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Edmundo Inácio: “As pessoas insistiram para que eu me inscrevesse no Festival da Canção”

A NiT falou com o músico que se destacou no “The Voice” e que agora tem um dos temas mais populares do concurso da RTP.
Edmundo Inácio tem 23 anos.

Foi a 19 de janeiro que a RTP divulgou os temas que este ano vão concorrer ao Festival da Canção. Desde então, duas faixas têm-se destacado particularmente das outras, estando a disputar a liderança no número de visualizações no YouTube. São elas “Ai Coração”, de Mimicat (atualmente com 155 mil visualizações); e “A Festa”, de Edmundo Inácio (153 mil visualizações).

Edmundo Inácio deu-se a conhecer entre o final de 2021 e o início de 2022 no “The Voice Portugal”. Deu nas vistas sobretudo pelas suas versões originais de músicas portuguesas conhecidas, demonstrando um talento apurado e uma capacidade autoral acima da média. Inscreveu-se a si próprio no concurso. Agora pode muito bem ser um dos favoritos à vitória no Festival da Canção, embora sublinhe que “tudo pode acontecer”. 

O Festival da Canção vai ter duas semifinais, marcadas para 25 de fevereiro e 4 de março — já a final está agendada para 11 de março. Os eventos vão acontecer nos próprios estúdios da RTP. O tema vencedor irá representar Portugal na Eurovisão, que vai acontecer em Liverpool, no Reino Unido. As semifinais acontecem a 9 e 11 de maio, enquanto a final acontece no dia 13. 

Edmundo Inácio atua na segunda semifinal. Leia a entrevista da NiT com o músico de 23 anos natural de Portimão.

Como surgiu a oportunidade ou vontade de participar nesta edição do Festival da Canção?
Tive muita vontade de participar logo após o “The Voice”. Durante o “The Voice” eu recebia mensagens todas as semanas, muito mais a falar da possibilidade de eu me inscrever no Festival da Canção do que acerca do “The Voice”. As pessoas insistiam bastante para que eu me inscrevesse. A minha família e alguns amigos também me falaram disso. E eu já gostava que isto acontecesse — não sabia é se seria logo a seguir ao “The Voice”. A vontade acabou por crescer em conjunto com isto tudo e depois submeti a canção.

Compôs “A Festa” especificamente para o festival?
Não, mas a inspiração foi semelhante, tendo em conta o significado da canção. Tentando não desvendar demasiado para não estragar a experiência a quem interpreta, há duas inspirações para a canção. Uma é a questão de marginalizar as pessoas na sociedade de hoje em dia, de serem colocadas fora do bolo a que todos deveríamos pertencer; e isto também acontece a novos profissionais que chegam a uma indústria. Seja qual for. Já tive contacto com outra indústria, que é a da minha formação, o cinema, e via colegas meus a também terem várias dificuldades a entrar — e quando entravam não era sempre como desejávamos. Isto acontece com todos nós, seja profissional ou socialmente. Mas não foi feita especificamente para o festival, até porque na altura em que estava a tentar compor uma canção a pensar só no festival… Tinha uma ideia um bocadinho diferente daquilo que queria levar. Mas andava em estúdio com o [produtor] Left e ele disse “mas isto é uma boa canção para o festival, porque é que não a levas?” Na primeira vez ouvi com aquele ouvido de mercador, de quem não quer ouvir porque não era bem isso que se queria, mas realmente no caminho para casa, a ouvir a canção no carro, numa primeira versão que se tinha feito em estúdio, comecei a perceber que poderia ser uma boa canção. De alguma forma tinha uma linguagem do Festival da Canção e da Eurovisão. E foi assim, foi crescendo. A opinião das pessoas, sobretudo do Left, ajudou a que esta canção fosse a escolhida. Por coincidência, parece que encaixou bem.

Quanto tempo demorou entre submeter a canção e saber que ela tinha sido escolhida?
Não me recordo ao certo, acho que foi cerca de um mês e meio. Eu submeti mesmo no penúltimo dia de inscrições e depois, passado um ou dois dias da data prevista, recebi a chamada do Nuno Galopim. Obviamente, fiquei muito feliz e acabei em lágrimas, comovido, em chamada com a minha mãe, a dar-lhe a novidade. 

Estava confiante, durante esse mês de espera?
Tinha sempre alguma esperança por a canção ter algo de diferente do que é apresentado normalmente. E por ser muito “eu”, acho que a canção representa muito bem aquilo que representei durante o “The Voice” e o que quero representar nas canções originais. E tinha alguma esperança que isso acontecesse e sentia que era a altura certa para participar no Festival da Canção. Muitas pessoas até comentavam nos posts da RTP que o Edmundo deveria ser convidado [risos]. Por isso só faltava saber se havia o voto de confiança da RTP.

E pelos vistos houve. Essa questão de as pessoas o identificarem de imediato como um bom candidato ao Festival da Canção… O “The Voice” é um programa de covers, enquanto o Festival da Canção é um concurso para artistas de originais. Queria dizer que as pessoas o reconheciam logo como um artista mais original e autoral…
Sim, acredito que sim. E também sentia que as pessoas tinham vontade de ouvir mais, tinham uma sede além do “The Voice” de ouvir o que é que vinha daí. Que eu, de alguma forma, não terminasse com tudo o que tinha feito ali no “The Voice”. Sentia muito que as pessoas queriam mais. E nada melhor do que estrear um single no Festival, não é? Acho que as pessoas viram a minha originalidade como intérprete e adaptador de músicas. Fiz sempre versões muito diferentes das originais, e senti que as pessoas queriam ouvir um original, porque já tinham visto uma pequena amostra do que eu conseguiria fazer.

Agora que a canção está cá fora, tem sido uma das mais populares em termos de números no YouTube…
O que não quer dizer nada…

Não quer dizer que seja favorito, mas é um fator. Como é que encara isso?
Obviamente que fico muito feliz e grato pelo amor que recebo todos os dias. Há pessoas que não me conheciam, nem do “The Voice”, e descobriram e ficaram impressionadas e tiram um pouco do seu tempo para me enviarem uma mensagem a parabenizar-me. Fico feliz que esteja com um bom número de visualizações. Acho que estou em primeiro ou em segundo lugar no YouTube, tenho estado em disputa com algumas canções, que é o normal. No Spotify isso não se reflete tanto, mas compreendo, porque não tinha lançado nenhum original nem tenho uma base de fãs. Mas olho para isto da mesma forma como olho para o “The Voice”. Todas as semanas estava em primeiro lugar e acabei em quarto. Não reflete exatamente o que pode ou não acontecer. Tenho de olhar para isto com tranquilidade e que, de alguma forma, isto me dê coragem e entusiasmo para ir à semifinal e chegar o mais longe possível.

Faltam algumas semanas. Como é que tem sido a preparação? Em que fase está?
Tenho estado a praticar a canção e a interpretação toda já há bastante tempo. Mas admito que, agora, já estou um bocadinho mais ansioso do que o normal. Faz parte. Mas nada que comprometa o meu dia a dia nem vai comprometer a atuação. Mas é normal, é uma pressão, é o Festival da Canção. Por isso, é normal eu acordar às cinco da manhã a pensar que tenho coisas para fazer, e depois perceber que tenho de dormir pelo menos mais três horas… 

Sente que a experiência no “The Voice” foi útil para esta participação no Festival da Canção?
Sim, sem dúvida. O “The Voice” fez-me acelerar muito o ritmo de trabalho e a forma como organizava o meu tempo. Não quer dizer que seja a pessoa mais organizada de sempre. E para um artista também é difícil porque os dias são sempre diferentes. Mas o “The Voice” deu-me uma ótima base para esta fase e também para o que virá além do Festival da Canção.

Sei que não pode desvendar muito sobre a performance. Mas vai estar sozinho em palco, terá uma componente cénica especial, existe algo que possa adiantar?
Não vou estar sozinho em palco, isso é garantido. E o alaúde, o instrumento inicial, também vai estar presente. Mais que isto também era abrir o presente antes do tempo [risos].

Suponho que esteja expectante, mas, apesar de ter uma das músicas mais ouvidas neste momento, não quer dar a coisa por garantida…
Não, dar tudo por garantido é o pior erro. E isso também faz com que desaceleremos no ritmo de trabalho e no entusiasmo. Nada está garantido. Os números podem refletir-se ou não. Só depende do nosso trabalho e, neste formato, não é só a canção, muitas das vezes. É toda uma interpretação, tudo o que se veja que seja cénico, ou o próprio artista que cativa as pessoas… Tudo pode acontecer.

No caso do “The Voice”, como os concorrentes são desconhecidos do público, estão num certo pé de igualdade. No Festival da Canção, há artistas com mais ou menos anos de carreira, mas são músicos com os seus percursos, que as pessoas conhecem mais ou menos, consoante os casos, e que têm os seus nichos ou são mais abrangentes. Mas como os últimos anos provaram, muitas das vezes alguns dos artistas mais populares acabaram por não chegar tão longe nem se sagraram vencedores. Acredita que tudo depende da canção e da sua interpretação?
Sim, é a questão do “tudo pode acontecer”. Não temos visto todos os anos nomes com muito peso na indústria portuguesa a representar Portugal. Há um caso ou outro. Tanto as pessoas com uma boa base de fãs podem representar Portugal, como não. É muito complicado porque é daquelas coisas que não se podem prever. Há que haver confiança, mesmo dos artistas supostamente mais pequenos, que não tenham tanto espaço na indústria neste momento. Acho que têm de estar confiantes do seu potencial e do que vão fazer. É assim que olho para mim, para a forma como vou subir a palco e de como também vejo a vida. Sei das minhas qualidades, sei dos meus defeitos, agora há que trabalhar sobre isso e dar o melhor de mim em cima do palco. E veremos. Até o artista que neste momento tem menos visualizações pode ir representar Portugal… É mesmo um programa televisivo muito complicado de prever.

Olhando para os outros concorrentes, tem músicas favoritas?
Sim, obviamente. Mas este ano é um festival mesmo muito difícil. Há muita qualidade. Sinto que todos têm qualidade no seu espaço, cada um com o que quer representar… Também não sei o que é que vão trazer para cima do palco, não é? Podem cantar sozinhos, podem ter bailarinas, podem ter tudo e mais alguma coisa. Mas há canções que preenchem muito mais o meu gosto: Bandua, Mimicat, Cláudia Pascoal, entre outras. O Ivandro também. Apesar de não ser muito o meu estilo musical, tem uma canção que também me toca. Mas há muitas. A Inês Apenas…

Tem acompanhado bastante as últimas edições do Festival da Canção?
Sim, tanto o “The Voice” como o Festival da Canção, sempre foram programas que acompanhei. Até porque gosto muito de música e acho que a forma como é feito respeita principalmente o artista — e acho que é importante. Claro que, depois, o público é que faz a diferença. E aí entra a questão do que é ou não é justo. Mas isto depende dos votos. Acho que desde 2008, 2009 ou 2010 que acompanho, tanto o Festival da Canção como a Eurovisão. 

Estava a comentar há pouco as características que este tema pode ter para se enquadrar bem no Festival da Canção e, depois, na Eurovisão. Que características é que são mais importantes?
Uma das coisas de que gosto muito, e que estou a fazer no álbum, é escrever letras em duplo sentido. Conto duas histórias em simultâneo. Isto é o que os nossos artistas, que foram génios da sua geração, faziam na sua música de intervenção. Acho que esta traz um bocadinho essa linguagem, mas é uma intervenção moderna. Acho interessante e tem a ver com a linguagem do festival. Pelo menos foi isto que mais me marcou. Um espaço onde os artistas, de forma inteligente, traziam as suas mensagens. Como o exemplo da “Tourada”, do Fernando Tordo. E depois traz uma musicalidade não tão convencional, com uma mistura de várias influências que para mim fazem sentido e que me representam. Principalmente as inspirações árabes. Há muita gente que não sabe, mas o nosso fado também vem de inspiração árabe. Como o flamenco. E outros países bebem do mesmo sítio, portanto existem algumas semelhanças na música. 

Tinha dito que esta canção também acaba por representar aquilo que queria dizer e fazer. Acima de tudo, o que é que pretende representar em palco, com a sua interpretação, com esta música?
A performance em si será uma mistura de muita coisa que estudei. Fiz produção de media, cinema, e vai refletir o que aprendi fora da música. A minha interpretação vocal, e de alguma forma física e performática, será um pouco a do Edmundo que se viu no “The Voice” — mas respeitando a musicalidade desta canção. A nível de letra é sobre alguém que entra num local a que também sente que tem direito. Mas nem sempre é tão agradável quanto aquilo que se imaginava. E tem que se lutar bastante para que a nossa mensagem chegue a alguém. É isso que quero trazer para esta canção: mensagem. E a pergunta que deixo em aberto é: se na verdade esta festa que vivemos é uma festa ou uma luta de poder…

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