Música

Casa da fadista Mísia foi transformada em museu e espaço para artistas emergentes

Alguns dos pertences da artista serão leiloados. Outros foram entregues a museus, cumprindo a sua vontade.
Tinha 69 anos.

Após a morte de Mísia, nome artístico de Susana Maria Alfonso de Aguiar, em julho deste ano, a casa onde vivia na Baixa de Lisboa manteve-se exatamente igual. As paredes coloridas, os sofás e cadeiras cor de rosa, os quadros e até as plantas foram conservadas de forma a transformar o espaço numa residência de artistas emergentes que queiram inspirar-se na fadista.

A iniciativa partiu da Kees Eijrond Foundation (KEF), em conjunto com o amigo próximo e herdeiro de Mísia, Sebastian Filgueiras, para conseguirem honrar o desejo da cantora: manter o espaço vivo para a criação artística. “A fundação adquiriu a casa da Mísia e decidiu transformá-la num espaço de criação artística com três vertentes: teremos residências com artistas de Lisboa, exibições de outros que estejam de passagem pela cidade e queiram apresentar o trabalho. Um outro desejo nosso é que a casa seja aberta ao público. A ideia é manter vivo o legado da Mísia”, anunciou Mirna Queiroz, Diretora Artística da KEF, citada pelo “Diário de Notícias”.

As únicas coisas que foram retiradas foram os vestidos que usava em palco, algumas joias e o xaile que a caracterizava. Parte dos seus pertences foi doada aos museus do Fado e ao MUDE e os restantes serão leiloados em breve.

Neste momento, a casa já está ocupada pelo primeiro residente. David J. Amado, um americano-jamaicano radicado em Lisboa, é conhecido pelas suas skills na dança e performance. O bailarino tem aproveitado o tempo para mergulhar no universo da fadista portuguesa, ler os seus livros e perceber o estilo da artista.

As residências artísticas na casa de Mísia têm duração de duas semanas para os artistas que vivem em Portugal e uma semana para os que estão de passagem por Lisboa. Após a experiência de David J. Amato, os próximos dois artistas que terão a oportunidade de trabalhar no local serão o brasileiro Bruno Ribeiro e a portuguesa Francisca Neves.

Ao todo, a artista gravou 13 discos, nos quais cantou em português, francês, napolitano, catalão e espanhol, misturando sonoridades e culturas distintas. É, por isso, considerada uma das artistas mais originais da música portuguesa. A maioria dos temas da artista incluía fados com assinatura dos maiores autores nacionais, entre os quais José Saramago, Lídia Jorge e Agustina-Bessa Luís.

O seu discurso de estreia, “Mísia”, foi editado em 1991. O disco incluía canções de Joaquim Frederico de Brito, José Niza, José Carlos Ary dos Santos, Carlos Paião, entre outros poetas. Seguiram-se trabalhos como “Tanto menos, tanto mais”, em 1995, “Ritual”, em 2001, “Drama Box”, em 2005 e “Senhora da Noite”, em 2011.

Em 2004, a cantora foi condecorada com o grau de Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras de França. Já em 2005, recebeu o grau de Comendador da Ordem do Mérito.

Fora dos palcos, Mísia não teve uma vida fácil. A infância foi marcada por uma depressão com seis anos, além de ter enfrentado um casamento marcado pela violência doméstica. Mais tarde, travou uma batalha com uma doença oncológica grave. Sobreviveu e decidiu que queria contar a sua história.

O último disco da artista, “Animal Sentimental”, foi editado em 2022 e lançado em conjunto com um livro que se assemelha a uma autobiografia. Nele, a cantora relatou vários momentos da sua vida, como os problemas de saúde ou o casamento na qual foi violentada durante vários anos. Cada capítulo da obra corresponde a uma música sobre o mesmo tema.

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