Durante os anos de secundário, sentiu-se quase sempre como “uma outsider”, presa entre disciplinas escolares que pouco ou nada lhe diziam. Confusa, acabou por mergulhar numa depressão, até finalmente se libertar e agarrar aquilo que a fazia feliz, a arte.
Aos 24 anos, Joana Miriam — nome artístico, FK — define-se como uma artista eclética: adora fotografia, pintura, vídeo e tenta combinar tudo em projetos conceptuais. Foi graças a eles que chegou até aqui, como uma das dez finalistas da quarta edição do New Talent, o concurso promovido pela NiT, TVI e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa para eleger os melhores jovens talentos de Portugal na área do lifestyle. No final, o vencedor irá receber 10 mil euros para desenvolver um projeto pessoal ao longo do próximo ano.
Nasceu em Setúbal e cresceu no Montijo, onde sentia que “pouco ou nada acontecia”. “Sonhei sempre em pintar, em ser artista. Pintava as paredes de casa, a minha mãe passava-se”, recorda. “Tinha um diário gráfico, estava sempre a desenhar.”
Os colegas repararam no talento e, entre pedidos de desenhos e pinturas, começou a fazer os primeiros trabalhos pagos. Aos 16 anos, já fazia telas por encomenda. “20 euros, naquela idade, já era muito bom. Foi a minha primeira fonte de rendimento e a primeira vez que pensei que poderia tornar-se num trabalho.”
Em casa, entre a família, encontrou menos compreensão. “Os meus pais tentaram convencer-me a seguir ciências no secundário. Houve ali uma altura em que ainda pensei ser bióloga marinha. Também gostava muito de psicologia, das áreas de estudo da mente.”
Foi isso que aconteceu. Forçada a seguir o caminho das ciências, sentiu-se infeliz. “Foi horrível. Odiei tudo.”
“Comecei a ter ataques de pânico, nem sabia bem o que era. Foi uma altura super complexa para mim, não percebia nada do que se passava”, explica. “Hoje já tenho os mecanismos e ferramentas para gerir isso. Na altura, gostava de ter sabido que era algo normal, que é normal ter acompanhamento psicológico, estejamos bem ou mal. É importante.”
Foi também aí que percebeu que a saúde mental era um tema importante, para si e para os que a rodeiam. Mas antes, havia que encontrar o caminho certo.
Apesar da má experiência, continuo a tentar encontrar um compromisso. Não conseguiu entrar em Belas Artes e acabou por fazer licenciatura em marketing e publicidade. Ainda não era o que queria, mas foi o que lhe permitiu “abrir a porta para o meio criativo”.
Quando entrou no IADE, descobriu que aquele era o seu meio. “Via pessoas a pintar no corredor, já não era eu que era a outsider. Era tudo gente como eu”, confessa. Enquanto navegava pelo curso de marketing, foi tirando proveito de tudo o que a faculdade oferecia, dos estúdios e ateliês.
“Comecei a fotografar, todas as semanas reservava tempo no estúdio de fotografia e, mesmo não tendo aulas, tentava aprender sozinha. Em pouco tempo, já revelava as fotografias”, recorda. Assim que acabou o curso, atirou-se para uma formação em audiovisual e multimédia.
Mergulhou tarde na formação em artes e aproveitou para compensar o tempo. “Estava à descoberta e ainda estou”, nota. “Tenho um estilo abstrato, porque gosto do vídeo, da pintura, da fotografia. Gosto de misturar tudo em composições visuais que façam sentido.”
Uma delas chama-se “Córtex”, a curta-metragem e um projeto transmedia que fez no final do mestrado. “Era um projeto de mestrado, o que significa que não temos necessariamente que o executar, mas pensei que se ia fazer uma tese a dizer que fazia isto e aquilo, então ia mesmo fazê-lo.”
Naturalmente, o tema da saúde mental estava presente. “Senti que era oportunidade perfeita para conjugar tudo o que gostava, fotografia, vídeo, design. Fiz um site e uma curta”, conta. “Quis falar sobre saúde mental
Teve 17 valores, o projeto foi elogiado e ambicionava levá-lo a concursos. Acabou por não o fazer. Sentia que ainda faltava aprimorar o filme.
“Foi a primeira vez que fiz algo do género. Fiz tudo sozinha. É o trabalho de que mais me orgulho, porque tive a oportunidade de criar tudo por mim própria, mesmo não tendo todos os meios que queria.”
O trabalho como artista continua a não pagar as contas e, por isso, o seu dia é passado a fazer design social, ligado a projetos contra a homofobia, racismo e machismo. “Também gosto do que faço. Mostra que a arte não tem que ser linda e maravilhosa, pode ser desconfortável. Isso atrai-me”, diz, antes de confessar que apesar de tirar algum prazer, gostava mesmo era de poder revelar mais de si através da arte.
É aqui que entra a oportunidade de ganhar os dez mil euros de prémio do concurso. Tornaria real a possibilidade de se dedicar aos seus projetos e revisitar a curta-metragem “Cortex”.
“Sinto que poderia melhorar tanta coisa. Toquei na dependência das drogas, nos distúrbios alimentares, na rotina, mas havia tanta coisa que podia tocar. Precisava de material, câmaras, uma equipa. Quero fazer aquilo como deve ser e o prémio daria uma força para o concretizar.”