Daniel Louro é português, tem 35 anos e é um grande fã de cinema. Trabalha como videógrafo freelancer — faz sobretudo vídeos institucionais para empresas e filma casamentos — e tem um podcast cinéfilo chamado VHS, com Paulo Fajardo. Mas o projeto que o traz até à NiT é outro: The World Is a Set.
A fotografia é um passatempo que tem — apesar de ser uma atividade que está naturalmente ligada ao vídeo. O que Daniel Louro faz é viajar até aos locais de filmagens de produções icónicas, em vários países, para tirar fotos e criar montagens com frames desses filmes. Para ter uma ideia melhor, o mais simples é mesmo ver algumas das imagens.
Tudo começou há cerca de um ano e meio. “Eu sempre gostei muito de locais retratados no cinema”, conta à NiT. “Já tinha visto na internet coisas semelhantes ao que faço, mas achei que conseguia fazer um bocadinho melhor e dar um pouco mais de contexto. É um passatempo.”
Daniel Louro partilha no seu Instagram — que à data de publicação deste artigo não chegava aos 950 seguidores — estas montagens que misturam o sítio na vida real e o mesmo local retratado no cinema.
A foto foi tirada na Praça de Espanha, em Sevilha.
A ideia começou com uma viagem aos EUA em outubro do ano passado, onde o videógrafo esteve cerca de um mês. Na preparação dessa viagem, foi procurar vários locais que gostaria de visitar — o objetivo era fotografá-los e começar este projeto. Enquanto não chegava o mês de outubro, foi testando o mesmo exercício em Portugal e em Espanha, em sítios mais próximos.
“Foi uma descoberta gira em Portugal, mesmo que não haja assim tantas produções internacionais gravadas cá. A viagem aos EUA rendeu muito — ainda tenho fotos para editar e publicar.”
A primeira foto que publicou, porém, foi tirada em Londres, no Reino Unido. “Foi do penúltimo ‘Harry Potter’ [‘Harry Potter e os Talismãs da Morte: Parte 1’], numa rua em Londres, que é uma cidade que tem imensos sítios, o difícil é escolher. Curiosamente, mais tarde foi filmado no mesmo sítio uma cena de ‘Doutor Estranho’.”
Apesar de viajar pelo mundo a tirar estas fotos, o motivo para as viagens que faz é conhecer os sítios e passear. Este projeto é só uma razão extra. “Sempre que vou viajar procuro locais de filmagens que posso visitar. Os famosos são muito fáceis, mesmo, por exemplo, os sítios no deserto da Tunísia onde filmaram cenas de ‘Star Wars’. Mas existem alguns bastante difíceis, exige muitas horas de pesquisa e de Google Maps para os conseguir identificar [risos]. Às vezes fico lixado porque só descubro outros sítios depois, e até posso ter passado mesmo lá ao lado.”
Uma das viagens que mais gostou de fazer foi à ilha de Kaua’i, no arquipélago americano do Havai, para captar imagens nos locais de filmagem da saga de “Parque Jurássico”.
“Foi a foto mais cara que fiz, porque há um vale nesta ilha, que só pode ser visto com uma viagem de helicóptero de uma empresa muito específica, tive de pagar uns 200 ou 300 euros. Mas valeu a pena.”
Daniel Louro queria fotografar uma pradaria noutra zona da mesma ilha, mas era um rancho privado e não conseguiu entrar. “Na verdade era só saltar uma cerca e andar um bocadinho que tinha conseguido chegar lá, mas não tive coragem. A invasão de propriedade alheia nos EUA é um bocadinho mais séria do que em Portugal [risos].”
Outra viagem, bem mais próxima, foi a algumas zonas de Espanha onde foram filmados os western de Sergio Leone. “São zonas desérticas no meio do nada ali em Almería. Algumas delas foram transformadas quase em parques temáticos de westerns.”
Daniel Louro junto do helicóptero na ilha de Kaua’i.
“Mas outros locais são autênticas cidades fantasmas com um ambiente místico — até porque não eram cidades reais, eram cenários a imitar casas antigas. Visitei também o set do ‘Exodus: Deuses e Reis’, o filme do Ridley Scott, em que as casas estão feitas para parecerem construídas com barro, mas não são. É uma mistura interessante.”
Em Portugal, fotografou, por exemplo, vários locais no Estoril onde foi gravada uma das histórias de James Bond, “007 — Ao Serviço de Sua Majestade”, que estreou em 1969. “Alguns dos locais estão muito parecidos e no Hotel Palácio Estoril ainda trabalham lá duas pessoas que apareceram como figurantes no filme. Até convidei um deles para o meu podcast e estivemos à conversa.”
Mas também há locais que praticamente desapareceram. “A Casa dos Espíritos” teve cenas gravadas no Alentejo, perto de Vila Nova de Milfontes. “Fui lá e as pessoas locais sabem exatamente em que monte fica a casa onde as cenas foram gravadas. Mas só restam umas escadas, que vão dar a lado nenhum, agora aquilo é uma zona de pasto. Mas eu gosto disto, é quase arqueologia do cinema.”
A próxima viagem que vai fazer é ao Vietname, onde foram gravadas há dois anos partes do filme “Kong: Ilha da Caveira”. “Foi um grande marco porque foi a primeira produção de Hollywood no Vietname, não sei quantas décadas depois. Eles até tiveram um aumento no turismo por causa disso. Tenho de ver se consigo ir até aos sítios, porque não posso conduzir no Vietname por ser estrangeiro. Mas consegui falar no Instagram com um dos tipos da produção que me apontou mais ou menos as zonas no mapa.”
Na mesma viagem vai passar pelo Camboja, outro país do sudeste asiático. “Já tenho o trabalho de casa todo feito. Sei todos os sítios onde foram gravados os ‘Tomb Raiders’ da Lara Croft, com a Angelina Jolie.”
Depois, Daniel Louro vai até Vancouver e Toronto, no Canadá. “São duas cidades onde foram gravados imensos filmes e que habitualmente pensamos que foram filmados nos EUA.”
Daniel Louro fotografou em Paris no local onde gravaram “A Origem”.
Outros locais a que gostava mesmo de ir são as zonas nos arredores dos Pinewood Studios, perto de Londres, onde foram gravados vários filmes de “Star Wars”. Outro país que está na lista é a Islândia.
Além de conhecer os locais — que Daniel Louro diz serem sempre bonitos, porque o cinema costuma ter bom gosto — com este projeto o objetivo é também “perceber o impacto que um filme teve naquele local”. “Muitas vezes até são usados habitantes daquela zona como figurantes.”
Daniel Louro diz que também gostava de explorar o fenómeno de filmes de terror low-budget, muitas vezes também com cenas eróticas — num género bastante específico chamado exploitation — que várias produções espanholas gravaram em Portugal nos anos 60 e 70. “Quase não há informação sobre isto, mas, por exemplo, foi gravado um filme de canibais na Serra de Sintra. São casos muito específicos.”
Neste momento, e como forma de pensar o futuro deste projeto, Daniel Louro está a “namorar a ideia” de fazer um guia — com fotos e texto — sobre os locais de gravações de cinema em Portugal, para o turismo cinematográfico. “Era algo que gostava de fazer.”
Carregue na galeria para ver mais fotografias tiradas por Daniel Louro (as restantes estão no Instagram).