Televisão

Entre o álcool e as drogas: a vida atribulada de Fábio Assunção, o galã da Globo

Tornou-se numa das estrelas das novelas brasileiras e a fama chegou a Portugal. Luta há mais de 15 anos com a dependência.
Uma das muitas mudanças de visual dos últimos anos

Era um miúdo paulista como os outros. Tocou guitarra, aprendeu a cantar, sonhou ser estrela de rock e até teve uma banda, mas foi noutra arte que se destacou, depois de ter arriscado num curso de teatro.

Começou na bizarra produção da Globo “Vamp”, uma telenovela com vampiros. Em pouco tempo, transformou-se num galã da televisão brasileira. Claro que, inevitavelmente, a sua fama chegou a Portugal, graças a novelas como “Rei do Gado”, “Vidas Cruzadas” ou “Totalmente Demais”.

Hoje, Fábio Assunção já entrou na casa dos 50 e continua a fazer novelas — foi uma das personagens de “Onde Está Meu Coração”, lançada em 2021 —, mas a sua atenção está mais focada noutro problema. Um que o acompanha há pelo menos 15 anos.

“Fui pela primeira vez aos Alcoólicos Anónimos há cerca de 15 anos”, recordou à “Veja” em 2020. “À saída fui fotografado por um paparazzo e saiu um artigo no jornal. Prejudicou-me muito. Demorei anos para voltar lá.”

Ao longo dos últimos 17 anos, o ator, agora com 50, teve altos e baixos, algumas recaídas, mas hoje está mais magro, em forma e, diz, completamente limpo. Muito graças também à religião. “Já passei pelo budismo, espiritismo e agora estudo o Ifá, que é uma filosofia milenar nigeriana”, explica.

“Isso trouxe-me uma consciência cósmica universal que foi transformadora. Sou filho de Obatalá, o rei do pano branco que gosta do silêncio e tem a frequência da justiça, da clareza, da retidão. Foi forte e vejo com clareza todos os benefícios que isso me trouxe”, contou à “GQ”.

Na novela “O Rei do Gado”, de 1996

2020 trouxe uma mudança no panorama da sua vida. Perdeu perto de 30 quilos para um novo papel e casou com Ana Verena, depois de várias relações atribuladas. A mais complicada, contudo, terminou só há dois anos — a perigosa relação com o álcool, a “droga mais pesada” que diz ter conhecido.

“Eu não bebia ao acordar, nunca bebi no trabalho, mas a determinado momento achei que o álcool podia ser uma alternativa mais leve”, explicou. “Acontece muita coisa: acidentes, violência doméstica, agressões verbais, arrogância. Há quem tenha sabedoria para beber, mas há uma parcela de 14 a 16 por cento da população mundial que não sabe parar. E eu disse sim ao não.”

Em 2018, por exemplo, foi apanhado pela polícia a conduzir embriagado, após um acidente em São Paulo. Acabou por ser detido pela polícia, por apresentar sinais de embriaguez, apesar de se ter recusado fazer o teste. Um ano antes, tinha também sido detido numa festa, já de madrugada, acusado de ter agredido várias pessoas, entre eles alguns agentes. Já no carro patrulha, terá mesmo partido alguns vidros do veículo. Acabaria por alegar não ter tomado qualquer tipo de droga e justificou-se com o exame toxicológico que o próprio pediu para fazer.

Sobre o vício, remete para a adolescência, passada durante os anos 80, quando “o mundo tinha outra relação com as drogas”. “É claro que as más influências existem, mas sempre tive a última palavra e sou responsável pelas minhas escolhas”, notou.

Relativamente aos casos polémicos de detenções, lamenta o facto de não ter tido a possibilidade de tratar dos problemas de forma privada. “As pessoas tendem a colocar o consumidor das drogas no centro do debate, quando na verdade há todo um contexto jurídico, religioso, médico e político que lucra com a venda ilegal das substâncias”, afirma. “Não digo que os dependentes sejam uns coitados, mas estão desamparados.”

O ator, que se filiou no Partido dos Trabalhadores em 2017, prefere também justificar a situação pelo contexto político e social. “Avançámos nas agendas do feminismo, no ambiente, mas ficamos parados na dependência química. Chamar bêbado a alguém que sai de um bar a cair pelas paredes, é o mesmo que usar um termo racista.”

O facto de ser um dos mais conhecidos atores da Globo e das suas telenovelas, levou a que o seu problema com as drogas fosse comentado por milhões de brasileiros, alguns pouco sensibilizados para a causa. Foi alvo de gozo e de brincadeiras, até canções foram feitas em seu nome. Uma delas levou mesmo o ator a exigir uma indemnização em tribunal. Após a vitória na justiça, o ator acordou com a banda que os valores angariados pelo tema deveriam ser entregues a instituições de apoio a toxicodependentes.

Havia dois grandes culpados da destruição na vida do ator, o álcool e a cocaína, que o levaram a várias clínicas de reabilitação. Em 2008, passou 40 dias numa clínica no Arizona, nos Estados Unidos. Em 2010, nova passagem por outra clínica, desta vez em São Paulo, onde ficou por quatro meses.

“Nunca me acomodei com a dependência, sempre procurei resolver o problema”, explica. Agarrado à filosofia, à religião e à terapia, confessa que, por estes dias, o único vício é mesmo o tabaco. E revela que conseguiu, ao fim de todos estes anos, evitar o fundo do poço. “O fundo do poço é desistir e morrer. Eu estou aqui, vivo.”

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