Numa tarde fria e de chuva de novembro, Inês Lusio juntou cerca de 40 mulheres, com idades entre os oito meses e os 60 anos, numa sessão fotográfica que revelou ser transformadora para todas elas. O objetivo era simples: mostrar que não estão sozinhas num mundo que, muitas vezes, parece estar contra elas.
A iniciativa, revelam as participantes, foi “comovente”. “Ser mulher é viver num mundo que constantemente te diz quem deves ser. Desde o momento em que tomamos consciência de nós mesmas, é-nos entregue um guião: sê gentil, mas assertiva; bonita, mas sem vaidade; ambiciosa, mas nunca intimidante. É um malabarismo de padrões impossíveis, uma dança de ‘deves’ e ‘não deves’ que deixa pouco espaço para simplesmente sermos”, diz Gintautė Kisieliūtė, uma das convidadas.
Inês, de 22 anos, trabalha como freelancer na área criativa com tudo o que envolve imagem e redes sociais. A fotografia surgiu como um hobby, mas rapidamente se tornou em algo mais sério. O projeto chamado “My Body, My Choice” vai estar em exposição em janeiro de 2025 e trata-se de uma iniciativa criada unicamente pela jovem natural da Ericeira.
Através das fotos, pretende mostrar que “as mulheres são mais fortes juntas” e que “não estão sozinhas”. As imagens podem ser interpretadas de infinitas maneiras, mas tocam em tópicos como o direito ao abordo e as diferenças de salário. “Cada um tira a sua interpretação. Não precisámos de palavras para passar a mensagem”, conta à NiT.
A inspiração surgiu sobretudo nas redes sociais, nos relatos de mulheres de todo o mundo que a revoltavam. “Vi histórias de mães que não podem falar com as próprias filhas. Cada país tem as suas regras e claro que temos de as respeitar, mas isso deixa-me revoltada”, lamenta. Como não pode fazer para mudar os costumes enraizados na sociedade, quis criar a exposição para que, pelo menos, as pessoas falassem sobre esses tópicos que a atormentam.
Também é, claro, uma questão bastante pessoal para Inês, que já diz sentir na pele o que é ser uma mulher nos dias de hoje. Sente que há sempre um peso de alcançar uma perfeição que não existe, como “ser a filha ideal, esposa perfeita para um homem e ter um bom cargo profissional.”
Confessa-se tímida, o que provoca inúmeros pedidos para que “fale mais”. Quanto isso acontece, “dizem que [a mulher] faz muito barulho”. “Qual é o equilíbrio e o meio-termo? Se é muito inteligente, é aborrecida. Se não souber muito, é inculta. Tentamos alcançar algo inalcançável porque nunca somos suficientes.” Depois também há o problema do assédio, que é transversal, independentemente das idades.
Quando estava a fotografar as convidadas, que descobriram o projeto através de grupos de Facebook onde Inês o partilhou, também percebeu que, depois de serem mães, muitas são vistas como sendo apenas isso e, aos olhos dos outros, perdem a sua própria identidade. “Deixa de haver interesse em conhecê-las só porque são mães.”
Cada uma delas tinha histórias de vidas diferentes, traumas e receios. Inês recorda-se de ter uma conversa com uma participante que estava com medo porque o vestido mostrava muito do seu corpo. Outra, estava revoltada com o salário que recebia, apesar de ter as mesmas qualificações e cargo que outros homens. “Cada uma de nós trouxe a sua história.”
O “My Body, My Choice” demorou cerca de duas semanas até estar terminado. As roupas foram escolhidas pela criadora da iniciativa, que também teve de tratar da logística de transportes e arranjar parcerias, como floristas. A 20 de novembro decorreu a aguardada sessão fotográfica.
“Foi realmente transformador para mim e para toda a gente que lá esteve. Sem nos conhecermos e falarmos, sentimos que tínhamos muito em comum. Agora sinto-me mais completa e a minha atitude no dia a dia mudou. Já consigo pôr outro tipo de limites e fazer-me mais respeitada desde esse dia.”
Inês partilhou as fotografias em exclusivo com a NiT. Em janeiro de 2025, vão estar em mostra na Ericeira, a sua terra natal. Carregue na galeria e veja as imagens.