Teatro e exposições

Atriz trans que invadiu o palco do São Luíz está desaparecida há dois dias

A ativista brasileira tem recebido várias ameaças de morte. Foi vista pela última vez na sexta-feira, 27 de janeiro.
Está desaparecida há 48 horas.

Keyla Brasil, a atriz trans e performer travesti que invadiu o palco, semi nua, em protesto contra o “transfake” no Teatro São Luíz, em Lisboa, está desaparecida há 48 horas, após ter recebido várias ameaças de morte. Foi vista pela última vez na passada sexta-feira, 27 de janeiro, em Tábua, perto de Coimbra, quando estava a preparar-se para regressar a Lisboa, avança o jornal “Expresso”.

Os amigos lançaram apelos nas redes sociais e estão neste momento à procura da atriz, que permanece incontactável desde as 16 horas de sexta-feira. Entretanto, já houve rumores de que Keyla Brasil tivesse sido encontrada, mas a Casa T, instituição que dá abrigo a pessoas trans imigrantes e onde a atriz tem vivido, desmentiu essas informações.

“Assim que tivermos notícias da Keyla iremos repassar, mas por enquanto continuamos à procura dela”, escreveram nas redes sociais.

Segundo os amigos da atriz, Keyla Brasil tem recebido “muitas ameaças, cada vez mais agressivas, incluindo ameaças de morte” desde a invasão à peça de teatro “Tudo Sobre a Minha Mãe”, no dia 19 de janeiro. Acreditam que essa terá sido a razão que a levou a sair de Lisboa e viajar para a zona centro do País.

A última publicação da atriz nas redes sociais foi precisamente na sexta-feira, onde assumiu estar longe, “nas montanhas”, mas sem especificar o local.

O polémico protesto de Keyla Brasil

A manifestação da brasileira conteceu na noite de quinta-feira, 19 de janeiro, e o vídeo tem sido amplamente divulgado nas redes sociais. Durante uma apresentação da peça de teatro “Tudo Sobre a Minha Mãe”, no Teatro São Luiz, em Lisboa, a atriz trans e performer travesti Keyla Brasil invadiu o palco, semi nua, em protesto contra o “transfake”.

Keyla interrompeu o espetáculo e defendeu que o ator André Patrício não deveria poder interpretar uma personagem trans por ser cisgénero. “Transfake! Desce do palco! Tenha respeito por este lugar”, pediu. Imediatamente, a produção baixou a cortina, cobrindo os atores, mas a ativista manteve-se no palco a discursar para a plateia.

“Gente, boa noite, Chamo-me Keyla Brasil. Sou atriz, sou prostituta”, disse, enquanto alertava para a falta de oportunidades em Portugal para as pessoas trans. “O que está a acontecer agora é um assassinato e um apagamento das identidades travesti. Se contrataram quatro mulheres e três homens, porque é que não contrataram duas pessoas trans para fazer a personagem? Sabem porque é que eu trabalho como prostituta como [as personagens] Agrado e Lola? Porque não temos espaço para estarmos aqui neste palco. Neste lugar sagrado.” No final, pediu a André Patrício para que não voltasse àquele lugar.

Depois das declarações de Keyla Brasil, ouviram-se aplausos no público. A atriz Maria João Luís dirigiu-se à artista: “Estamos aqui a fazer um espetáculo que defende a vossa luta”. Keyla Brasil não concordou: “Não defende, estão excluindo”.

Gaya de Medeiros veio depois à boca de palco elogiar o gesto de Keyla Brasil. “Quero que vocês entendam com generosidade, de coração. A liberdade de uma não será a liberdade de todas. Eu sou apenas um começo. Isto aqui não está como deveria estar. Mas acho que hoje este ato da Keyla Brasil, uma artista que está na prostituição, deve entrar na história de Portugal, para que se entenda a importância destes corpos ocuparem estes espaços para contarem as suas histórias. Isto não é contra o ator e o diretor. Isto é contra uma denúncia histórica. Que andamos a fazer há muitos anos.”

A companhia que encenou “Tudo Sobre a Minha Mãe”, Teatro do Vão, reagiu nas redes sociais ao sucedido e mostrou-se solidária com a luta de Keyla Brasil. “Assumindo que podíamos ter feito outra opção, que deveríamos ter feito outra opção, no que respeita à inclusão de pessoas trans em ‘Tudo Sobre a Minha Mãe’, uma vez que demos o papel de Agrado a uma mulher trans, pela primeira vez no mundo, mas não o fizemos em relação à personagem Lola.

Percebemos, acreditamos e estamos solidários com a luta trans, sempre estivemos. Apesar do nosso esforço, não foi suficiente, e lamentamos. Com este processo aprendemos e crescemos, e olharemos o futuro de forma diferente. Não somos inimigos, somos aliados, sempre disponíveis para o diálogo.”

Entretanto, o Teatro São Luiz anunciou a substituição de André Patrício. “No seguimento de vários atos de contestação pela representação de uma personagem trans por um ator cis e pela criação de condições de acesso e representatividade para pessoas trans, o Teatro do Vão decidiu alterar o elenco (…), integrando a atriz trans Maria João Vaz na interpretação da personagem Lola.”

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