A 1 de junho, no 14A da Avenida Rovisco Pais, perto do Arco do Cego, abriu a mais recente livraria de Lisboa, a Miosótis. O nome é o de uma flor azul muito usada como símbolo da memória — daqueles que partiram, por exemplo. Neste caso, representa os livros que permanecem na lembrança dos leitores.
O projeto é da portuguesa Adelaide Nikolic, que fundou a editora independente Adelaide Books em 2019, em Nova Iorque, nos EUA — o marido é americano e o casal vive entre os dois lados do Atlântico. Com base na editora, decidiu abrir uma livraria.
“Uma das nossas maiores dificuldades sempre foi conseguirmos ter algum posicionamento no mercado. Precisamente por sermos independentes e pequenos é difícil termos os nossos livros à venda [em espaços físicos]. É uma dificuldade que todos os pequenos editores têm. A certa altura começámos a pensar se não faria sentido abrirmos o nosso próprio espaço, porque quando tínhamos lançamentos estávamos sempre dependentes das localizações de terceiros”, explica à NiT.
Começaram a desenvolver a ideia de abrir uma livraria e, depois, a procurar um espaço. Encontraram uma antiga Papelaria Fernandes, que ali existiu durante os últimos dez anos, e que antes tinha sido uma outra papelaria — desde “os anos 50 ou 60”.
“Permite-nos ter os nossos livros, mas não só. Temos a preocupação de ter livros de outros pequenos editores, não só dos grandes. E temos esse feedback, de que faz toda a diferença verem os livros disponíveis na montra. Ou até projetos que não são de editoras — por exemplo, obras ilustradas feitos por designers que não têm visibilidade”, diz Adelaide Nikolic.
Portanto, dos “bons milhares” de livros que existem na Miosótis, cerca de metade são edições independentes; e a outra metade são títulos das grandes editoras. A responsável pela livraria diz que cerca de 95 por cento das editoras portuguesas estão representadas — o objetivo é mesmo serem abrangentes.
“Temos oferta para quem quer romances mais comerciais, como um Pedro Chagas Freitas, e temos a poesia ou o livro de teatro daquela editora de uma ou duas pessoas que muitas vezes é uma edição mais cuidada, mais pensada, para outro tipo de público.” Enquanto editora, a Adelaide Books centra-se sobretudo em ficção — tem autores portugueses, mas também alguma literatura traduzida, e livros infantis ou de memórias, entre outros formatos.
“Acabamos por ter poucos livros editados, mas são coisas que acreditamos que têm mais qualidade, favorecendo novos autores, que achamos que têm qualidades e merecem uma oportunidade para estarem no mercado”, explica Adelaide Nikolic, sobre os critérios que utiliza na hora de escolher o que editar.

A ideia é que a Miosótis funcione como uma “livraria de bairro”, que seja um local confortável onde os leitores possam passar tempo a folhear livros ou a trocar impressões sobre literatura. Não querem ser vistos, de todo, como uma espécie de hipermercado de livros. Também por isso, Adelaide Nikolic preferiu manter a mobília original.
“Não só tinha bastante qualidade, mas porque quisemos manter esse feeling de um sítio não estéril, um sítio acolhedor onde as pessoas podem vir, ficar e sentirem-se à vontade. E temos conseguido isso.”
Na frente de loja, a Miosótis tem a secção geral de livros. Depois existe uma área só com títulos em segunda mão — onde se encontram clássicos da literatura em várias línguas e algumas raridades; uma sala infantil, onde os miúdos podem ler, brincar e fazer desenhos; e um espaço de galeria e eventos, onde se podem fazer apresentações de livros, tertúlias ou sessões de clubes de leitura, por exemplo. Este último espaço funciona também como galeria e acolhe exposições de artes plásticas.
Adelaide Nikolic assume estar “aberta a receber propostas de artistas” e de eventos. “Não precisam de ser apenas lançamentos ou clubes de leitura — desde que faça sentido para nós e para o nosso espaço a nível artístico e cultural, todos os projetos são bem-vindos. É realmente uma questão de analisarmos.”
A livraria inclui também uma secção considerável de livros em mirandês, com mais de 20 títulos. “Não costumam ter relevância nas livrarias, mas temos ainda uma boa secção. As pessoas ficam muito surpresas porque nem sabiam que existiam, não têm noção. Temos, por exemplo, ‘Os Lusíadas’ e ‘Mensagem’, e depois as coisas feitas por autores locais e regionais que acabam também por não ter tanta visibilidade. Eu ainda sou uma falante muito inicial [risos], mas faz sentido dar visibilidade a este tipo de literatura, até porque é a segunda língua oficial do País.”
O site da editora, onde existe alguma informação sobre a Miosótis, só tem disponíveis os livros lançados pela Adelaide Books. No futuro, a ideia é criar um site com todo o catálogo disponível na livraria.
“O objetivo é que seja um sítio inclusivo, onde haja um match entre o livro e o leitor, por mais difícil que seja. Há poesia para quem é do nicho, há o romance que saiu esta semana e existem as alternativas que muitas vezes não estão disponíveis em mais lado nenhum”, remata Adelaide Nikolic.
E acrescenta: “Temos recebido um feedback bastante positivo. Dizem que é um sítio confortável, com uma grande variedade de bons livros. E isso deixa-me bastante satisfeita”.
Carregue na galeria para conhecer melhor o espaço da Miosótis.