O Brasil a chorar e gritar por uma vitória inédita. Poderíamos estar a falar de futebol, mas não: o palco foi a gala dos Globos de Ouro e o troféu ficou nas mãos de Fernanda Torres, a atriz que, a 6 de janeiro, fez história ao tornar-se na primeira brasileira a conquistar o prémio na categoria de Melhor Atriz num Filme de Drama. Apenas outra atriz brasileira havia sido nomeada, precisamente a sua mãe, Fernanda Montenegro.
“A Fernanda pediu que não fizéssemos disto um jogo de futebol, mas nós não conseguimos aguentar”, lê-se numa publicação com mais de 70 mil gostos no X (antigo Twitter). Nas redes sociais, tornaram-se virais vídeos de brasileiros a celebrar a vitória em bares e cafés.
A euforia em torno da atriz de 59 anos deve-se ao seu trabalho em “Ainda Estou Aqui”, que estreou nos cinemas nacionais esta quinta-feira, 16 de janeiro. No Brasil, chegou às salas em novembro do ano passado.
A obra realizada por Walter Salles — que dirigiu “Central do Brasil”, nomeado a dois Óscares, e “Diário de Che Guevara — retrata a comovente história verídica de Eunice Paiva, interpretada por Torres. A narrativa centra-se no desaparecimento do seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva, encarnado por Selton Mello, durante a ditadura militar no Brasil, e na incansável busca de Eunice por respostas e justiça.
O filme baseia-se no livro homónimo de Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice e Rubens, que relata as experiências da sua família durante este período sombrio da história brasileira. A trama foca-se na força e resiliência de Eunice, mãe de cinco filhos, que,após o desaparecimento do marido em janeiro de 1971, enfrenta o regime autoritário e ousa procurar esclarecimentos sobre o seu paradeiro.
Fernanda Torres, em entrevista à CNN Brasil, descreveu a obra como um filme “sobre a memória”, alg que “propõe uma reflexão sobre a distopia de uma ditadura e de um estado autoritário através de uma família e do afeto”.
Em todas as entrevistas que tem dado, a atriz enfatiza principalmente a importância de abordar temas relacionados com o autoritarismo e as consequências que provoca nas famílias mais afetadas. “O filme não é sobre os revolucionários, a esquerda, a guerrilha contra a ditadura. É sobre uma família, o que todos podem se relacionar”, contou à “Elle”. “É sobre afeto e sobre pensar em afeto num mundo cheio de raiva e de ódio.”
Para as gravações, Walter Salles optou por uma abordagem intimista e filmou a narrativa por ordem cronológica, num estilo quase documental, para captar a autenticidade das personagens. A protagonista confirma que este processo simples permitiu mergulhar profundamente na personagem. “Ela tornou-se parte de mim”, confessa.
O que também faz parte de si é o amor pela representação, muito graças aos pais, também eles atores bem conhecidos. “A minha mãe sente pena das pessoas que não conhecem o prazer que o teatro nos proporciona”, contou Fernanda Torres à revista “W”.
A mãe é Fernanda Montenegro, uma das mais famosas caras da representação no país. “Já interpretou rainhas e assassinas e foi tudo o que queria ser. Eu também fui criada no teatro, não podia escapar. Desde os 13 anos que sou atriz”, explica a filha.
Ao longo destes 46 anos, houve alguns nomes com os quais colaborou frequentemente, tal como Walter Salles. Trabalharam juntos pela primeira vez em 1994, no filme “Terra Estrangeira”, que foi gravado entre o Brasil e Portugal. “Foi um projeto que nos formou. O Walter descobriu qual era o seu estilo enquanto realizador e eu descobri que a improvisação pode ser uma boa forma de escrever. Em ‘Ainda Estou Aqui’, estamos todos juntos — eu, ele e a minha mãe”, conta à mesma publicação.
A interpretação de Fernanda Torres como Eunice Paiva tem sido amplamente elogiada, o que resultou na sua vitória no Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz Num Filme de Drama. No discurso, dedicou o prémio à sua mãe e destacou a importância da arte em tempos difíceis: “Com tanto problema hoje em dia no mundo, tanto medo, este é um filme que nos ajudou a pensar em como sobreviver.”
Carregue na galeria e conheça algumas das séries e temporadas que estreiam em janeiro nas plataformas de streaming e canais de televisão.