Depois de ter conquistado cinco Grammys no início de fevereiro, Kendrick Lamar voltou a ser a estrela este domingo, 9 de fevereiro. O rapper de 37 anos foi o artista principal do espetáculo de intervalo da 59.ª Super Bowl, um dos eventos desportivos e televisivos mais importantes do ano nos EUA — e não deixou nada por dizer.
Horas antes de subir ao palco, todos perguntavam o mesmo: iria ele ter coragem de cantar a “Not Like Us”, a canção que lançou em maio de 2024 em que acusou Drake de pedofilia e tráfico sexual, no maior palco do mundo? Foi preciso isso que Kendrick Lamar fez.
Pouco antes de arrasar com “Not Like Us”, que venceu a Canção do Ano nos Grammys, o artista fez um pequeno reparo. “Quero tocar a canção favorita deles, mas vocês sabem que eles adoram processar”, disse, ao referir-se ao processo de Drake contra a Universal Music Group (UMG), acusando a editora discográfica que o representa de difamação por lançar e promover o tema de Kendrick Lamar. Segundo o cantor canadiano, a letra promove “a narrativa falsa e maliciosa de que ele é um pedófilo”.
Ainda assim, nada impediu Lamar de cantar o êxito que colocou fim à rap battle entre os dois. Durante o momento, dezenas de dançarinos tomaram conta do palco, incluindo a ex-tenista Serena Williams, que supostamente esteve numa relação com Drake.
Embora tenha deixado de fora a palavra “pedófilo”, ouviu-se a multidão gritar “a minor”, uma espécie de trocadilho que insinua os alegados relacionamentos inapropriados de Drake com menores.
Para encerrar o espetáculo, o artista cantou “TV Off”, enquanto sorria para a câmara no momento em que as luzes do estádio se apagaram e, nas bancadas, surgiu uma mensagem iluminada: “Game Over”.
Ao longo de 14 minutos, o rapper captou a atenção das cerca de 75 mil pessoas que encheram a Ceaser’s Superdome, em Nova Orleões. Entre elas estava o presidente dos EUA, Donald Trump, que foi também um dos visados por Kendrick Lamar, embora de forma mais discreta.
Numa atuação carregada de simbolismo político, um dia após a organização ter decidido retirar a zona do relvado onde se lia a frase “End Racism” (“Acabem com o Racismo”), Lamar convidou o ator Samuel L. Jackson para se juntar a ele no palco. Vestido à moda do famoso “Tio Sam”, a personificação nacional dos EUA, o ator abriu as hostilidade e deu as boas-vindas ao “grande jogo americano”.
Kendrick Lamar’s Full Super Bowl Halftime Show performance #SuperBowl pic.twitter.com/OxZED0YXDn
— popculture (@notgwendalupe) February 10, 2025
Nas redes sociais, o momento não passou despercebido e muitos interpretaram a referência como uma crítica aos esforços de Trump para acabar com os programas de diversidade e inclusão. “Donald Trump é forçado a assistir Samuel L. Jackson, vestido de Tio Sam, a apresentar Kendrick Lamar no espetáculo do intervalo do Super Bowl depois de pedir à NFL para não mostrar a frase ‘Acabem com o Racismo’”, escreveu um dos utilizadores do X.
Apesar de ainda não ter falado publicamente sobre a atuação, o presidente dos EUA terá saído do seu camarote pouco antes do espetáculo terminar.
Logo após o aparecimento de Samuel L. Jackson, o rapper surge no capô de um carro GNX, uma referência à capa do seu álbum mais recente. Pouco depois aparecem os dançarinos vestidos de azul, vermelho e branco, formando a bandeira americana quando Kendrick começou a cantar “Squabble Up”.
Além do ator, outra das convidados foi SZA, que se juntou ao artista para “Luther e “All the Stars”. O produtor Mustard também se juntou ao espetáculo, que contou com um total de 11 temas. O rapper da Califórnia já tinha participado no Super Bowl em 2022, mas dividiu o palco com outros artistas, como Dr. Dre, Snoop Dogg e Eminem.
A desavença entre Lamar e Drake
Uma “guerra civil do rap”. Foi assim que as revistas internacionais descreveram a disputa visceral entre os rappers Drake e Kendrick Lamar. A relação tensa entre ambos dura há vários anos, mas o conflito escalou em 2024.
Se no início a troca de galhardetes refletia apenas uma profunda inimizade, o tom mudou e passou a incluir acusações sérias. Tudo se acentuou com o lançamento, a 3 de maio, de “Family Matters”, na qual o canadiano ataca o rapper americano. Nem uma hora depois, Lamar puxa de “Meet the Grahams”, a “diss track” onde acusa o colega de profissão de ser um “pedófilo certificado”, ao passo que alega que o artista tem uma “filha secreta” que esconde dos fãs. O caos tomou conta do mundo da música.
A disputa entre Drake e Kendrick Lamar foi desencadeada (intencionalmente ou não) por J Cole, rapper de 39 anos que, entretanto, já se retratou por ter sido responsável pelo atear da chama. Em outubro de 2023, Drake lançou “For All The Dogs”. O oitavo álbum do artista canadiano conta com o tema “First Person Shooter”, feito em colaboração com J. Cole. Num dos versos, o último sugere que ele, Drake e Kendrick são os “três grandes” da cena atual do hip-hop.
“Adoro quando discutem quem é o MC que faz as rimas mais difíceis [os versos mais duros] / É K. Dot [Kendrick]? É Aubrey [Drake]? Nós somos os três grandes, criámos a nossa própria liga.”
O tema chegou ao topo da tabela de singles nos EUA imediatamente após o lançamento, tornando-se na 13.ª canção de Drake e na primeira de Cole a atingir o número um. A conquista elevou Drake ao patamar de Michael Jackson, o artista masculino que conquistou mais singles a solo ao longo da carreira.
Kendrick, o único do trio com um prémio Pulitzer no palmarés, não gostou de ter sido colocado no mesmo saco e respondeu à letra no álbum “We Don’t Trust You”, criado em colaboração com Metro Boomin’ e lançado em março.
Num dos versos não creditados (mas atribuído a Lamar) do tema “Like That” refere que “não existem três grandes, apenas um — e sou eu”. A afirmação poderia parecer uma simples divergência de opinião carregada de arrogância, contudo, o facto de integrar o álbum feito com o antigo produtor de Drake não foi inocente. Boomin’ colaborou com o artista no álbum “What A Time To Be Alive”, de 2015, mas a relação entre ambos azedou entretanto.
Aproveite e leia o artigo da NiT para saber tudo sobre a desavença entre Lamar e Drake.