Um protesto interrompeu a apresentação de um livro infantil pró-LGBT na sexta-feira, 22 de setembro, em Lisboa. Os autores do primeiro livro infanto-juvenil em Portugal, escrito com recurso ao sistema Elu, acusam os manifestantes de censura e ameaça à liberdade de expressão.
Cerca de dez manifestantes assistiam à apresentação do livro “No Meu Bairro”, na livraria Almedina do Rato, em Lisboa. Um manifestante, conhecido no Twitter pelo discurso de ódio relativamente à comunidade LGBT, interrompeu o evento de megafone em punho, para calar a autora Lúcia Vicente, o ilustrador Tiago M., os representantes da editora e as apresentadoras. A PSP foi chamada ao local e identificou os manifestantes.
O incidente, gravado e publicado pelos próprios, mas também por quem se encontrava no local, espalhou-se rapidamente pelas redes sociais. Vicente fala de “manifestação ilegal” e num “episódio de censura”, uma posição apoiada pelo grupo editorial Penguin, chancela da editora do livro, Nuvem de Letras, que fala numa “ameaça à liberdade de expressão” e de um “protesto intimidatório”. O Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, já veio repudiar a atitude dos manifestantes que apelidou de “inaceitável”.
“Manifestamos a nossa total solidariedade para com a autora e o ilustrador, as apresentadoras do livro, as nossas colegas da editora que estavam presentes, a livraria que nos acolheu e todas as pessoas que foram pacificamente assistir à apresentação do livro e ao importante debate em torno da diferença, da diversidade e da equidade que este pretende promover”, pode ler-se no comunicado divulgado na conta de Instagram da Penguin.
Lúcia Vicente, autora de uma obra infantil que aborda a inclusão e a diversidade através de uma linguagem neutra, está a considerar levar o caso ao Ministério Público. “Estamos a ponderar apresentar uma queixa, pois o que se passou ali foi claramente censura”, comentou à Lusa, citada pelo “Público”.
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Logo após o anúncio do lançamento do livro que as críticas se avolumaram. “No Meu Bairro”, que foi lançado a 11 de Setembro, é o primeiro livro infanto-juvenil em Portugal a ser redigido utilizando o sistema Elu e tem o objetivo de integrar um género gramatical neutro na língua portuguesa. Com ilustrações de Tiago M., a obra compila 12 histórias rimadas que abordam a vida de crianças, tocando em temas como racismo, identidade de género, religião, bullying e ativismo.
Entre as diversas vozes que ecoam nas páginas do livro, encontramos Maria Miguel, uma criança não-binária, e Amir, um jovem portador de vitiligo, que partilha as suas histórias únicas através de poesia.
Entretanto, está agendada uma nova apresentação da obra, que terá lugar a 29 de setembro. Deverá acontecer, segundo a Penguin Random House, na Fundação José Saramago, num evento com medidas de segurança mais apertadas. A editora revelou igualmente que o incidente ajudou a potenciar uma maior procura nas livrarias, sendo que o primeiro stock já está esgotado. Está em avaliação o lançamento da segunda edição.
