A vida do radialista português Luís Filipe Barros sempre esteve ligada à música internacional. Nos anos 70, foi responsável por vários programas onde passava temas que eram um verdadeiro fenómeno naquela altura — e que se mantêm nas playlists até aos dias de hoje.
Para celebrar os 50 anos do 25 de abril, esta quinta-feira, a NiTfm vai ter uma emissão especial só com música que passava nas rádios portuguesas naquele período específico. A curadoria foi feita pelo próprio Luís Filipe Barros, que tem atualmente 75 anos.
Abba, Paul McCartney, Elton John, James Taylor, Ringo Starr, Eric Clapton, Led Zeppelin, The Doors e Carole King são alguns dos artistas que vai poder ouvir na emissão especial da nossa rádio — que também passará em todas as estações do Metropolitano de Lisboa apenas e só durante o 25 de abril.
O radialista começou o seu percurso na Rádio Universidade, em Lisboa, no final da década de 60. “Era dali que saíam todos os locutores que depois iam para outras estações e para a televisão”, conta à NiT.
Em 1971, ganhou uma nova casa: a Rádio Renascença. Por lá fez vários programas, mas há um que destaca: “O Tempo Zip”, ao lado de nomes como Joaquim Furtado. O projeto “ganhava prémios todos os anos” graças à sua qualidade e popularidade. A estadia por lá, contudo, não foi longa. Nesse mesmo ano, teve de ir para a Angola com a tropa, onde passou três anos.
Em janeiro de 1974, voltou à Renascença e, mais uma vez, deu voz a vários programas de autor onde passava, lá está, as bandas que eram um sucesso naquela época — como os Yes ou os Supertramp. Estávamos, afinal, “na altura do rock progressivo”.
Embora não estivesse no seu local de trabalho quando os militares invadiram a rádio na manhã do 25 de abril de 1974, Luís Filipe Barros recorda-se perfeitamente daquele dia. Na véspera, tinha ido sair com uns amigos ao Apolo 70 — era lá que estava um dos seus snack bars favoritos.
Quando saíram, por volta da uma da manhã, “estavam dois tipos com o carro estacionado a barafustar com a polícia e a dizer que aquilo ia tudo acabar no dia seguinte e que ia tudo ser nosso”. Poucas horas depois, quando acordou na manhã de 25 de abril, já estava a decorrer golpe de Estado.
“Alguns colegas meus, como o Miguel Tomás, o Paulo Coelho e o Joaquim Furtado estiveram envolvidos nisso”, recorda. “Foram eles que passaram a senha e leram o comunicado.”
Depois da revolução, não fez rádio durante cerca de quatro anos, após ter sido colocada uma bomba na Rádio Renascença. O governo também pretendia restituir a estação aos seus proprietários originários: a Igreja Católica.
Quando finalmente voltou àquele meio, a 9 de abril de 1979, juntou-se à Rádio Comercial para lançar o “Rock em Stock”. Como diz à NiT: “Foi uma oportunidade para dar a conhecer a música rock à malta mais nova”. Abandonou o projeto em 1982, mas acabou por regressar cinco anos depois. Ficou por lá até 1993.
Todo este percurso singular fez com que a rádio se tornasse numa das grandes paixões da vida de Luís Filipe Barros. “Este meio sempre teve uma grande relevância no nosso País e teve um papel decisivo na revolução democrática”.
A NiT também vai ter uma edição especial para o 25 de abril
Como seria ler uma revista de lifestyle portuguesa no dia 25 de abril de 1974, pouco antes da revolução? Esta foi a premissa para criarmos uma edição especial da NiT que estará online na quinta-feira, para celebrar precisamente os 50 anos do 25 de abril. Ao longo dos últimos meses, a nossa redação procurou quais eram as maiores novidades desse mês, semana ou dia em Portugal e falou, agora, com as pessoas responsáveis pelos projetos — como se elas ainda vivessem antes da revolução.
O resultado final é uma edição escrita, pensada e desenhada como os jornais da época e que vai poder conhecer a partir da meia-noite desta quinta-feira, no site da NiT. São dezenas de notícias, reportagens e entrevistas que servem de fotografia daquele dia específico e que nos mostram como tantas coisas mudaram nestas décadas — e como outras continuam iguais. Alguns excertos dos textos mais sensíveis estão riscados a azul, à semelhança do que a Direção dos Serviços de Censura da PIDE costumava fazer nos órgãos de comunicação social.
As seis revistas de imprensa regional do universo NiT também terão uma edição especial com a mesma linha editorial no 25 de abril. Por isso, basta abrir os sites da New in Cascais, New in Oeiras, New in Seixal, New in Porto, New in Setúbal e New in Coimbra para saber o que estava a acontecer em cada uma destas cidades.
“A equipa da NiT começou por tentar responder a uma pergunta, acabou por criar sete revistas e uma rádio. Este exercício — que tentámos que fosse o mais realista possível — permite-nos, de certa forma, compreender como era a vida cultural e social dos portugueses durante o Estado Novo”, diz Jaime Martins Alberto, publisher e fundador da NiT.
E acrescenta: “Ao contrário do que as gerações mais novas pensam, também havia concertos, filmes no cinema, peças no teatro e restaurantes novos durante a ditadura. Tínhamos uma elite que consumia tudo o que acontecia lá fora, que organizava tertúlias nos cafés e verdadeiros espetáculos políticos — sempre com vontade de transformar a nossa sociedade. O problema é que existia em simultâneo um País pequeno, cinzento e reprimido. E, sobretudo, com muito medo da mudança de regime. Penso que a nossa edição ilustra bem essa dicotomia”.