Música

Do altar com Julia Roberts à prisão e à música — ninguém pára Kiefer Sutherland

A estrela de ação de “24” e filho do ícone Donald Sutherland transborda talento. Agora prepara-se para lançar o terceiro disco.

Kiefer Sutherland era a versão mais fresca e irreverente da família, o ator com o peso da tradição no apelido e uma das estrelas de Hollywood. Em 1990, esbarrou com Julia Roberts no set de “Flatliners” e deu-se início a um dos mais falados romances do cinema dos anos 90.

Roberts, que estava noiva de Dylan McDermott, cancelou os planos e juntou-se a Sutherland, que se apressou a terminar o seu casamento com Camelia Kath. Ele tinha 24 anos, ele 23.

O noivado foi anunciado no verão de 1990 e o casamento deveria ter lugar no ano seguinte. Só que a três dias da data, Roberts decidiu cancelar tudo, ao saber que Sutherland andava a encontrar-se com uma dançarina. O ator negou tudo e explicou que não se tratava de um caso extraconjugal, mas de nada serviu.

O pior veio depois. No dia do casamento, a imprensa apanhava Roberts a viajar para a Irlanda na companhia de Jason Patric, grande amigo de Sutherland que contracenou com o ator em “The Lost Boys”. A rivalidade haveria de ser sanada vários anos depois, mas deixou as suas marcas, sobretudo na carreira musical. Afinal, Sutherland decidiu tornar-se numa estrela country, género que gravita quase sempre sobre os temas da traição e dos amores destruídos.

Aos 55 anos, o ator que ficou eternizado pelo papel de Jack Bauer na série de ação “24” está prestes a lançar um novo disco, o terceiro, sucessor de “Down in a Hole” (2016) e “Reckless & Me” (2019). “Bloor Street” é oficialmente lançado esta sexta-feira, 21 de janeiro.

Sutherland recorda até o momento em que se reencontrou e perdoou Patric, precisamente a meio de uma piada sobre os lugares comuns da música country. “Estava a fazer uma piada sobre uma música e alguém me perguntou sobre o Jason. E eu disse: ‘Bem, eu perdi a minha carrinha de caixa aberta, o meu cão, o meu melhor amigo e sinto realmente falta do meu melhor amigo'”, conta num podcast onde participou ao lado do também ator.

“Quando o vi outra vez, trocamos poucas palavras além de umas gargalhadas e um brinde”, disse Patric. “Agora, bem, somos amigos de 35 anos.” “Mas nunca consegui recuperar a carrinha”, brincou Sutherland.

Sutherland sofreu na pele os males que habitualmente afetam as jovens celebridades que carregam o peso da fama. “Fiz 11 filmes seguidos que chegaram a número um”, recorda. “Era novo e achava que ia ser sempre assim. De repente, estava nos meus 30 e as coisas desapareceram por um minuto.”

O casamento com Roberts implodiu, a carreira entrou numa fase mais atribulada e Sutherland refugiou-se no álcool. Mesmo quando ressurgiu em 2001 no papel de Jack Bauer, os problemas mantiveram-se por perto.

Os anos que se seguiram ficaram marcados por controvérsias, quase sempre ligadas ao consumo excessivo de álcool. À “Rolling Stone”, em 2006, recordou um dos episódios que terminou bem, depois de um jantar bem regado com Gary Oldman. “[A polícia] estava a algemá-lo e ele estava de joelhos, ao nível da janela do carro onde eu estava. Ele tinha a cabeça para baixo, olhou para cima e disse: ‘Bem, da próxima se calhar combinamos apenas um almoço.’”

Outros cenários tiveram finais menos recomendáveis, como a noite num bar que terminou com um espancamento a um desconhecido que ousou “lamber o pé” da namorada de Sutherland. “Continuei a bater, a bater, a bater, a bater. Não parei porque não queria que o tipo se levantasse”, recorda. “Senti-me pessimamente depois disso. Lembro-me de pensar que a vida era demasiado curta para ter este tipo de comportamento.”

Histórias não faltam. Da ocasião em que se atirou vestido para a piscina do Beverly Hills Hotel, ao striptease que fez num bar, em tronco nu, antes de oferecer uma lap dance a um estranho. Ou a ocasião em que se atirou para cima de uma árvore de Natal num hotel de luxo em Londres. “Não disse nada [aos funcionários do hotel] e foi por isso que foi tão engraçado. Era uma piada, feita para alguém se rir. A árvore ficou bem. Ficou tudo bem.”

Ao olhar para trás, o ator confessa que o álcool é o que lhe causa mais mágoa, seja pelos comportamentos que tem quando bebe ou simplesmente porque se trata de um vício. “E também porque sou uma figura pública. Envergonhei a minha mãe e a minha família, mas sobretudo a minha filha. E esse é o maior problema”, contou à revista.

“Depois de beber umas quantas bebidas, nunca me preocupo com o amanhã, mas também não penso no que aconteceu no dia anterior. Estou no momento e a cagar-me para tudo o resto. Isso está nos manuais dos alcoólicos problemáticos”, diz. “Não sou estúpido, eu sei que a culpa é minha. Normalmente é para tentar fazer alguém rir. E no dia seguinte, só penso: ‘Oh meu Deus, não me deixem voltar a fazer isso.’ Mas porque é que o faço outra vez? E outra vez? E mais uma vez?”

E voltou mesmo a fazê-lo, desta vez com consequências mais severas. Em 2007, foi apanhado a conduzir alcoolizado e por ser a quarta infração do género desde 1989, foi mesmo condenado a 48 dias de prisão efetiva.

“Estou extremamente desapontado comigo próprio”, explicou à época. “Sinto muito pelo desapontamento e pela aflição que causei à minha família, amigos e colegas.” Mais tarde, confessaria a experiência de passar várias semanas encarcerado. “Nunca tinha estado na prisão. Já tinha passado brevemente por celas por coisas incrivelmente estúpidas que fiz ao longo da vida e posso dizer que a primeira coisa que se perde quando se passa por aquelas portas é a dignidade.”

Dois anos depois, voltou a ser detido depois de agredir com uma cabeçada o estilista Jack McCollough, durante uma festa de um evento de angariação de fundos. Foram estas experiências que, segundo o próprio, o ajudaram a criar o seu estilo musical pessoal, altamente inspirado em lendas country com histórias semelhantes. À cabeça: Johnny Cash.

“Sempre gostei do Cash por isso. Sempre quis escrever uma canção que fosse uma homenagem à sua escrita”, contou em 2016, por altura do lançamento do seu primeiro disco. Um apaixonado confesso de música, tem uma coleção de mais de 100 guitarras e criou mesmo uma editora, a Ironworks.

Mesmo enquanto reconhece os problemas que o álcool trouxe à sua vida, Sutherland mantém-se firme e recusa largar de vez a bebida. “Gosto desses momentos [de bebida com os amigos], apesar das possíveis consequências”, explicou recentemente. “Estaria a mentir se dissesse que não houve momentos em que senti tudo a escapar-me das mãos. Tem sido assim toda a minha vida. Nunca fui o tipo de, se algo corria mal, me afogar em mágoas.”

Sobre a sobriedade, admite que chegou a ter alguns períodos a seco. “Mas a certa altura tomei a decisão, certa ou errada, de que preferia esforçar-me para ainda poder viver esses momentos, ao invés de parar por completo. É uma escolha que eu fiz e tenho que viver com ela.”

Agora, aos 55 anos, continua a fazer o que gosta, sobretudo na televisão, onde fez parte do elenco de séries como “The First Lady”, The Fugitive” e “Designated Survivor”, mas sobretudo nos palcos, onde se prepara para apresentar “Bloor Street”.

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