Cinema

Beatriz Godinho: “As mães de recém-nascidos ficam muitas vezes isoladas dos adultos”

A atriz é protagonista de "Noites Claras", o novo filme que fala sobre maternidade, depressão e infanticídio. Chega aos cinemas esta quinta-feira.
Estreou nos cinemas a 30 de janeiro.

Numa das mais dramáticas cenas de “Noites Claras”, Beatriz teve que contracenar com um bebé de apenas um ano. No guião, a vida da criança estava em perigo. Só que a cada corte de cena, as gargalhadas tornavam-se inevitáveis e dificultavam a imersão na personagem. “Tornou-se num momento mais terno. Brincava com o meu nariz e com a minha cara. Eu estava a chorar e ela queria tocar nas lágrimas. Foi muito real e bonito”, recorda sobre o papel que considera ser um dos mais desafiantes da carreira. “Surpreendeu-me imenso porque tem um nível de intensidade emocional enorme.”

O filme português estreou esta quinta-feira, 30 de janeiro, nas salas de cinema e conta a história de dois irmãos afastados que se reaproximam quando as suas vidas se começam a desfazer. Lauro, o irmão, é divorciado, tem um filho, trabalha numa agência funerária e não sabe como lidar com o facto de ser bissexual. 

Lídia, a irmã interpretada por Beatriz Godinho, também não sabe o que fazer com a nova vida que cresce dentro de si, lida mal com as expectativas e sente-se incapaz de ser boa mãe, até que foge de casa e do marido. “Inicialmente, é uma mulher que está num período da sua vida bastante confortável”, explica Beatriz, de 32 anos. A protagonista é uma fotógrafa de sucesso, uma mulher independente e tem uma relação estável e satisfatória com o companheiro.

O casal decide ter um filho e é nessa altura que surgem os problemas. Embora pensasse que esse era o seu sonho, Lídia percebe rapidamente que não estava preparada para ser mãe. “Depois de ter o bebé, começa a sentir-se perdida porque não tinha nenhum ponto de referência e sentia-se isolada. As mães de recém-nascidos ficam, muitas vezes, isoladas de todos os outros adultos e às vezes até do próprio companheiro. Começam a sentir que falharam”, refere.

Apesar de não ser mãe, Beatriz Godinho queria perceber como é a maternidade nos dias de hoje e quais as principais dificuldades — e foi esta uma das razões que a levou a candidatar-se ao papel. Em “Noites Claras”, também foi a primeira vez que interpretou uma mãe. “Foi um desafio muito grande”, confessa.

Outra dificuldade foi contracenar com bebés. “Tive de perceber quais as ferramentas que tinha para poder contracenar com alguém que não sabe que está a contracenar comigo.” Durante as gravações, acredita que foi para uma “zona de completa verdade” porque não “dava para fingir e fazer um mau trabalho”. “Os bebés expõem-nos se não estivermos a ser verdadeiros no que estamos a fazer.”

O papel chegou até Beatriz através de um casting — e o de “Noites Claras” demorou cerca de duas horas, mais do que o habitual. Durante esse tempo, teve a oportunidade de trabalhar em várias cenas e fazer “improvisação física”, algo que se tornou crucial ao longo das filmagens.

“O corpo está muito presente”, começa por explicar. A obra tem muitas cenas em que, no ecrã, apenas se veem Lídia e a bebé, que não dizem uma única palavra. Nessas alturas, teve de transparecer as suas emoções não através de um guião, mas sim “através do corpo”.

Compara a experiência à dança contemporânea. Durante a rodagem, trabalhou com um coreógrafo para dar uma imagem “mais animal do que é o seu humano a habitar no seu próprio corpo”. Isto foi especialmente gratificante porque Beatriz, também conhecida pelas participações em “Cuba Libre” e “Morangos com Açúcar”, sempre foi apaixonada pela dança. “Quando era mais nova, queria ser bailarina clássica e cheguei a estudar ballet. Foi muito bom fazer uso destas valências e tornou o trabalho mais complexo.”

As filmagens arrancaram no início de 2022 e duraram cerca de três meses. Decorreram principalmente dentro de uma “casa lindíssima na Graça”, em Lisboa. A arquitetura da cidade também está muito presente na narrativa.

O facto de não terem gravado em estúdio acarretou uma grande dificuldade numa cena em particular em que Lídia, o marido e a filha estão na praia, supostamente no verão. No entanto, foi filmada em pleno fevereiro numa praia em Sintra. “Estas cenas dentro de água convidaram-nos a treinarmos o nosso nível de foco e concentração”, brinca.

Com a participação em “Noites Claras”, Beatriz Godinho tem um objetivo bem definido: “combater a questão do isolamento e solidão das mães e dos recém-nascidos numa altura de tanta turbulência nas suas vidas”. “Enquanto sociedade, ficaremos a ganhar se criarmos uma rede de apoio mais sólida para as novas mães. Há imensas Lídias em casa que precisam do nosso cuidado, apoio e presença.”

Carregue na galeria e conheça algumas das séries e temporadas que estreiam em janeiro nas plataformas de streaming e canais de televisão.

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