Há duas décadas que o Maus Hábitos existe — enquanto espaço cultural no centro do Porto, produtora e promotora de eventos, consultora para autarquias, e projeto de restauração. Agora, prestes a celebrar o 21.º aniversário, a marca expande-se para Lisboa e Vila Real.
A inauguração de ambos os projetos acontece este sábado, 15 de janeiro. Em Lisboa, o Maus Hábitos vai ocupar o pátio e rooftop do Selina Secret Garden, para desenvolver programação cultural e um espaço de bar e restaurante. Em Vila Real, o Maus Hábitos ganhou a concessão para explorar o café-concerto do teatro municipal. Além de restaurante e bar, o espaço conta com uma área de galeria para exposições e um palco.
Depois do restaurante Vícios de Mesa, no Porto, a reinvenção em Lisboa e Vila Real passa a ser Vícios à Mesa — tudo sob a aura do nome Maus Hábitos e da associação cultural Saco Azul.
“Foi há sete anos, no Porto, que decidimos que faltava um restaurante. E montámos um formato de inspiração mediterrânica — com pizzas, saladas, lasanhas, produtos para vegetarianos, veganos e celíacos — onde fomos buscar o nosso passado enquanto conceito vegetariano puro e duro e integrámos numa coisa que agradasse a mais pessoas”, explica à NiT o fundador do Maus Hábitos, Daniel Pires.
A pandemia fez com que a sala de espetáculos do Maus Hábitos, no Porto, tivesse de ficar em suspenso. Para continuarem a atividade cultural, intensificaram a programação à mesa, a que as pessoas podiam assistir enquanto tomavam uma refeição.
“Fizemos mais de 200 espetáculos. O que para nós foi muito importante porque o nosso ADN é realmente a programação e as questões artísticas. Agora, efetivamente, não conseguimos manter esta liberdade que temos tido ao longo destes anos todos, de fazer o que nos dá na gana, se assim posso dizer, sem termos meios de financiar esta loucura. Achámos que através da restauração e dos bares conseguíamos — e conseguimos”, acrescenta Daniel Pires.

O responsável pelo Maus Hábitos explica que o convite foi feito pelo grupo Selina para serem parceiros neste projeto. “Decidimos trazer para Lisboa a programação à mesa, e outra programação mais solta que não passa pela mesa, mas que faz sentido neste espaço, nesta unidade. Tem características muito particulares, é extremamente bonito, é uma espécie de oásis no meio da cidade. E achámos que havia pontos de encontro muito fortes entre o que o Maus Hábitos faz e o que o Selina pretendia.”
Daniel Pires diz que a programação “é para todos”, mas não serão “só projetos muito confortáveis e easy listening”. “Serão coisas que terão a sua densidade, o seu peso, que possam chamar a comunidade artística de Lisboa” — tanto artistas portugueses como internacionais, assegura.
Por enquanto, já estão confirmados o ciclo de concertos experimentais Oscilador Gráfico, que começam logo no dia 15 (com Miguel Carvalhais e Henrique Fernandes a darem som ao trabalho gráfico de Serafim Mendes); e os concertos “Sons à Mesa” de Venga Venga e Osso Vaidoso (de Ana Deus e Alexandre Soares). Ao longo do mês, estão prometidos “DJ Sets representativos da diversidade que se vai ouvindo pela capital e não só”. Neste mês de janeiro passam pela cabine Nuno Rabino, Trafulhice, DJ Dingo, Death Disco Disaster, Paolo Dionisi e Radio Safari.
“Já tínhamos tido vários convites para viajar até Lisboa. Obviamente, sempre achámos que seria extremamente difícil. Mas esta pandemia veio-nos ensinar que o pior que nos pode acontecer é desaparecermos. Portanto, o risco de que as coisas corram mal existe, mas dada a nossa experiência, os anos que temos, levou-nos a crer que isto poderia funcionar.”

Enquanto o espaço da capital está já a funcionar em modo soft opening, aberto para os hóspedes do hotel, o Vícios à Mesa de Vila Real abre no sábado, dia 15 de janeiro, para todos.
“Temos um espaço também de restauração e bar, com atividades regulares — lá temos um palco, um piano, uma imensa esplanada e estamos em frente ao parque do rio Corgo. Temos uma condição geográfica e arquitetónica muito particular e interessante. É óbvio que Vila Real tem necessidades que Lisboa não tem e provavelmente vai consumir a nossa programação de uma outra forma. Em Vila Real há uma descentralização de um projeto cultural que está numa cidade grande como o Porto. Julgo que nisso vai trazer mais-valias.”
E acrescenta, sobre a concessão que ganharam: “Se fosse só para um restaurante e bar, obviamente que não teríamos concorrido. E também é fixe deixar aos leitores da NiT a ideia que muitas pessoas que fazem projetos de restauração deveriam ter um pequeno palco para que os artistas possam atuar. Já há bares e restaurantes que cheguem que não oferecem nada mais do que aquilo já sabemos que vamos encontrar. E ter programação é sempre uma mais valia. É um desafio, um sítio onde se investe dinheiro, mas julgo que o retorno que daí vem — não imediatamente, são coisas feitas para durar — nos vai trazer muitas alegrias e nos vão deixar um gosto de boca muito mais interessante do que se fosse só um restaurante. Seria apenas mais um.”
O café-concerto de Vila Real vai receber a exposição “Arte Robótica”, do artista Leonel Moura. Na festa de abertura do espaço, haverá ainda lugar para um concerto do ciclo Oscilador Gráfico, um projeto também apoiado pela DGArtes e que junta seis designers e doze músicos numa exploração sonora e visual a três mãos: Angélica Salvi e Pedro Tudela sonorizam a partitura gráfica de Inês Nepomuceno.

No dia 20, o Oscilador Gráfico está de regresso com Sarnadas e Lorr No a darem som à partitura gráfica de Avelino Resende. Antes, no dia 18, há poesia dita acompanhada de vídeo arte e música: “Palavra à Mesa”, com Ana Deus.
Às quartas-feiras, o palco do Vícios à Mesa de Vila Real vai passar a receber concertos de bandas emergentes e consagradas com as noites “Sons à Mesa”. Este mês há atuações de Aurora Pinho e Pedro de Tróia. No dia 25, o espetáculo “Cabarex” inaugura “Cabaré à Mesa”, com assinatura do encenador e performer Filipe Moreira.
A ideia de descentralizar o Maus Hábitos, diz, já tem “três ou quatro anos”. Mas a pandemia acelerou a necessidade de o projeto se multiplicar e se diversificar para conseguir manter a atividade regular. Também já receberam convites para fazer pop ups noutros países, mas não está ainda nada fechado. Além disso, poderão nascer mais Maus Hábitos espalhados por Portugal.
“Estamos a pensar nisso e a tentar perceber onde é que farão falta. Porque realmente só vamos onde fizer falta. Não que Lisboa tenha falta, mas acho que o que podemos trazer pode ser interessante e altamente complementar. Faz mais falta em cidades mais pequenas, do interior, com menos capacidade de atração até dos seus residentes. E projetos desta natureza acabam por deixar marcas e por consolidar populações. Portanto, acho que faz todo o sentido criá-los, manter… Estamos muito atentos aos agentes locais e vamos contactá-los e pô-los dentro de portas a fazerem atividades connosco. Isso tudo vai criar sinergias, movimento, mais programação.”