Colleen Hoover já vendeu mais de 20 milhões de livros. Contra todas as probabilidades, tornou-se uma das maiores autoras da atualidade — sobretudo com a ajuda do TikTok, onde a etiqueta #colleenhoover foi vista mais de 3 mil milhões de vezes. Vivia num parque de autocaravanas com os três filhos e com William Heath, o marido camionista — ou seja, passava muito tempo em casa sozinha com os miúdos. Tinha uma vida monótona como assistente social e ganhava apenas 8€ por hora. No pouco tempo livre que tinha, aproveitava para escrever.
A sua infância foi igualmente difícil. Lembra-se de ter apenas dois anos e de estar escondida no quarto com a irmã. Quando espreitou pela porta, viu o pai a atirar uma televisão a mãe. Este episódio marcante acabou por se tornar uma das maiores inspirações para as suas obras.
Apesar de se ter popularizado graças aos romances, Colleen, de 44 anos, é eclética. Já escreveu thrillers psicológicos, histórias sobre fantasmas e narrativas que destacam o abuso de drogas e a pobreza. Muitas vezes, os seus trabalhos combinam sexo, drama e reviravoltas inesperadas.
Em 12 anos já lançou mais de 25 livros e vendeu um total de 20 milhões de cópias. Foi, na verdade, a escritora que mais vendeu em 2023. Tudo começou com “Slammed”, em 2012, cuja história retrata toda a magia do primeiro amor. Naquela altura não tinha nenhuma editora a apoiá-la e publicou-o sozinha na Amazon. Quando recebeu cerca de 27€ graças aos direitos de autor, ficou em êxtase — afinal, este valor seria o suficiente para pagar a conta da água no parque onde vivia com a família.
Sete meses depois, em agosto, chegou ao top da lista de bestsellers do “New York Times” e já tinha outro sucesso em mãos: “Point of Retreat”, uma sequela. Aqueles 27€ iniciais não eram nada ao pé dos 45 mil euros que recebeu. Este montante foi dado ao padrasto, que no passado lhe tinha emprestado o que precisava para comprar a autocaravana. Confiante, deixou de lado o trabalho como assistente social e dedicou-se à escrita a tempo inteiro. Atualmente trabalha com três editoras diferentes: Grand Central, Atria e Montlake.
A norte-americana natural de Sulphur Springs, no Texas, encontrou a sua fórmula para o sucesso. Os livros são descritos por muitos seguidores como a sua “zona de conforto” porque já sabem o que esperar. A protagonista conhece o futuro namorado numa situação caricata, ambos são atraentes e têm personalidades explosivas, mas um obstáculo impede-os de estarem juntos. Ultrapassam-no e vivem felizes para sempre.
As críticas às histórias
O público-alvo são adolescentes e jovens adultos. É devido a isto mesmo que a escritora começa a ser cada vez mais criticada. Afinal, os seus livros “romantizam relações abusivas e violência doméstica”, lê-se em inúmeras críticas, tanto nas redes sociais como em revistas e jornais académicos.
O seu trabalho mais famoso é “Isto Acaba Aqui”. Foi publicado em 2016 e, até 2019, tinha vendido cerca de um milhão de cópias. A popularidade explodiu uns anos depois, em 2021, quando começou a ser recomendado e comentado no TikTok. No ano seguinte e em 2023 foi o livro mais vendido nos Estados Unidos, com cerca de 1,29 milhões de cópias comercializadas.
O fenómeno foi agora adaptado ao cinema, num filme protagonizado por Blake Lively. A produção estreou esta quinta-feira, 8 de agosto, nas salas de cinema nacionais. A narrativa acompanha Lily Bloom, uma mulher que superou um passado traumático e começou uma nova vida em Boston, onde pretender abrir o seu próprio negócio (uma florista).
Após um encontro inesperado com o neurocirurgião Ryle Kincaid, nasce uma intensa ligação entre eles. No entanto, à medida que o amor cresce, Lily começa a ver traços em Ryle que lhe recordam o turbulento casamento dos pais. Complicando a situação, surge Atlas Corrigan, o primeiro amor de Lily, tornando o relacionamento ainda mais desafiador.
“Este é o livro que mais significa para mim”, disse a autora em conversa com a “Entertainment Weekly”. “Tentei adaptar outros, mas o esforço nunca foi frutífero. Tenho estado a rezar há seis anos que isto acontecesse. Significa imenso porque é um trabalho muito pessoal”, acrescenta.
Revelou também que a história é inspirada em Vannoy Fite, a sua mãe que foi vítima de violência doméstica de Eddie Fennel, o marido. “Ela deixou-o pouco tempo depois e é um pilar de resistência e força. Nunca percebi como tinha aguentado naquela relação abusia. Escrever ajudou-me a explorar isso.”
Uma grande controvérsia da norte-americana de 44 anos surgiu em 2023, quando foi anunciado que este bestseller daria origem a um livro de colorir. Dada a temática de violência doméstica, várias pessoas começaram a criticá-la, acusando-a de apenas querer fazer dinheiro e de não ter tato com a realidade.
A 11 de janeiro, e milhares de mensagens e críticas depois, decidiu retroceder. “Desenvolvi-o enquanto pensava na força da Lily, mas agora consigo ver que estava cega. Ouvi-vos e concordo com vocês. Não há desculpas. Não vou culpar a ninguém. Entrei em contacto com a editora para informar que não vamos avançar. Do meu lado, não há nada além de amor”, escreveu num Story do Instagram.
Embora muitos não a consigam apoiar apesar da popularidade, há vários outros que sempre se sentiram atraídos para a bibliografia de Hoover. É, portanto, uma das escritoras que mais divide as opiniões atualmente.
Alguns já afirmaram que “Isto Acaba Aqui” ajudou-os a mudar a perspetiva que tinham sobre a violência doméstica e que, graças à obra, conseguiram perceber o porquê de um parceiro agredido ter dificuldades em sair de uma relação tóxica. “Vários leitores já me contaram que conseguiram sair de situações terríveis graças aos meus livros. Isso é a coisa mais fantástica de sempre. Partilhar estas histórias pode mudar a vida de alguém”, contou à “TIME”.
A psicóloga Naomi Torres-Mackie, contudo, afirma que o facto de o trauma ser a génese da existência de uma personagem pode ser “desumanizador e paralelo ao que acontece na realidade, em que vítimas pensam que agora é apenas isso que as define”, conta à mesma publicação. “Isso é muito infeliz porque os sobreviventes são humanos multifacetados, tal como todos nós.”
Por outro lado, acrescenta que o trauma tem um lugar importante na literatura e no entretenimento. É importante, porém, que tais representações existam de “uma forma holística, humana e equilibrada”. “Ler conteúdo como este pode ser um alívio numa cultura onde todos devemos ser despreocupados”, conclui.
O sucesso foi claro e o apoio superou as críticas. Graças a isso, foi lançada em 2022 uma sequela: “Isto Começa Aqui”. No primeiro dia, a obra vendeu 800 mil cópias apenas nos Estados Unidos, subindo imediatamente para o número 1 dos bestsellers da semana.
O filho abusador
Em fevereiro de 2022, uns meses antes do lançamento do livro, Colleen voltou a estar envolta em polémica, daquela vez devido ao filho Levi, de 23 anos. Uma jovem acusou-o de abuso sexual numa publicação nas redes sociais.
“O filho assediou-me e ela bloqueou-me quando a confrontei com isso”, revelou a miúda que, na altura, tinha 16 anos — Levi tinha 21. Conta ainda que eram amigos no Snapchat, que falavam todos os dias e que ele sabia que ela era menor de idade. Apesar disso, o acusado começou a levar a conversa para um lado mais sexual. As alegações foram apoiadas por prints de conversas.
Furiosa, a escritora — que no início publicava os seus livros sem a ajuda de editoras — não demorou a defender o jovem. “O que está a ser dito não é verídico. Estão a comentar que bloqueei uma rapariga após me ter informado que o meu filho tinha sido sexualmente abusivo quando ela tinha 16 anos. Isto nunca aconteceu. Após termos falado, agradeci-lhe e pedi-lhe desculpa”, escreveu no Facebook.
Garante também que responsabilizou Levi pela mensagem que tinha enviado e que o castigou. Além disso, enviou a morada da sua casa e o contacto de um advogado caso a miúda quisesse avançar com uma queixa.
Nenhuma destas polémicas está a parar o sucesso de Colleen, que é casada com William Heath desde 2000. Em maio deste ano, foi revelado que “Verity”, um thriller psicológico que lançou em 2018 e que já vendeu cerca 3,5 milhões de cópias, também vai ser transformado em filme.
A história apresenta uma escritora de pouco sucesso, Lowen Ashleigh, que é contratada pela família de uma autora bestseller para terminar a série de livros que começou. No entanto, fica claro que Verity Crawford, impossibilitada de continuar a trabalhar após um misterioso acidente, esconde vários segredos.
“Isto Acaba Aqui” conta com uma avaliação de 58 por cento no Rotten Tomatoes. “Tenta balançar a realidade da violência doméstica numa comédia romântica sobre o empoderamento feminino. Todos estes aspetos sofrem durante o processo”, escreveu a “Associated Press”.
Carregue na galeria e conheça algumas das séries e temporadas que estreiam em agosto nas plataformas de streaming e canais de televisão.