Ana Maria Jeremias foi obrigada a trocar Angola, país onde nasceu, por Portugal, quando tinha nove anos. A promessa de uma educação melhor transformou-se num percurso de trabalhos domésticos, onde acabou por ser explorada, como muitas mulheres com histórias semelhantes. Passou a vida a limpar e, quando a fotógrafa portuguesa Maria Abranches conheceu a sua história, quis imortalizá-la em imagens.
A narrativa visual acabou por valer à fotógrafa uma distinção no World Press Photo 2025, o maior concurso de fotojornalismo do mundo. Na 68.ª edição, “Maria” venceu um dos três prémios na categoria “Histórias”, da região Europa.
A imagem “conta uma história comum a inúmeras mulheres, cujo contributo silencioso construiu, moldou e sustenta o mundo como o conhecemos”, explicou a artista freelancer, na sua página de Instagram, sobre um projeto que o júri considerou “comovente e profundamente complexo”.
Maria Abranches trabalha como fotógrafa documental independente e dedica-se a utilizar a imagem para dar palco a vozes marginalizadas. Uma delas foi precisamente a de Ana Maria Jeremias, há 40 anos em Portugal. A imagem de um dos poucos momentos de descanso na vida desta mulher, resultou naquela que foi a imagem mais divulgada do projeto.
A lente da fotógrafa apanhou também a protagonista em diferentes momentos do quotidiano, como a apanhar os transportes de madrugada, nas suas viagens entre Rio de Mouro, onde vive, e Lisboa, por exemplo.
Ao todo, foram distinguidos 42 trabalhos, selecionados a partir de quase 60 mil candidaturas. Os vencedores foram escolhidos entre 3778 fotógrafos de 171 países. A entrada de prémios está marcada para 17 de abril, data em que será anunciada a Fotografia do Ano.
No caso de Abranches, “a fotógrafa conseguiu conectar-se com o seu modelo de forma respeitosa, registando diferentes momentos do seu quotidiano”, pode ler-se no site do World Press Photo.
“Através destes enquadramentos intimistas, a fotógrafa destaca detalhes reveladores — lembretes simbólicos das consequências persistentes do passado colonial de Portugal. A obra desperta a reflexão sobre a forma como esta história continua a moldar as estruturas sociais de hoje”, acrescenta a organização.
“As imagens premiadas são de luta e desafio, mas também de ligação humana e coragem — um trabalho visualmente impressionante que nos leva mais profundamente às histórias por detrás das notícias”, refere a diretora de fotografia do “Le Monde” e presidente do júri global do Concurso de 2025, Lucy Conticello.
Maria Abranches faz agora parte da lista de fotojornalistas portugueses que já foram distinguidos no World Press Photo, ao lado de nomes como Eduardo Gageiro, Pedro Barreira, Daniel Rodrigues e Mário Cruz.
O World Press Photo é um dos mais célebres e reputados concursos de fotografia do mundo. F criado em 1955, pela organização homónima, com o objetivo de premiar, anualmente, os fotógrafos profissionais pelas imagens que dão a conhecer ao público. Todas elas representam momentos impactantes que marcaram a atualidade, à escala global, no ano anterior.
