LET'S ROCKQuando era miúdo, Tomás João, mais conhecido como Nature the Artist, desenhava nas mesas e cadeiras da escola para escapar ao tédio das aulas. Os rabiscos pareciam não ter grande sentido, mas, ao entrar na escola António Arroio, em Lisboa, percebeu que tinham sido o início do seu percurso artístico.
O que começou como distração evoluiu para peças de arte que hoje valem centenas de euros. O artista de 31 anos, natural de Carcavelos, apresenta esta quarta-feira, 29 de outubro, o projeto “Your Decision”, uma edição limitada desenvolvida em parceria com a Underdogs — e com Bordalo II — que propõe uma decisão invulgar ao público: preservar uma escultura ou destruí-la em busca de um segredo.
Na galeria estarão disponíveis 50 esculturas, cada uma à venda por 375€. No interior, 49 contêm um pequeno fóssil. Uma delas esconde uma obra original de Bordalo II, avaliada entre nove mil e dez mil euros. “Cada pessoa que recebe esta peça tem de tomar uma decisão: vale a pena partir e tentar descobrir se existe algo mais valioso lá dentro ou mantê-la intacta?”, conta à NiT.
Mais do que um objeto, é uma experiência social que testa o comportamento de quem a adquire. “Costumo dizer que esta peça não é feita por mim — a pessoa que a recebe é quem decide como a obra acaba. Sou apenas um coautor.”
A ideia surgiu durante um dos muitos retiros que faz na natureza, entre caminhadas, tendas e mergulhos. É nesses momentos que reflete sobre o que tem valor. “O dinheiro ali não tem valor porque não o posso usar em lado nenhum. Mas quando venho para a cidade e estou rodeado de outras pessoas, parece que o dinheiro é o que mais valorizamos.”
A colaboração com Bordalo II nasceu de forma natural e também estratégica. Aceitou o convite e criou uma obra específica para integrar este projeto. A peça foi desenhada de forma a encaixar na série de Bordalo dedicada a animais feitos com desperdícios. “É das peças que mais o representam e, por consequência, a que tem mais valor no mercado. Por isso decidimos fazer um animal que se enquadrasse dentro das medidas do fóssil”, explica.
Quem optar por partir a escultura e não encontrar a obra valiosa encontrará um certificado de destruição, com espaço para o “executador” assinar, e um pequeno fóssil. Nature recusa revelar o que está dentro. “Quem quiser saber o que é, terá de destruir o fóssil maior”, afirma.
Ver esta publicação no Instagram
Os fósseis tornaram-se imagem de marca de Tomás João, que se licencou n Escola Superior de Arte e Design das Caldas da Rainha, cidade que considera fundamental para a sua formação. “Sair do centro de Lisboa para ir para algo mais rural mudou a minha perspetiva sobre o que podia fazer com a arte. Comecei a olhar para a natureza como fonte de inspiração e mais protagonista do que era antes. Antes estava mais ligado ao graffiti e à cultura urbana”, recorda.
Desde então, tem criado experiências imersivas com abordagens provocatórias. Estreou-se com exposições em Lisboa em 2022, e já passou por Paris e Londres. Em 2024, apresentou na capital britânica uma mostra a solo numa sala totalmente escura, com favos de mel espalhados. O público entrava com lanternas e trabalhava em pares. “Um iluminava a colmeia pela retaguarda e só assim era possível ver as imagens lá dentro. Era uma simulação do comportamento das abelhas, que trabalham juntas com o que têm para atingir um resultado.”
Depois dessa experiência, esteve em Timor, onde criou fósseis com os habitantes locais. Esse trabalho inspirou diretamente o conceito de “Your Decision”. A edição limitada ficará disponível na loja da Underdogs. Em breve, será também inaugurada uma mostra dedicada ao projeto.
Quanto ao futuro, Nature garante que vai continuar a explorar conceitos interativos. “Este ano ainda tenho mais duas ou três ideias preparadas — não em edições especiais, mas também interativas”, diz.
Artigos relacionados
