Música

Quem são os portugueses que se tornaram virais a tocar os êxitos dos Linkin Park

São seis, moram em Lagos e viajam pelo mundo a tocar temas dos seus ídolos, sob o nome de Hybrid Theory, uma banda de tributo.
São iguaizinhos

Para Miguel Martins, fazer parta de uma banda bem-sucedida era cada vez mais uma miragem e por isso encarou o casting para um vocalista com alguma relutância. À habitual sala de ensaios chegou um rapaz chamado Ivo Rosário. Miguel conhecia-o há vários anos, trabalhava num bar de karaoke e era apaixonado por música. O nome apareceu numa pesquisa rápida por candidatos na lista de contactos do telemóvel e a audição foi agendada.

No dia, Ivo chegou com toda a confiança e atirou quatro temas para cima da mesa. “Quando ele disse que queria cantar a ‘Numb’ dos Linkin Park, começámo-nos a rir. Sim, sim, claro que sim”, recorda à NiT. Miguel estava de costas quando Ivo arrancou para a sua interpretação de Chester Bennington, o famoso vocalista da banda que morreu em 2017.

“Estava a olhar para o monitor do computador, a ouvir o som das colunas e quando ele começou a cantar ficámos todos parvos. ‘O que é isto? Isto é o Chester.’ Tive que olhar para trás para ver o que se passava. Era mesmo ele a cantar”, conta. “O mais curioso é que depois cantou Foo Fighters, Snow Patrol e Imagine Dragons e era como se estivéssemos a ouvir o Chester a cantar aquilo (risos).”

Aquilo que parecia óbvio, não aconteceu. A luz da lâmpada não se acendeu e não prometeram, ali naquele momento, formar uma banda de tributo. Miguel, de 38 anos, fez uma travessia no deserto durante dois anos, durante os quais nem sequer tocou na guitarra que o acompanhara durante toda a sua vida.

Desde então, muita coisa mudou. O ídolo da sua banda preferida morreu em circunstâncias trágicas, a guitarra voltou a seduzi-lo e hoje, Miguel é uma das estrelas dos vídeos virais dos Hybrid Theory, a banda portuguesa de tributo aos Linkin Park que tem corrido as redes sociais nacionais.

Além das versões imaculadas dos temas da banda norte-americana, impressiona também a semelhança dos portugueses com os membros originais, sobretudo Ivo, cuja voz tem provocado arrepios aos fãs.

“As nossas redes sociais costumam ter bastante movimento, mas rebentaram completamente nas últimas semanas”, explica à NiT Miguel, que encarna o papel de Brad Delson na banda, o guitarrista. Faz-se acompanhar de Ivo Rosário, 30, vocalista e sósia de Chester Bennington; Pedro Paixão, 37, vocalista e rapper como Mike Shinoda; Nuno Bernardo, 37, baixista; Diogo Neuparth, 33, baterista e Daniel Pimenta, o DJ de 39 anos.

Em Portugal, sentem que passaram sempre “por baixo do radar” desde que formaram a banda em 2017. Foi um percurso menos simples do que se poderia pensar.

Durante esses dois anos de pausa após o casting de Ivo, parte deste grupo de amigos de Lagos encontrava-se regularmente e à baila vinha sempre o tema da banda de tributo. “Andávamos a navegar na maionese. Acabávamos por falar na criação da banda, mas eu dizia sempre que era impossível. Explicava que para o fazermos, tinha que ser uma coisa muito boa, igual à original, e nós nunca iríamos consegui-lo. A conversa morria aí”, recorda.

Pessoalmente, Miguel também já tinha chegado ao limite. Estava cansado. “Comecei a tirar um curso, encostei a guitarra. Já chegava de música, sentia que já não tinha idade para isso, tinha que me fazer à vida. Já tinha aprendido a tocar, a gravar, estava fixe com a sensação de missão cumprida.”

O sonho de fazer música ia morrendo aos poucos. Decidiram então esvaziar a sala de ensaios e entregá-la ao senhorio. Reuniram-se uma última vez no espaço, antes de baixarem os braços, e voltou a falar-se da banda de tributo.

“Pensava sempre em terminar de vez, mas mordia-me a pensar que nunca tinha conseguido fazer nada com temas originais e, agora que tinha um tipo com um timbre igual ao do gajo dos Linkin Park, não consigo fazer sequer uma música com ele?”, conta.

Nessa mesma noite, agarrou-se ao computador e encontrou algumas faixas de estúdio da banda. Começou a editá-las, a separar instrumentos e ao fim de várias horas “tinha um set preparado de uma hora, pronto para usar em concerto”.

Pegou no telefone, contactou os amigos e decidiram começar a trabalhar. Colocou um anúncio à procura de um DJ e em duas semanas a banda estava formada. Mais duas semanas se passaram e já tinham um concerto marcado, mesmo estando completamente impreparados.

O espetáculo no Bafo de Baco, em Loulé, correu bem e foi apenas o primeiro de muitos concertos dados logo no primeiro ano. A maioria esgota e assim se atesta a fidelidade dos fãs que Linkin Park tem em Portugal — e no estrangeiro.

Os Linkin Park são, sem surpresas, a banda preferida de cada um dos seis elementos. Nem foi preciso adaptarem muito os looks para se assemelharem o mais possível ao grupo em palco.

“Ninguém está aqui a encarnar ninguém. Se forem aos nossos perfis no Facebook, estamos todos iguais”, explica Miguel, que ainda assim resolveu comprar um par de fones para replicar o estilo de Brad Delson.

Outra curiosidade bizarra: Miguel faz anos precisamente no mesmo dia que Delson. “O Pedro tem o cuidado de levar um chapéu, o Ivo leva uma camisola cava, mas ninguém vai comprar roupa de propósito para usar na banda”, explica.

O sucesso repentino apanhou a banda de surpresa. “Sempre pensei que íamos ser uma espécie de banda de covers que ia estar ali no palco a animar as pessoas enquanto elas bebem um copo. Achei que ia ser invisível. O Ivo teria, naturalmente, alguma exposição, mas o resto seria invisível. Só que não. Foi completamente o oposto.”

Os concertos estão quase sempre esgotados. No primeiro ano de vida, em 2017, deram mais de 30 espetáculos. O segundo foi ainda melhor e contavam que o terceiro ano fosse “explosivo”, mas foi um uma desilusão provocada pela pandemia.

Ainda assim, quebraram uma importante barreira antes dos confinamentos e internacionalizaram-se. Em 2018 fizeram uma pequena digressão pela Alemanha, ajudados por um amigo alemão que vive em Lagos.

Nas redes sociais, o algoritmo ia fazendo o seu trabalho, até que um dos vídeos das suas rendições dos temas de Linkin Park chegou ao outro lado do mundo. Foram então convidados para fazerem uma digressão na Austrália, aonde deverão regressar em novembro para seis espetáculos, isto depois de passagens por Estónia, Letónia, Lituânia, Hungria e Polónia.

O sucesso ainda não lhes permite dedicarem-se a tempo inteiro à banda. Apenas Miguel e Diogo o fazem, enquanto ainda esperam por “um maior reconhecimento” em Portugal. “Lá fora sentimos que reconhecem mais o trabalho, há mais carinho”, nota Miguel, que ressalva que os vídeos virais das últimas semanas ajudaram a desbravar caminho por cá.

“Já começámos a receber imensas propostas. Gostávamos de ter oportunidade de subir a um palco a sério, num grande festival, acho que ainda não conseguimos mostrar o que valemos”, nota.

Para toda esta atenção contribui, claro, a “enorme legião de fãs” da banda. “Nem nós tínhamos a noção”, explica Miguel, que aplaude a forma como a banda criou embaixadores em cada país para potenciar a marca, ainda que os mais puristas afirmem que “o original é que é”. Mesmo assim, os seus espetáculos estão à pinha.

“As músicas dos Linkin Park são demasiado boas para viverem o resto da sua vida num CD. Têm que ser tocadas ao vivo e é isso que nos move”, conclui.

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