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Entre a heroína e o negacionismo: a vida recheada de polémicas de Russell Brand

Acusado por várias mulheres de agressão sexual, o comediante tem visto a sua biografia vasculhada. Controvérsia não falta.

Não há conversa que, por estes dias, não vá parar a Russel Brand, o comediante, ator e apresentador acusado de violação, agressões sexuais e abuso emocional a quatro mulheres. No sábado, 16 de setembro, uma investigação conjunta entre “The Times”, o “The Sunday Times” e o “Dispatches” do Channel 4, revelou as acusações que pendem sobre Brand.

As alegadas agressões terão ocorrido no auge da fama do britânico de 48 anos, entre 2006 e 2013, enquanto era apresentador na BBC Radio 2 e no Channel 4. Entre elas, estará uma agressão a uma jovem de 16 anos.
Brand prontamente gravou e partilhou um vídeo sobre as “muito graves acusações criminais” relacionadas com o seu “passado promíscuo”.Desde a publicação do artigo inicial, o “The Times” revelou que “várias mulheres” apresentaram novas acusações contra Brand, bem como uma nova “denúncia de agressão sexual” que remonta a 2003.

O próprio primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, comentou o caso através do seu porta-voz oficial e considerou as acusações “muito graves e preocupantes”. A Banijay, que agora detém a Endemol, a empresa de media que anteriormente contratou Brand, a BBC e o Channel 4 também iniciaram investigações sobre as acusações. Estas duas últimas estações retiraram inclusivamente vários programas com Russell Brand dos seus serviços de streaming por considerarem tratar-se de conteúdo “completamente inaceitável”. O diretor-geral da BBC anunciou que a passagem de Brand pela empresa será revisitada e analisada ao detalhe.

O comediante começa também a ter dificuldades em prosseguir a sua carreira. Os promotores do seu espetáculo de stand-up cancelaram todas as atuações nos próximos dez dias, enquanto a editora anunciou que iria suspender todos os projetos futuros. Brand também não apareceu no seu habitual programa ao vivo na plataforma Rumble, marcado para segunda-feira.

A verdade é que o britânico é sempre foi uma figura controversa desde as primeiras aparições, quando começou imediatamente a abrir caminho para a fama numa competição para novos humoristas, a Hackney Empire New Act of the Year. Nesse mesmo ano, estreia-se como apresentador de televisão como jornalista para a MTV. Em pouco tempo, começou a apresentar vários programas musicais no canal e a gerar algum desconforto, como quando confessou em direto ter apresentado o seu traficante de droga a Kylie Minogue.

Ainda no mesmo ano, viajou até à Escócia para participar num espetáculo no Edinburgh Fringe, de onde acabou expulso, depois de uma prestação pouco auspiciosa ter levado a que um espectador lhe atirasse um copo. “[O incidente] provavelmente acelerou a minha jornada para deixar de consumir drogas, para começar a escrever material e passar a levar a comédia mais a sério”, confessou mais tarde.

No entanto, ao fim de um ano, Brand era escorraçado da MTV. A 12 de setembro de 2001, um dia depois do trágico ataque terrorista às Torres Gémeas, o comediante achou que teria piada aparecer na sede da MTV vestido de Osama Bin Laden, o suspeito de ser o mandante dos ataques. Haveria de justificar-se anos mais tarde, alegando que estava sob o efeito de heroína. “Desafio-vos a consumirem crack e heroína para verem como isso afeta a vossa vida pessoal, privada e profissional”, comentou, numa entrevista com Chelsea Handler.

Em 2002, Brand criava o “RE:BRand”, um programa que pretendia abordar temas considerados tabu. O programa, agora descrito por muitos como “chocante” e como “um sinal”, arriscou jogar nos limites. Num dos episódios, Brand visita alguns bares gay, onde, confirmaria mais tarde, se envolveu sexualmente com um homem.

“Bati uma a um tipo na casa de banho. Pensei: ‘Sempre achei que era heterossexual, mas talvez isso se devesse ao ambiente em que cresci, onde a homossexualidade não era bem vista'”, recordou mais tarde sobre esses tempos em que andava mergulhado no consumo de heroína.

“Andei pelo Soho a visitar bares e ginásios gay, a tentar escolher pessoas. Entrei num dos pubs e disse: ‘Alguém quer uma punheta?’ E um tipo qualquer disse ‘sim’. Como se estivesse ali perguntar se alguém queria um pacote de batatas fritas.”

Brand, o convidado e o realizador foram mesmo para a casa de banho, onde o comediante cumpriu a promessa. “Às tantas, o realizador diz: ‘Era mais fácil se ele também pudesse mexer na tua’. E pensei: foda-se… Ele insistiu, baixei as calças e o gajo deu cabo dos meus genitais enquanto eu fazia o que tinha a fazer.”

Mais tarde, em 2013, voltou a abordar o polémico programa. “Devo dizer que [a homossexualidade] não era para mim. Não gostei mesmo. As minhas tendências e inclinações para as mulheres são muito fortes. Gosto muito delas, é um impulso biológico.

Acabaria por ir para uma clínica de reabilitação antes de ter outra nova grande oportunidade a apresentar um novo programa relacionado com o “Big Brother”. “Obrigado por arriscarem dar trabalho um ex-toxicodependente insignificante”, disse em agradecimento aos produtores. Como habitualmente, a polémica não estava muito longe, mas antes tentou lançar-se numa carreira como comediante.

Em 2007, atuava para Isabel II no Royal Variety Performance. Como apresentador, é escolhido para comandar os Brit Awards, o concerto Live Earth e o Comic Relief. Após se aventurar no papel de ator, com vários pequenos papéis na televisão, consegue o seu primeiro grande papel no cinema quando é escolhido para interpretar Aldous Snow na comédia romântica produzida por Judd Apatow, “Forgetting Sarah Marshall”.

Ainda relativamente desconhecido entre o público americano, Brand é anunciado como o apresentador surpresa dos MTV Video Music Awards (VMAs) e rapidamente gerou alguns suspiros na plateia, sobretudo quando acusou George Bush de ser um “cowboy retardado”.

Em 2008, via-se mergulhado num dos maiores escândalos da sua carreira até à data, que teve origem num episódio do “The Russell Brand Show” na BBC Radio 2. O segmento controverso tinha Jonathan Ross como convidado. Juntos, fizeram uma série de chamadas telefónicas para a estrela de “Fawlty Towers”, Andrew Sachs, nas quais Brand alegava ter tido relações sexuais com a neta, a atriz Georgina Baillie.

O escândalo provocou críticas generalizadas de ouvintes e de muitas figuras públicas, incluindo o então primeiro-ministro Gordon Brown. Ambos os apresentadores foram suspensos da BBC como resultado do incidente e Brand demitiu-se mesmo do próprio programa.

Já estaca casado com a mega estrela da música pop, Katy Perry, que Brand volta a ter problemas, desta vez com a polícia. A 16 de setembro de 2010 é detido e acusado de agressão, depois de um encontro de primeiro grau com um paparazzo no aeroporto de Los Angeles. Acaba detido e passa a noite na esquadra, mas viu a acusação ser rapidamente retirada.

Dois anos mais tarde, um encontro semelhante voltou a resultar numa detenção. Perante a presença de um paparazzo, Brand terá atirado o telemóvel do fotógrafo pela janela. “Desde que Steve Jobs morreu que não suporto ver alguém usar um iPhone de forma irreverente. O que fiz foi uma homenagem à sua memória.”

A partir de 2014, dá-se uma viragem na persona de Brand, que dá início a uma transformação num dos conspiracionistas de YouTube, com o lançamento de um programa na plataforma, o “The Trews: True News”. Ao longo de quase uma década, o comediante foi criticado por usar a plataforma para dar palco às mais bizarras teorias da conspiração.

Entre elas, estava a luta contra a pandemia e contra as medidas que pretendiam travar a propagação da Covid-19 — e, claro, a vacinação. Criticado por apelar à não vacinação, os vídeos negacionistas provocaram um aumento drástico na audiência do canal.

Tal como aconteceu com as acusações de agressão sexual, Brand foi quase sempre defendido publicamente por outras figuras notórias e polémicas, caso de Elon Musk, que em 2021 o elogiou no Twitter. “Com tantas empresas de média mainstream a dizer que Russell Brand é louco/perigoso, vi alguns dos seus vídeos. Ironicamente, parece mais equilibrado e perspicaz do que aqueles que o condenam. O pensamento ‘segue o rebanho’ das principais empresas de média é mais preocupante. Devia haver mais dissidência.”

Quando Russell Brand partilhou o vídeo a defender-se das recentes acusações, acusou a imprensa de fazer “um ataque coordenado”. Musk fez questão de comentar: “Claro. Não gostam de concorrência.”

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