, gritavam e berravam. No dia seguinte, já no set, infernizavam a vida da Judy ao meterem-lhe as mãos debaixo do vestido”, recordou Luft.

Judy tinha apenas 1,50 metros de altura e uma aparência jovem para os seus 16 anos quando interpretou Dorothy. Os anões do filme tinham uma estatura semelhante e não resistiam em provocá-la, apesar de muitos deles terem mais de 40 anos.

As revelações surpreendentes de Luft poderiam ter sido descartadas como um caso isolado, embora particularmente perturbador, mas esta não era a única história que assombrou a produção de “O Feiticeiro de Oz” e, em particular, os Munchkins.

Confinados a um hotel durante meses, os anões participavam em “orgias sádicas, bebedeiras loucas”, envolviam-se em “prostituição e destruíam tudo à sua volta”. Comportavam-se de forma tão desordeira que a produção foi obrigada a colocar polícias em cada piso do hotel.

Tudo isto foi confirmado por Judy Garland, numa entrevista dada no programa de Jack Paar, em 1967. “Eram bêbedos. Embriagavam-se todas as noites e a polícia costumava apanhá-los com redes de borboletas”, recordou. A referência a estas redes dizia respeito a relatos de que alguns dos anões cambaleavam até ao telhado do hotel e tinham de ser apanhados em proteções colocadas nos pisos de baixo para não caírem.

A atriz também contou que num dia após as gravações, saiu com um dos atores — mas levou a sua mãe, Ethel Marion Milne, para não correr riscos. “Muito bem, duas mulheres pelo preço de uma”, terá dito o Munchkin.

Havia quem tivesse relatos ainda piores. Mervyn LeRoy, o produtor do filme, disse que “havia lutas, orgias e todo o tipo de confusão” diariamente. “A polícia de Culver City tinha de ficar no hotel para evitar que se matassem uns aos outros. Tinham poucas inibições a condizer com a sua pequena estatura”, acrescentou Mervyn, aqui citado pelo “The Times”.

A loucura dos atores era explicada por um simples motivo: era a primeira vez que estavam com outras pessoas com a mesma condição. Antes de serem contratados para o filme, muitos deles “ganhavam a vida a mendigar, a prostituir-se ou a serem chulos”, escreveu Bert Lahr, que interpretou o Leão Cobarde, no seu livro de memórias lançado em 1969. ” Assistentes foram encarregados de vigiar os anões, que empunhavam facas e frequentemente se apaixonavam por outros membros mais altos da produção.”

As histórias dos bastidores de “O Feiticeiro de Oz” foram sendo passadas de geração em geração, mas o lado dos Munchkins é, muitas vezes, esquecido. Muitos dos atores que os interpretaram não negam completamente o que aconteceu e admitem que houve algumas festas. Porém, insistem que foi apenas um pequeno grupo que acabou por manchar a reputação de todos.

Entre um dos mais problemáticos estava Charles Kelley, que apareceu no estúdio com duas pistolas carregadas depois de saber que Charlie Becker, outro anão que interpretava o presidente da Terra dos Munchkins, tinha demonstrado interesse pela sua mulher, Jessie, também atriz na obra. Depois de ameaçar o colega, foi expulso da produção.

Um facto que todos admitiram de bom grado é que eram mal pagos. Por semana, recebiam apenas 50 dólares (o que corresponderia a cerca de 800€ nos dias de hoje). É mais do que poderiam receber fora de Hollywood, mas, ainda assim, menos de um terço do que aquilo que Terry, o cão que interpretou Toto, ganhava.

Os atores ficavam ainda mais furiosos e frustrados quando tinham de dar metade do salário a Leo Singer, um implacável empresário alemão que geria uma trupe de anões que andava em digressão pelos Estados Unidos — depois de os ter comprado aos pais. “Nós estávamos revoltados porque não tínhamos uma vida digna. Não fariam o mesmo?”, questionou Priscilla Montgomery Clark, uma das Munchkins, em conversa com a “People”, em 2024.

Carregue na galeria e conheça algumas das séries e temporadas que estreiam em março nas plataformas de streaming e canais de televisão.

ÚLTIMOS ARTIGOS DA NiT

AGENDA NiT