Em 2019, a entidade que produz moedas no Reino Unido decidiu não lançar uma moeda comemorativa com a face de Enid Blyton. A justificação? As reclamações de vários membros que apelidaram o trabalho da escritora infantil de “racista, sexista e homofóbico”.
Um ano depois, a English Heritage, instituição que gere monumentos e museus no país, alterou também a sua informação sobre a autora. “O trabalho de Blyton tem sido criticado pelo seu racismo, xenofobia e falta de mérito literário.”
A controvérsia que tem envolvido a obra da escritora que morreu em 1968, com 71 anos, levou a que muitos dos seus livros mais famosos — escreveu “Os Cinco” e criou a personagem Noddy — fossem revistos e censurados. Agora, de acordo com o “The Telegraph”, as livrarias públicas de Devon, no Reino Unido, estão ativamente a ocultar os livros originais de Blyton.
Em exposição e facilmente acessíveis estarão as versões modernas e revistas. Segundo o jornal, quem requisita as versões originais é advertido do seu conteúdo. O mesmo sucede a quem procura pelos livros nos catálogos online.
Segundo a empresa que gere as livrarias públicas, os livros são frequentemente atualizados pelas novas versões. As edições originais e indesejáveis são armazenadas em zonas que estão vedadas aos visitantes.
Blyton, goste-se ou não, foi uma prolífica autora de livros infantis com mais de 700 obras no currículo. A polémica, contudo, sempre a acompanhou. Foi em 2010 que a editora Hodder anunciou que estaria na altura de “atualizar” as obras para as tornar “intemporais”.
As primeiras revisões incidiram sobre “Os Cinco”, histórias que começaram a ser escritas na década de 40. Uma revisão feita de forma “sensível e cuidada”, anunciou então a editora. “A narrativa mantém-se intacta, não vai ser alterada”, afirmavam os responsáveis.
Mas as alterações às obras de Blyton não são uma moda recente. Na década de 80, os livros de Noddy sofreram uma enorme alteração que substituiu todo um grupo de personagens.

No livro original, Noddy era atormentado pelos golliwogs, criaturas que eram retratadas como desenhos pejorativos habitualmente usados para ilustrar, nas décadas anteriores, pessoas negras. Os golliwogs eram bonecos de trapos que roubavam, aldrabavam, mentiam e cometiam crimes. Em 1986, foram trocados por goblins.
Uma das obras mais polémicas de Blyton chama-se “The Little Black Doll”, que conta a história de uma pequena boneca de pele negra que é odiada pelo seu dono e por todas as outras bonecas. A boneca acaba por fugir de casa e, entre aventuras, é apanhada no meio de uma chuvada. A água lava-lhe a pele e revela, por baixo, uma cor rosada. A partir desse momento, a boneca é recebida de braços abertos pelo dono e pelas bonecas.
Nos livros de “Os Cinco”, revelava-se um problema de sexismo, com as raparigas recorrentemente atormentadas por nunca “poderem ser tão boas como os rapazes”. Segundo o “The Guardian”, a versão revista desta saga, alterada para apelar às crianças dos tempos modernos, foi um falhanço.
Ainda assim, os últimos anos têm ficado marcados por constantes revisões da sua obra, com termos como “castanho”, “queer” e “gay” a serem alterados. Uma tentativa de modernizar a obra e também evitar potenciais situações de ofensa, um pouco à imagem do que se verificou recentemente com as obras de Roald Dahl, criador de “Charlie e a Fábrica de Chocolate”.